Ana Bacalhau lançou o seu disco Em Nome Próprio em Outubro, e passado cerca de um mês os Deolinda anunciaram que iam fazer uma pausa. Antes do concerto de sexta-feira, no Teatro Tivoli, falámos sobre a sua carreira a solo e o futuro da banda.
A Deolinda anunciou um hiato por tempo indeterminado, em Novembro. É uma maneira de evitar dizer que acabou ou é mesmo uma só pausa?
Pelo menos da última vez que falámos era uma pausa (risos). Queríamos todos fazer coisas para lá de Deolinda, e calhava tudo na mesma altura. Começámos a falar e vimos que isto ia ser uma grande confusão para o público e para nós, porque íamos estar sempre a mudar de chip, e para evitar essa confusão achámos por bem fazer esta pausa.
Quando começaste a trabalhar neste disco Em Nome Próprio já sabias que iam parar?
Não. Quando comecei a gravar o disco, na minha cabeça, ia fazer as duas coisas em paralelo. Tanto que esperei algum tempo até achar que um disco a solo meu não faria mossa na carreira de Deolinda, ao mesmo tempo tempo que esperava pela minha maturidade. Depois do quarto disco de originais de Deolinda e dos dez anos, senti que faria sentido avançar para o disco a solo. Ainda não tinha pensado na pausa porque na verdade foi uma coisa a quatro.
Já tinhas dado concertos a solo, em Lisboa, muito diferentes entre si: no Teatro São Luiz, onde revisitaste as canções da tua adolescência, muita pop-rock anglo-saxónica, e no Caixa Alfama, onde cantaste o fado. Essas experiências influenciaram este álbum?
Foram essenciais. Não só para perceber o caminho que queria seguir, como os caminhos que já não faziam sentido para mim.
O disco tem um som menos português do que Deolinda, soa mais anglo-saxónico. É um reflexo daquilo que tu ouves?
Das minhas influências. Sempre me movi entre dois mundos, entre a tradição portuguesa e a pop anglo-saxónica. A tradição portuguesa vem da minha família, da aldeia da minha avó, onde passei tantos verões, e do ambiente mais rural. E a cultura pop anglo-saxónica não tem a ver com a minha família, mas mais comigo, com o mundo mais citadino da Lisboa onde cresci. Foi por causa desse cancioneiro que comecei a tocar guitarra e a cantar e a escrever. E para mim fazia todo o sentido que esses dois mundos estivessem no meu disco a solo e pudessem coabitar de forma harmoniosa.
Tiveste um grande leque de autores portugueses a escrever para ti, do Samuel Úria à Capicua, passando pelo Afonso Cruz e o Carlos Guerreiro, dos Gaiteiros de Lisboa… Qual foi o critério destas escolhas?
A admiração pelo trabalho deles, em primeiro lugar. Vejo-me como intérprete, alguém que traduz e canta as palavras, emoções e histórias de outros, e eu queria há muito cantá-los. Conheço-os a todos pessoalmente, menos ao Afonso Cruz, e eles conhecem-me bem. Como o disco era para me apresentar a mim, pedi para eles escreverem sobre a Ana que conhecem. E é um grupo tão ecléctico e heterodoxo que o achei ainda mais perfeito para chegar a todos os caminhos, a todas as sonoridades, a que queria chegar.
Curiosamente, o Pedro da Silva Martins, de Deolinda, não fez nada neste álbum. Foi uma decisão consciente?
Foi. Até foi falado entre nós. Achámos que Ana e Pedro poderia resultar em algo muito semelhante a Deolinda. E não era isso que se pretendia com este disco, pelo que achámos que faria sentido separar os projectos.
Tens estado a cantar Em Nome Próprio pelo país, mas agora vais dar um concerto maior, em Lisboa, no Tivoli. Vai ser diferente do que tens estado a fazer?
Não. Será basicamente o concerto que tenho vindo a apresentar, porque acho mesmo importante, pelo menos por agora, continuar a apresentar-me a mim e ao disco. Canto as 15 canções e mais algumas versões importantes para mim: Trovante, Fausto, Variações... Estava com medo que as pessoas não achassem graça ou sentissem a falta de uma canção de Deolinda, mas não, o espectáculo tem estado a ser muito bem recebido.
Não cantas mesmo nada de Deolinda?
Não tenho incluído Deolinda. Isso não quer dizer que no futuro isso não possa acontecer, mas nestes concertos de apresentação acho importante não misturar as coisas. Depois, talvez. Para matar saudades das canções de Deolinda.
Ana Bacalhau. Teatro Tivoli. Sex 21.30. Entre 20 e 27€.