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Adriana Calcanhotto
©Leo Aversa

Adriana Calcanhotto: “Não gosto da ideia de me acomodar"

Entrevista à cantora brasileira Adriana Calcanhotto. O espectáculo “A Mulher do Pau-Brasil” chega ao CCB na terça-feira

Escrito por
Ana Patrícia Silva
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“Vamos Comer Caetano”, cantava Adriana Calcanhotto em 1998 num banquete antropofágico em celebração a Caetano Veloso e ao furacão tropicalista. 20 anos depois, o tropicalismo continua a ter muito para revelar e ensinar. Este mês, Adriana Calcanhotto estreia um novo projecto que resulta de uma residência artística e da experiência como professora na Universidade de Coimbra. O espectáculo “A Mulher do Pau-Brasil” parte do Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1924) de Oswald de Andrade, atravessa o Tropicalismo e rumina as reverberações dessa estética na cultura pop brasileira.

O que a fascinou na obra de Oswald de Andrade?
Descobri com 15 anos e fiquei maravilhada com a ironia, com a provocação, com o destemor. Uma obra dos anos 20 do século passado que me impactou no começo dos 80 como se fosse nova, fresca, como se estivesse sendo produzida naquele momento. Me identifiquei com as ideias dele e do grupo todo. Me encantei com [a pintora] Tarsila do Amaral, uma mulher extraordinária.

De que forma é que a antropofagia e o tropicalismo a transformaram?
Me formaram antes de me transformar, me mostraram a possibilidade da convivência entre a “alta” e a “baixa” cultura sem assombro, sem deslumbramento. Para alguém que na infância ouvia em casa tanto o jazz e a música erudita com os pais quanto a rádio popular com as empregadas da casa, isso era completamente natural, até eu perceber que a maioria não pensava assim. Quando nasci, o tropicalismo já existia, mas só na minha adolescência pude entender o quão corajoso aquilo havia sido.

A antropofagia esteve sempre presente na sua obra, na sobreposição de variadas artes e influências. De onde vem o seu espírito inquieto?
Difícil essa pergunta. De onde vem não sei, é bastante influenciado por esses artistas todos. Eu gosto do risco, não gosto da ideia de me acomodar, de fazer o que já sei, de ser expert. Prefiro o espírito amador, prefiro saltar sem rede. Gosto de adrenalina, talvez devesse ter sido surfista.

O que é que ainda podemos aprender com o Tropicalismo?
Muito. Nem tudo está completamente assimilado, são muitas teias, é caleidoscópico, randómico, inesgotável. Continua influenciando gerações de artistas no mundo todo, de música, moda, arte.

Como vai ser o alinhamento deste espectáculo?
Está ainda aberto e provavelmente estará até cinco minutos antes de a cortina se abrir. Mas devo fazer duas canções de Chico Buarque, uma é um clássico do cancioneiro brasileiro, “Sabiá”, em parceria com Tom Jobim, que está relacionada à minha temporada coimbrã, e uma novíssima, do último álbum, chamada “As Caravanas”. Algumas canções minhas, que o público espera ouvir, portanto vai ouvir, alguma coisa nova que escrevi, enfim, está a ser concebido.

De que forma vai levar a sua experiência no ensino para cima do palco?
Esse concerto é o trabalho de conclusão da minha residência em Coimbra. Durante as aulas pude reflectir muito sobre o pensamento selvagem, sobre a

Há diferenças significativas entre olhar o Brasil de fora para dentro e de dentro para fora?
Por um lado, é um bocadinho mais triste porque quando estamos lá nos adaptamos às situações mais absurdas, por outro é excitante por causa do nosso potencial, da nossa força de invenção, da nossa cultura, da nossa originalidade, da promessa que somos e da gente brasileira, calorosa, musical, selvagem, sem igual na Terra.

O que é que as suas vivências em Portugal têm trazido à sua música?
Experiências vividas, afectos, carinho dos amigos, cansaço, histórias engraçadas, problemas, tristezas, perdas, e sobretudo a poesia portuguesa, que me arrebata, que me dá sustos enormes.

Há cada vez mais talentos do Brasil a criar raízes em Portugal. A que se deve este crescente movimento migratório?
A que se deve não sei dizer, tem muito a ver com a democratização da informação que a internet instaurou. Parece que o Brasil, enfim, descobriu Portugal. Havia muita ignorância sobre a cultura portuguesa entre nós e isso está a se modificar, ainda bem, somos irmãos, partilhamos a língua mais bonita do mundo. Acreditávamos que nós tínhamos diversidade por sermos do tamanho de um continente, não havia a noção de que Portugal é tão diverso mesmo sendo tão pequeno.

Que preconceitos encontra ainda em Portugal em relação ao Brasil?
Às vezes somos tratados como “o outro”, no mau sentido, o inimigo, o refugiado, alguém que vem para cá roubar os empregos dos portugueses, mas esse tipo de reacção há em qualquer parte do mundo, e não só em relação a nós, é só abrir um jornal e olhar a situação do mundo.

Quando não está a dar aulas ou concertos, o que é que mais gosta de fazer em Portugal?
De estar por perto do professor Eduardo Lourenço, do arquitecto Siza Vieira ou da Mísia, e ouvi-los.

Conversa fiada

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último disco de estúdio, Mútuo Consentimento, é de 2011, mas até chegar a este Nação Valente, Sérgio Godinho não parou de criar. É que se acaso pára, confessa, crescem-lhe borbulhas. Aos 72 anos, cresce o desassossego da escrita mas não se imagina sem criar música e sem lhe dar palco. O irmão do meio é cada vez o irmão mais velho, mas continua a semear parcerias e a colher o melhor de outras gerações.

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Três anos depois de True, The Legendary Tigerman está de volta aos discos. E de que maneira. Com Misfit, um álbum de rock and roll gravado em trio, com Paulo Segadães e João Cabrita, no mitifacado Rancho de La Luna, estúdio de Dave Catching (earthlings?) em Joshua Tree. E com o EP baladeiro Misfit Ballads. E com o filme Fade Into Nothing, de Furtado, Rita Lino e Pedro Maia, cuja banda sonora será editada mais tarde.

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