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Sam The Kid
Manuel Manso

A aula de história de Sam The Kid

A História do Hip-Hop Tuga chega à Altice Arena esta sexta-feira. Sam The Kid fez o roteiro por alguns dos nomes em palco.

Escrito por
Tiago Neto
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“O título é sempre polémico e há pessoas que levam isso como uma bíblia”, diz Sam The Kid, uma das mais importantes figuras do hip-hop português, sobre a discussão inerente aos nomes convidados para actuar na História do Hip-Hop Tuga, dia 8, na Altice Arena. “Há sempre dedos a apontar a dizer que falta este ou aquele. Faltar, falta sempre, mas há convites que não são aceites.” Valete, Regula ou Halloween são nomes da primeira liga em falta. “O Valete foi convidado, o Halloween foi convidado, o Regula, muitos mais, alguns até menos conhecidos. Por exemplo, Nigga Poison, que se calhar agora até nem estão muito activos enquanto grupo, e para eles não faz muito sentido fazer parte.”

A História do Hip-Hop Tuga é uma espécie de jogo onde se reúnem as peças mais importantes dos últimos 20 anos do movimento em Portugal. MCs, B-Boys, DJs e writers formam uma existência tridimensional onde rimas, danças, escrita e batidas compõem o todo. A ideia partiu de Vasco Ferreira [Sensi], o também MC que em 2017 agrupou as caras pela primeira vez no Sumol Summer Fest.

“Às vezes ele manda-me as coisas e diz ‘vê lá se falta alguém’, acabo por lhe dar algumas sugestões, um grupo, uma música.” O critério de selecção não está preso ao ditame da fama do grupo nem do indivíduo, aqui é a música que conta. “Por exemplo Alex e os Putos do Bairro, que era uma criança, que nem sequer tinha álbum, mas que tinha uma música com impacto na altura e fez história. Então também passa por aí.”

Nesta segunda edição há mais vertentes em cena, um avanço aplaudido por Sam, a quem pedimos que servisse como professor de História e nos guiasse pelo cartaz. “O hip-hop é uma cultura e não podes levar só o rap. Então há que ver sempre o que falhou ou faltou, e porventura pode haver mais edições onde as pessoas que não entraram podem ser incluídas.” Mas ainda são poucos os nomes femininos em cartaz.

Sam explica: “Não é haver poucas, há é menos. Na minha experiência, e infelizmente, sei que é mais difícil para as mulheres serem levadas a sério. É muito fácil terem de lidar com merdas com que os homens não lidam, quase que precisam de avisar que não estão ali para outra coisa.” 

“Mas na história já houve bastantes rappers femininas”, retoma, “acho estúpido é a ideia de que só há espaço para uma no topo. Mesmo nos EUA, parece que só pode haver uma, primeiro a Nicki [Minaj], depois a Cardi B. Por que é que não podem estar as duas?”. “Com os homens não há isso”, atira. “Mas tens a Capicua, por exemplo, que é superfocada. Aí está uma qualidade que vejo nas mulheres do hip-hop: rigor, foco, profissionalismo.”

Voltamos à Altice Arena, onde Sam levará temas de Sobre(tudo), o segundo disco, Pratica(mente), o terceiro, recortes da banda sonora de O Crime do Padre Amaro, “cenas com o Mundo [Segundo], a MPC e uma cena com o Sir Scratch”. Por lá, Xeg, NBC, Bomberjack, Tekilla, Chullage, Carlão ou NGA são alguns dos nomes a encher o quadro, e Sam diz-nos o que esperar de cada um.

Altice Arena, Sex 22.00, 20-25€

Linha da frente

Xeg

“Ouvi o Xeg a primeira vez através do D-Mars, numa colectânea da Subterrânea, e nessa altura ele tinha uma escrita engraçada. É capaz de ser uma coisa inconsciente, mas em quase todas as rimas ele dizia países, tipo ‘não sei quê daqui à Birmânia’. Sempre teve um flow meio diferente, mas a cena dele é especial. É das pessoas que conheço que escreve e grava mais, nunca desmoralizou. Merecia mais no aspecto de viver o seu sonho, de fazer só isso.”

Um tema: “Verão Passado”. “É um conceito interessante de cantar a mesma coisa de formas diferentes.”

Chullage

“Abordei-o uma vez no Teatro da Comuna e disse-lhe logo ‘quando quiseres, gostava de trabalhar contigo’. Já o tinha visto num projecto que ele tinha na altura, os 1-8-7 Squad, ele, o irmão e mais uns elementos. Era o nosso NAS, o jornalista de rua, com grandes letras. E brinquei com ele sobre um estilo de rima que ele fez durante muito tempo, a cena de escolher uma terminação e levar até à exaustão. É dos meus rappers favoritos de sempre, uma pessoa bué culta, muito importante a nível social, com os ideais certos e, artisticamente, está muito à frente. A escrita está incrível, melhor do que nunca.”

Um tema: “Será Que”. “Às vezes, quando escrevemos, só precisamos de um ponto de partida, e ele pega nisso e rima muito bem."

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DJ Bomberjack

“Foi uma pessoa mesmo muito importante no início do hip-hop nacional para nós, para a minha geração. Pioneiro a fazer mixtapes que eram muito importantes para divulgar todos os rappers que não tinham forma de gravar. E há uma cena engraçada sobre ele, que tem que ver com ingenuidade: antigamente não sabíamos bem a métrica das barras, dezasseis barras, trinta e duas, então o Bomberjack andava com um cronómetro ao pescoço para saber a duração do instrumental.”

Um tema: “Destaco-lhe a produção e a ‘4 Ases’. O beat é intemporal.”

Carlão

“Conheci-o pessoalmente no Johnny Guitar. Dei-lhe logo a minha demo, ele gostou bastante e daí para a frente estávamos sempre a trocar filmes e cassetes. Estas cenas estão em quase todas as minhas músicas. Sempre admirei a cena dele e foi uma grande influência ao início, uma influência directa na minha forma de rimar quando ainda estava à procura da minha identidade. Mais tarde colaborámos no filme O Crime do Padre Amaro e mais umas cenas. E a admiração não muda."

Um tema: “Tudo Na Mesma”. “Um som que os apanhei a cantar quando fui assistir à gravação da ‘Dúia’.”

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Tekilla

“Inicialmente conheci-o como Nigga Williams, ainda o estou a ver de mochila, roupa à skater, mas grande atitude. É das pessoas que conheço que tem mais bom gosto. E é uma pessoa de bom coração que, sinceramente, pelo trabalho, merecia mais. Ainda vai a tempo, mas merecia ter tido mais êxitos, de estar sempre na estrada, de mostrar a sua visão. Porque não lhe falta nada. É bom olheiro, sempre a ir buscar novos talentos. É uma pessoa feliz musicalmente, abraça tudo o que é nova sonoridade."

Um tema: “Amadurecimento”. “Com ele é difícil escolher porque gosto muito de várias músicas.”

NGA

“Um grande exemplo de perseverança, de batalha. Ao princípio, ele e os Força Suprema foram criticados pela cena mais americanizada. Antigamente o movimento era mais fechado. E acho que eles foram contra o mundo e conseguiram vencer e ter sucesso. Um gajo só tem de aplaudir. Ainda antes da net obrigar as pessoas a serem constantes, eles já o faziam, e isso fez com que ganhassem terreno neste jogo que hoje se joga. E foram evoluindo.”

Um tema: “Minha Carta de Amor”. “Gosto mesmo da música, é um som que eu rimaria na boa, por causa dele e do beat.”

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NBC

“A primeira vez que o conheci foi em minha casa. A minha cena foi mandar maquetes para a Antena 3; deixava lá o telefone, alguém me ligou, que foi o Vinagre, do Projecto Secreto, e trouxe imensa gente. Primeiro foi o Black Mastah, irmão do NBC, só mais tarde é que ele veio também. Tinha uma grande atitude, deixa logo uma pessoa à vontade. E desde o princípio que misturava a cena de rimar com cantar, usar a voz para fazer melodias. E é das pessoas que conheço com mais projecção de voz. É uma coisa que o identifica. É uma pessoa de quem eu gosto bastante, falo muitas vezes com ele."

Um tema: “Quem Está Comigo”.

Outros palcos

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