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@Malcolm Viles, courtesy The ChurchThe Church

Dez pérolas secretas da pop: volume 2

Eis magníficas canções de bandas que não saíram da obscuridade ou que desapareceram do radar mediático mas a quem não faltam qualidades

Escrito por
José Carlos Fernandes
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Dão para fazer um álbum, e podemos adiantar-lhe que vem um volume 3 a caminho. Prepare a aparelhagem. 

10 pérolas secretas da pop: volume 2

“Dead Pony”, de Nico Stai

Nico Stai nasceu e cresceu em Espanha e mudou-se para Los Angeles onde lançou um álbum, Park Los Angeles (2007), e dois EPs, The Victory of Miss Friday (2008) e Dead Pony (2008), registados quase sempre com recursos mínimos – voz e guitarra acústica – e só esporadicamente tendo o concurso de uma banda. Dead Pony era apresentado como contendo canções do “próximo segundo longa duração de Nico Stai”, que nunca viu a luz do dia. Os sinais de actividade de Stai foram desvanecendo-se e não há sinais de concertos posteriores a 2011, o que faz crer que terá posto termo à carreira musical. Não foi por falta de talento, intensidade emocional e uma voz individual.

[Ao vivo no clube Echoplex, Los Angeles, 2008]

“Northern Hemisphere”, de Gregory Alan Isakov

Apesar da versão vendida por Trump e comprada pelos seus eleitores de que os estrangeiros são basicamente violadores, traficantes de droga, assassinos e terroristas, a verdade é que os EUA são um poderoso íman para talentos artísticos. Como Stai, Gregory Alan Isakov é um forasteiro: nasceu na África do Sul, mudou-se para os EUA em criança, começou a actuar regularmente aos 16 anos e lançou até agora cinco álbuns de originais e o álbum ao vivo With the Colorado Symphony Orchestra (2016), que embrulha em arranjos orquestrais algumas das suas canções anteriores (ver 10 concertos pop-rock ao vivo com orquestra). Se Isakov tivesse mais visibilidade, o seu indie folk magoado e melancólico poderia atrair apreciadores de Will Oldham, Bill Callahan e Jason Molina e proporcionar consolo a quem gastou as últimas décadas a acompanhar o declínio de Leonard Cohen, Bob Dylan e Bruce Springsteen. “Northern Hemisphere” faz parte do seu quarto álbum, This Empty Northern Hemisphere (2009).

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“Smooth Steps”, dos Animals That Swim

Não basta ter talento, foco e persistência: o timing também é fundamental. Quando Workshy, o álbum de estreia dos Animals That Swim, surgiu, em 1994, o mundo da indie pop só tinha ouvidos para o grunge e o britpop e este quinteto londrino com canções que davam lugar proeminente ao piano e à trompete, letras enigmáticas e irónicas e um vocalista (Hank Starrs) que nalgumas faixas se aproximava do tom soturno e lasso de Stuart Staples, dos Tindersticks, tinha poucas possibilidades de singrar. A banda lançou mais dois álbuns, em 1996 e 2001, e, após oito anos a nadar contra a corrente, desfez-se. “Smooth Steps” faz parte de Workshy.

“Brielle”, dos Sky Sailing

Dos milhões que fizeram o download de “Fireflies”, dos Owl City (foi a canção mais vendida no iTunes em 2009), poucos terão ouvido falar dos Sky Sailing. Porém, a mente criativa por trás de ambas as bandas é a mesma: Adam Young. Young, que nasceu em 1986 em Owatonna, Minnesota, era ainda adolescente quando gravou o único álbum dos Sky Sailing, An Airplane Carried Me to Bed. Foi registado na cave da casa dos pais e foi Young quem tocou todos os instrumentos e se ocupou da gravação, mistura e produção. Em 2007, com 21 anos, lançou o primeiro EP – Of June – sob o nome Owl City, banda que rapidamente ganharia fãs na Internet e ascenderia definitivamente ao estrelato em 2009. Young aproveitou a oportunidade para, no ano seguinte, resgatar An Airplane Carried Me to Bed e lançá-lo pela Universal Republic. É tentador estabelecer um paralelismo entre Adam Young e Ben Gibbard, pois não só a voz e maneira de cantar são semelhantes como a sonoridade dos Sky Sailing está para a dos Owl City (assente na electrónica) como a dos Death Cab For Cutie está para a dos Postal Service (embora os Sky Sailing sejam mais amáveis e convencionais do que Death Cab For Cutie).

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“Along the Road”, dos Radical Face

Ben Cooper tirou o nom de plume de Radical Face de um prospecto publicitário que encontrou na rua – mais tarde descobriu que lhe faltava um bocado e que o panfleto, de uma clínica de cirurgia plástica, anunciava um “radical face-lift”. Os Radical Face têm base em Jacksonville, Florida, e são, basicamente, Ben Cooper, com colaboradores pontuais, como Alex Kane, da sua outra banda, os Electric President (não, não é uma piada ao Prof. Marcelo). Lançaram quatro álbuns de originais, Ghost (2007) e a trilogia Family Tree (The Roots em 2011, The Branches em 2013 e The Leaves em 2016).

Em contexto musical, o adjectivo “radical” costuma remeter para metal, punk, hardcore, rapcore e outros géneros apropriados a tropelias com skates, mas o universo dos Radical Face não poderia ser mais diverso desse. “Along the Road”, como o resto de Ghost, evoca uma infância onírica, vista através de um espelho deformado e banhada pela “luz de uma lua moribunda”: “E nós envergamos uma capa de pirilampos e quando o mundo vai para a cama, todos os fantasmas vêm cantar em coro”.

“Waiting on the Guns”, dos Butterglory

Poucos se lembrarão deste duo (Matt Suggs e Debby Vander) de Lawrence, Kansas, que, entre 1992 e 1997, lançou alguns singles, um EP e três álbuns de pop eminentemente cantarolável, deliciosamente naïve e exemplarmente concisa. “Waiting on the Guns” faz parte do primeiro deles, Crumble (1994).

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“Balance”, dos Lego Big Morl

Os Lego Big Morl são de Osaka, Japão, e embora levem 11 anos de existência (o seu quinto álbum saiu no início de 2017), tenham excelente prestação ao vivo e possuam um razoável núcleo de fãs no seu país, são quase desconhecidos no Ocidente. O seu songwriting não traz inovações, mas têm um talento notável para construir canções que combinam um ímpeto imparável com melodias “orelhudas” e sabem gerir o débito de energia de forma a erguer finais arrebatadores. Entre as suas jóias está “Balance”, que foi single do segundo álbum, Mothership (2010), e nos diz que é preciso aceitar o mundo como é, com o seu desfile de perdas, medos, atritos e desilusões.

[Versão ao vivo, por volta de 2010-11, algures no Japão]

“Who Found Who’s Hair in Who’s Bed?”, de Owen

Os Owen resumem-se a Mike Kinsella, que tem experiência repartida por bandas tão diversas como American Football, Joan of Arc, Cap’n Jazz ou Owls. Em estúdio, Kinsella ocupa-se de (quase) todos os instrumentos, mas as canções de Owen funcionam bem só com voz e guitarra acústica e é nesta modalidade despojada que faz as tournées. As letras, quase sempre sobre relações sentimentais, são confessionais e cruas, por vezes amargas e recriminatórias, não andando muito longe de Mark Kozelek.

Apesar de, em 16 anos, terem sido lançados dez álbuns sob o nome Owen, esta faceta de Kinsella é menos conhecida do que as bandas de que tem feito parte, pese embora a qualidade do songwriting e a desarmante frontalidade das letras. “Who Found Who’s Hair in Who’s Bed?” faz parte de I Do Perceive (2004).

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“Fadeout”, dos +/-

Os nova-iorquinos +/- (ou Plus/Minus) existem desde 2001 e têm cinco álbuns mas a sua visibilidade é reduzida, para o que contribui o facto de, nos anos mais recentes, terem focado parte da actividade na Ásia.

“Fadeout”, do terceiro álbum, Let’s Build a Fire (2006), é uma lição magistral sobre gestão da tensão: o ouvinte sabe, desde o primeiro instante que esta canção está programada para explodir. A trama instrumental, que começa por ser muito despojada, vai adensando-se e complexificando-se (há aqui algo de math rock) e a tensão vai crescendo, crescendo, até que aos 3’58 acontece o inevitável.

“Disappointment”, de The Church

Com 37 anos de carreira e 22 álbuns de estúdio, os australianos The Church estão longe de ser desconhecidos (ver 10 discos indie pop para ouvir de cabeça para baixo). Nos anos 80 conquistaram alguma notoriedade e o álbum Starfish (1988) chegou a ser Disco de Ouro nos EUA, mas foram desaparecendo dos radares, embora a sua capacidade de criar grandes canções não tenha sofrido erosão e tenham mantido um “núcleo duro” de fiéis.

Gold Afternoon Fix (1990) marca o início do declínio da popularidade: a editora Arista estava empenhada em repetir o êxito comercial de Starfish, mas a pressão exercida sobre a banda fez com que a concepção e gravação do álbum se tornasse demorada, tortuosa e conflituosa (levando a que o baterista Richard Ploog saísse da banda) e o resultado final fosse de qualidade desigual. O público também não ficou convencido, apesar da campanha promocional montada pela Arista, e Gold Afternoon Fix ficou muito longe de repetir o sucesso comercial de Starfish e os discos seguintes foram tendo cada vez menos visibilidade.

Tal não impede que Gold Afternoon Fix contenha boas canções e até, escondida a meio do alinhamento, uma pérola intitulada “Disappointment”. Não nos fiemos na sua aparência serena e dolente: o que ela nos confidencia é que ao desapontamento pouco importa a agitação fútil dos seres humanos; limita-se a ficar, à distância, à espera da sua hora, que chegará, inevitavelmente. Se se prestar atenção, percebe-se que a pop pode ser muito mais assustadora do que o death metal.

Complete a banda sonora

  • Música
  • Rock e indie

O prólogo ao livro de poemas Os conjurados (1985), a derradeira obra de Jorge Luís Borges, é tão precioso e iluminador como o melhor dos seus poemas. Escreve Borges, do alto da infinita sabedoria dos seus 86 anos: “Com o correr dos anos, observei que a beleza, tal como a felicidade, é frequente. Não se passa um dia em que não estejamos, um instante, no paraíso. Não há poeta, por medíocre que seja, que não tenha escrito o melhor verso da literatura, mas também os mais infelizes. A beleza não é privilégio de uns quantos nomes ilustres”. Seguem-se dez comprovativos, não de como mesmo poetas medíocres são capazes de magníficos versos, mas de que existem criadores talentosos a viver longe dos holofotes, porque, pura e simplesmente, não existe uma relação entre talento e reconhecimento. São 10 músicas pop que poucos conhecem, mas todos deviam conhecer. 

  • Música
  • Rock e indie

Por vezes os discos de estúdio soam demasiado polidos e assépticos – está tudo perfeito, mas, durante o longo processo de gravação e mistura, o feeling e a excitação ficaram de fora – e, por outro lado, os concertos ao vivo têm noites más, porque o vocalista não consegue ouvir-se e desafina, ou a acústica da sala é bera, ou o volume está demasiado alto, ou os volumes dos instrumentos estão desequilibrados, ou a escala do concerto torna a experiência impessoal. As actuações “ao vivo em estúdio” (com ou sem público) conseguem, por vezes, reunir o melhor dos dois mundos: a espontaneidade, vibração e urgência do live e o rigor, detalhe, subtileza e intimismo das gravações de estúdio. Não é por acaso que cada vez mais músicos exploram este formato, quer num verdadeiro estúdio de gravação quer num local que proporcione condições similares.

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