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O cinema português continua a batalhar por um lugar ao sol, uma luta ingrata, uma vez que a atenção do público quase sempre se vira para grandes produções vindas de outros países. Por cá, e num país de pequena dimensão, os orçamentos de produção são mais modestos, mas na 10.ª edição dos Encontros do Cinema Português, que decorreu esta quarta-feira nos Cinemas NOS – Vasco da Gama, foram apresentadas 45 longas-metragens. Algumas com data de estreia marcada, outras em busca de distribuição e outras de parceiros de produção que possam permitir a conclusão desses projectos. De realizadores consagrados, como João Botelho, ou a músicos que descobriram uma nova vocação, como é o caso dos Capitão Fausto, os encontros tiveram de tudo um pouco. Pelo meio, a premiada realizadora Leonor Bettencourt Loureiro subiu ao palco para apresentar C’est pas la vie en rose, um mockumentary bem humorado, entre a ficção e a realidade, que, com Lisboa como pano de fundo, fala da gentrificação em curso.
“Nem tudo o que brilha é ouro e hoje em dia certamente a vida não é cor-de-rosa”, afirmou em palco a realizadora, ao lado de Maria João Mayer, a produtora que deu a mão ao filme já numa fase final. Leonor Bettencourt Loureiro tem dado cartas – e sido distinguida por isso – em campanhas de marcas de moda. Agora, a tendência é outra. “Portugal está na moda, e o problema das modas é que não serve a todos os corpos”, alerta a realizadora. Em C’est pas la vie en rose, uma banda alternativa com sucesso mundial muda-se para Lisboa, uma brincadeira que lembra a passagem de Madonna por Lisboa há uns anos, durante a qual muitos lhes estenderam a passadeira vermelha para depois nunca mais a ver. Neste caso, teremos uma versão mais indie da coisa, com “um bocadinho de meta, inteligência artificial, especulação imobiliária, gentrificação, cancel culture, transfobia, homofobia, feminismo, activismo performativo, algum queer baiting e cães que falam”, descreve.
Falado em português, francês e inglês, “como se estivéssemos num café onde um matcha latte custa oito euros e estamos a ouvir a conversa dos expats”, o filme foi construído “entre eventos reais e coisas encenadas”. Foi rodado entre 2021 e 2022 e, em conversa com a Time Out, Leonor dá um exemplo concreto: “Na altura, eu tinha sido destacada como um talento para fazer um olhar sobre a ModaLisboa. E, já que tinha essa porta aberta, pedi para fazer também uns dias de rodagem durante o evento. E juntei as duas coisas. Portanto, mando a equipa para os lobos, para o meio da ModaLisboa, e as pessoas que fizeram parte desse momento não sabiam bem que estavam a fazer parte de um filme. Porque quando entramos num evento público, cedemos a nossa imagem”, explica. “Subverter situações” e “brincar com o ridículo” são alguns dos ingredientes de C’est pas la vie en rose, uma história bem humorada, mas onde parece que a esperança vai para morrer. “Não vai ficar tudo bem”, desafia a realizadora, a “brincar um bocadinho com aquela graça do arco-íris, de que vai ficar tudo bem”. A acção desenrola-se em Lisboa, mas “podia ser em qualquer sítio que está a passar por um processo de gentrificação”. “A globalização tem coisas óptimas, a democratização é excelente, mas nós somos escravos de um capitalismo tardio e a morrer lentamente”, lamenta.
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O filme terá a sua grande estreia no FEST, em Espinho, onde terá honras de filme de encerramento no próximo dia 28 de Junho. “Interessou-nos precisamente este pulso político do filme, de rir para não chorar. Acho que a partir de agora pode desbloquear outras coisas e tenho esperança que as pessoas se identifiquem. Porque através do sentido de humor podemos falar de coisas muito difíceis, e a verdade é que a vida de quase toda a gente é muito difícil actualmente”.
De tudo um pouco
Drama, comédia, cinema experimental, mistura de géneros e técnicas, documentário, ficção, grandes e pequenas produções, pouco faltou durante a apresentação dos 45 projectos, num evento promovido anualmente pela NOS Audiovisuais. Entre 2016 e 2025, foram 400 os projectos apresentados, 70% dos quais estreados em sala. Este ano, um dos maiores cineastas portugueses também subiu ao palco. João Botelho apresentou As Meninas Exemplares, adaptação do livro da Condessa de Ségur, obra que marcou a infância do cineasta e também uma homenagem a Paula Rego, cuja obra também passou por este tema.

Na outra ponta da experiência cinematográfica, a banda Capitão Fausto apresentou Degelo, nome provisório do filme que será uma espécie de autobiografia da banda, que terá banda sonora da própria e que tem estreia marcada para o próximo ano. Destaque ainda para Projecto Global, filme de Ivo M. Ferreira que também terá uma versão em episódios para a RTP1; ou o filme O Pátio da Saudade, de Leonel Vieira, o grande vencedor do evento que chega às salas de cinema em Agosto. Foi galardoado com o Prémio Hollywood, à semelhança de Hotel Amor na última edição destes encontros, atribuído ao filme com maior potencial para atingir alcançar 100 mil espectadores.
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