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I'm Not There (2007)

Cinema: 10 biografias musicais

O principal dilema de um realizador filmando a vida de um músico é escolher entre filmar a música ou filmar o músico. A maioria tenta a abrangência. E é aí que a coisa costuma correr mal. Estes 10 filmes, no entanto, safam-se todos bem.

Escrito por
Rui Monteiro
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Filmar bem a vida de músicos, isto é, mostrando a música e as circunstâncias pessoais e sociais em que foi criada, faz-se todos os anos. Uma longa lista de filmes medíocres mostra a dificuldade da tarefa. Dificuldade que estas 10 obras ultrapassaram graças ao raro saber de equilibrar a obra e a vida de um músico com a arte do cinema.

Cinema: 10 biografias musicais

Caminho da Glória (1976)

O filme de Hal Ashby teve o que se costuma dizer uma sorte macaca. Por um lado, apesar das suas qualidades, foi logo afastado dos Óscares mais apetecíveis (embora tenha recebido o de Melhor Direcção de Fotografia e Melhor Música) pela concorrência de Táxi Driver, Rocky (vencedor de Melhor Filme e Melhor Realização, por chocante que seja), Escândalo na TV e Os Homens do Presidente. Depois, também não se pode dizer que o público estivesse propriamente virado para saber da vida e obra de Woody Guthrie. Finalmente, porque a crítica não foi mais do que morna com o filme protagonizado por David Carradine. Ainda assim, a obra cinematográfica que recorda a vida e a obra de um dos mais importantes cantores e compositores norte-americanos sobreviveu ao tempo e, hoje, continua a ter a energia e a importância que Ashby lhe imprimiu como se a cantiga fosse uma arma.

Elvis (1979)

Visto agora, olhando para a filmografia de e sobre Elvis Presley, parece evidente que o Rei do rock’n’roll e o cinema sempre tiveram uma relação conflituosa. Não que o cantor não quisesse ser actor, muito pelo contrário, ou que o cinema não o quisesse, mas o facto é que os filmes (com a rara excepção de O Prisioneiro do Rock and Roll, de Richard Thorpe) oscilam entre o medíocre e o simplesmente mau; um mau que o tempo tornou kitsch e, paradoxalmente, valorizou. E não me falem de biografias filmadas, pois, aí, nesse capítulo tão frequentado, a vida e obra de Elvis não produziu obra brilhante. Ainda assim, o filme para televisão de John Carpenter, com Kurt Russell (que recebeu uma nomeação para os Emmy com a sua interpretação, e, nas partes cantadas, tinha a sua voz dobrada pelo cantor country Ronnie McDowell), capturou com muita justeza e energia, sem amenizar o lado negro de Presley, a vida, e principalmente a obra de um dos maiores ícones da cultura pop.

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Amadeus (1984)

Saber se foi Salieri (F. Murray Abraham) quem mandou matar Mozart (Tom Hulce) é uma estimulante distracção introduzida por Milos Forman (enfim, pela peça de Peter Shaffer que o realizador adaptou) na sua peculiar observação da vida de Wolfgang Amadeus. O filme, na verdade, é uma celebração da música que, mais ou menos às escondidas, usa episódios da vida do compositor para especular sobre a origem da sua criatividade. (Foi Deus, como preferia Salieri?) Ao mesmo tempo, Forman dá largas à imaginação e, pelo mesmo processo, “explica” a música como uma espécie de emanação de um espírito perturbado pela beleza; apesar da vida de estroina, de mulherengo e caloteiro, tocado por um talento que contaminou o cineasta e valeu oito Óscares.

Sid & Nancy (1986)

Sid Vicious e Nancy Spungen (aqui interpretados por Gary Oldman e Chloe Webb) são a Família Real do punk feio, porco e mau que mudou a música popular na segunda metade da década de 1970. E a dramatização da sua vida em comum pelo realizador Alex Cox não esconde nada, de certa maneira como se seguisse a sentença de John Lydon (ou Rotten, o apelido que usava na altura), que se referia ao casal, quando Vicious começou a andar de candeias às avessas com os outros Sex Pistols, como “a mais reles forma de vida.” Há muito experimentalismo nesta obra de Cox, que vagueia entre as águas do documentário e do realismo mágico, mas o que lhe acrescenta valor é a intensidade dramática do argumento e as soberbas interpretações de Oldman e Webb.

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Por Volta da Meia-Noite (1986)

O saxofonista Dexter Gordon foi a matéria ideal para Bertrand Tavernier recriar o estereótipo do músico de jazz brilhante, mesmo genial, assombrado, senão por um passado de miséria, pelo preconceito racial e principalmente pelo álcool e pelas drogas. Dale Turner é isso mesmo quando surge, em Paris, pelos anos de 1950, e experimenta, pela primeira vez, respeito e admiração pela sua música para lá da cor da sua pele. O vício, porém, prevalece. O oportunismo do viciado também. O que não impede um admirador parisiense de lançar uma mão amiga. O engenho de Tavernier foi, apesar da falta de originalidade da intriga, manter o seu filme sempre à superfície da previsibilidade e da lamechice.

What’s Love Got To Do With It? (1993)

Brian Gibson filmou a vida de Tina Turner, melhor, a sua existência artística e pessoal durante o casamento com Ike Turner, e, como a fénix, o seu renascimento depois da fuga de um marido que, sim, era um músico brilhante, e ao mesmo tempo um estupor com as mulheres. O filme vem em tom convencional, porém o realizador não se inibe na construção das personagens, apresentando a cantora evidentemente como vítima, sem no entanto esconder a sua ambição, ou o seu desejo de estrelato, com o medo, razão de aguentar tanta humilhação e porrada. A interpretação de Angela Bassett e Laurence Fishburne é de grande categoria e, na sua vivacidade, fundamental ao bom desenvolvimento da narrativa.

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Walk the Line (2005)

Ainda no formato de biografia convencional, James Mangold, com preciosa colaboração de Joaquin Phoenix e, ainda mais, de Reese Witherspoon (que sacou justo Óscar pela sua interpretação de June Carter Cash), atira-se à história de Johnny Cash. E, embora o filme tenha tudo para o desastre, o realizador faz da vida deste monumento da canção norte-americana uma estimulante e pouco moralista via dolorosa, iluminada, a espaços, e sempre em tons de cinzento, pela crueza bela da música. Está lá tudo, da má vida às drogas, aos tormentos físicos e psicológicos, a fé e a dúvida de um homem que viveu quase sempre à beira do abismo e provavelmente nunca encontrou a paz. Mas está lá tudo sem aproveitamento demagógico. Como um quadro sem título.

Control (2007)

Havia um poeta. Viveu depressa. Matou-se cedo. Pode-se dizer que a sua vida foi como um foguete. Apareceu, iluminou o céu, encantou, e estatelou-se no chão como uma cana sem préstimo. Foi pessoa que pouco encontrou de bom na vida, mas que cantou a decepção e o desespero com uma sinceridade e um dramatismo que os tornou belos e quase suportáveis. Sobre Ian Curtis (Sam Riley) Anton Corbijn fez um filme preciso, honesto e bonito, ilustrando a época em que o punk estava morto, a new wave ainda mal andava, e os Joy Division criavam o vocabulário poético e sonoro que cristalizou a angústia de uma geração, e influenciou a melhor música popular da década de 1980 em diante. Em preto e branco espartano, Corbijn captou esse momento, esse ambiente, através de uma reconstituição rigorosa, com um carinho ligeiramente nostálgico.

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I'm Not There – Não Estou Aí (2007)

Deitando às urtigas as convenções da biografia cinematográfica, o realizador Todd Haynes olha para o músico e para o homem através da evolução estética, política e estilística das canções. E quando vê obra tão rica e inquieta, e, por vezes, tão controversa, em vez de procurar a resposta simples vai pelo caminho mais longo. Por uma estrada panorâmica de onde (estava toda a gente longe, mesmo longe de pensar que Bob Dylan seria um dia Nobel da Literatura) surgem meia dúzia de encarnações (heterónimos, se preferirem, dado o novo estatuto do poeta) para o criador de The Times They Are a-Changin’, Bringing It All Back Home, Highway 61 Revisited e Blonde on Blonde, que Cate Blanchett, Christian Bale, Heath Ledger, Ben Whishaw, Richard Gere e Marcus Carl Franklin interpretam com primor e emoção.

Straight Outta Compton (2015)

Quase uma década depois do filme de Haynes, contudo sem lhe seguir o exemplo, a película de F. Gary Gray (que, entretanto, dirigiu Velocidade Furiosa 8) é, ainda assim, uma estimulante variação sobre a vulgaridade do género biográfico. Produzido e controlado pelos músicos sobreviventes dos Niggaz Wit Attitudes (N.W.A.), DJ Yella, Dr. Dre, Ice Cube e MC Ren (Eazy-E morreu em 1995, vítima de sida), o filme retira o título do álbum mais conhecido da banda, disco que não só foi um êxito comercial, como, mais do que tudo, inaugurou a era do gangsta rap e introduziu nas letras do género uma linguagem realmente revolucionária, que, até para própria cultura hip-hop de então, era mais subversiva e transformadora que a força de uma canção, "Fuck tha Police", que nasceu como palavra de ordem e existe como hino da luta anti-racista na América.

Cinema e música: um casamento perfeito

  • Filmes

Alguns, como John Williams, alinham Óscares uns atrás dos outros com grandiloquência. Outros, como Nino Rota ou Henri Mancini, são mais discretos. E Ryuchi Sakamoto, então, cria ambientes como poucos, ou talvez só como Max Steiner outrora o fez. Sete exemplos excepcionais e bastante distintos seguem já a seguir. São bandas sonoras inesquecíveis – e premiadas pela Academia de Hollywood com o Óscar. 

  • Filmes

Filmar a vida dos músicos é vulgar. Fazê-lo bem (há um longo rol de películas medíocres) é outra conversa. Com as injustiças próprias de uma lista, esta orienta-se pela qualidade cinematográfica propriamente dita, isto é, por esse raro saber de equilibrar a obra e a vida de um músico com a sétima arte. 

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  • Música
  • Jazz

Apesar da proliferação de festivais de jazz e do sucesso planetário de cantores pop que se apresentam sob o rótulo de “jazz”, o género está hoje longe de desfrutar da popularidade que atingiu na década de 1950 e nos primeiros anos da década de 1960. A prova disso é que hoje o cinema mainstream não corre o risco de ter como banda sonora jazz “puro e duro”. Na selecção que se segue privilegiam-se as bandas sonoras originais compostas e executadas por músicos de jazz.

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