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Vale a pena ser boa pessoa? Esta peça com Bruno Nogueira dá uma ajuda

Escrito por
Miguel Branco
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A matança ritual de Gorge Mastromas, de Dennis Kelly, é o novo espectáculo de Tiago Guedes, a estrear sábado, no D. Maria II.

Gorge Mastromas era um gajo fixe. Melhor: era um miúdo que praticava o bem, que se sentia mal quando o melhor amigo da escola era humilhado, que era correcto com as raparigas, que vivia os problemas dos outros. Em suma, o Gorge fez sempre o que estava certo durante a adolescência. Sabemos disto, percorremos o seu crescimento, à boleia de um coro composto por vários actores – contadores da sua história ou estilhaços da memória – que nos vai interpelando ao longo de todo o espectáculo, que nos obriga a tomar uma posição face a  isto tudo. Tiago Guedes leva ao Teatro Nacional D. Maria II A matança ritual de Gorge Mastromas, segunda peça do dramaturgo inglês Dennis Kelly que o encenador português leva a cena. A primeira foi Órfãos (São Luiz, 2017).

“Gosto da forma como ele está sempre a colocar-te numa posição de ‘o que é que eu faria nesta situação?’ E acho que ele está sempre a falar disso, ao mesmo tempo que te mostra que o mundo, no qual estamos todos inseridos, está estragado”, diz Tiago Guedes, justificando a ligação e o gosto pela escrita de Kelly. É, é capaz de ser por aí, o mundo está estragado, o mundo corporativo, dos grandes homens de negócios, das empresas que compram outras empresas, que por sua vez já não eram pequenas.

Mais tarde, Gorge é um assistente pouco relevante numa empresa à beira da insolvência. Uma mulher-tubarão, daquelas implacáveis, vem comprá-la e, pelo meio, num momento em que o patrão de Gorge não está na sala, aproveita para dar ao jovem que costumava praticar o bem uma lição de como estar na vida, uma ode aos ricos e àqueles que não têm escrúpulos, que não acreditam em Marx nem em porra nenhuma, “só tens é que não acreditar em nada e fazer o que for preciso”, diz-lhe. E Gorge nunca mais seria o mesmo. Constrói regras que impõe a si mesmo e, em pouco tempo, torna-se também ele um tubarão milionário.

Só que até um CEO sem mais esconderijo, sem mais offshore sonde guardar o dinheiro, pode cair. E neste caso Gorge cai na teia do amor. Luísa, o seu braço direito na empresa, não lhe sai da cabeça. Mas um empreendedor que não vê o fim à sua conta bancária, o homem-fraude em que se tornou, teria de conquistá-la à sua maneira. E isso envolve um plano maquiavélico em que Gorge inventou um passado que não teve, chegando até a escrever uma autobiografia, tornou-se aquele produto fabricado que amava Luísa. Então mas até esse milionário nojento tem sentimentos, até esse crápula fez uma coisa destas por amor, certo? Nem mais, diz o encenador: “Isso é que é interessante, a tentação da nossa educação é condenar, mas ao mesmo tempo ele está a agir por amor, estamos a compreendê-lo”.

“Ele muda porque está farto de ser condenado por fazer o bem. Não estamos a abordar isto de forma panfletária, de condenar este homem, o que é interessante é a dúvida com que ficas. Ele está a querer aquilo que não está a conseguir e fez tudo o que foi preciso”, explica Tiago Guedes. E lá vem a eterna dúvida: fazer o bem compensa?

TNDMII. Qua e Sáb 19.00. Qui-Sex 21.00. Dom 16.00. 5-16€.

De Dennis Kelly
Encenação Tiago Guedes
Com António Fonseca, Beatriz Maia, Bruno Nogueira, Inês Rosado, José Neves, Luís Araújo, Rita Cabaço

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