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António Variações
© DRO filme sobre António Variações vai ser exibido a 17 de Julho

António & Variações: o concerto de homenagem com orquestra e excertos do filme

As Festas de Lisboa encerram este sábado com uma homenagem a António Variações. O espectáculo reúne grandes cantores portugueses nos jardins das Torre de Belém.

Luís Filipe Rodrigues
Escrito por
Luís Filipe Rodrigues
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António Variações teve uma passagem fulgurante pelas nossas vidas. Pela nossa música. Apresentou-se ao grande público em 1981 no programa O Passeio dos Alegres, lançou os primeiros singles em 1982, o álbum de estreia em 1983 e o segundo e último em Maio de 1984. Passados poucos dias, calou-se – morreu numa noite de Santo António em Lisboa, depois de quase um mês no hospital. Mas as suas canções continuam presentes na nossa memória.

A ideia partiu da EGEAC e foi executada por Luis Varatojo, músico no activo desde a década de 80 e que esteve na fundação dos Peste & Sida e A Naifa, entre outros projectos. "Eles convidaram-me e não hesitei em aceitar. Até porque o António Variações é uma figura muito importante na música moderna portuguesa”, na opinião do director musical. Tem razão. O minhoto foi um homem à frente do seu tempo, uma estrela pop que brilhou intensamente num país cinzento. Mas foi mais do que isso. Foi um compositor arrojado e inspirador, combinando as músicas de raiz portuguesas com linguagens e formas musicais anglo-saxónicas.

“Apesar de ter gravado só dois álbuns, tem uma obra riquíssima. Se contarmos também com o disco de 1989 da Lena D’Água [Tu Aqui, com cinco versões inéditas de Variações] e com o dos Humanos, em 2004, temos quase quatro discos com canções dele. E são todas boas”, continua Luis Varatojo. “Quisemos que o espectáculo fosse o mais possível representativo da obra e incluir quase tudo o que ele gravou. Vamos tocar 25 canções, incluindo os dois álbuns completos.” Dos Humanos, por exemplo, vão ouvir-se três temas.

Entre os cantores envolvidos neste tributo estão alguns “nomes mais óbvios” como a histórica Lena D’Água, Manuela Azevedo, dos Clã e dos Humanos, ou mesmo Ana Bacalhau, a vocalista dos Deolinda que ainda há cinco anos prestou homenagem ao cantor no Rock in Rio. A lista não acaba aqui. “Outro nome que pensei logo no início foi o Conan Osiris que, pela sua abordagem à música, me parece muito próximo de todo aquele imaginário. O Paulo Bragança porque também tem um canto próximo do Variações. E depois há a Selma Uamusse, que não é uma escolha tão óbvia, mas se formos ouvir as coisas que gravou com o Rodrigo Leão faz todo sentido”, justifica o director.

O mais inusitado é mesmo o acompanhamento musical. “A ideia era fazer um tributo com as canções dele, mas diferente do que já foi feito. Quando comecei a pensar no que se podia fazer de novo, apercebi-me de que aquelas músicas nunca tinham sido orquestradas. Foi o ponto de partida para o projecto”, garante. “Quisemos prescindir de uma das características principais da música dele que era ser rock, ou pelo menos ter instrumentação de rock. Decidimos tirar isso tudo e meter uma orquestra sinfónica.” Neste caso, a Orquestra Metropolitana de Lisboa dirigida pelo Maestro Cesário Costa.

Os arranjos para orquestra sinfónica foram feitos pelos músicos e compositores Filipe Melo, Filipe Raposo e Pedro Moreira. “A ideia foi usar as dinâmicas e as formas de trabalho da orquestra e sempre que possível subvertê-las. E até encarar a orquestra como uma banda de pop-rock. Há naipes que estão mais próximos da música original do que daquilo que é uma orquestra”, explica Luis Varatojo, que deu umas quantas “sugestões em relação à utilização da orquestra em algumas canções – se seriam mais madeiras, se seriam mais cordas, se seriam mais metais, onde é que entraria o coro [Gospel Collective].”

Foi também o director musical que decidiu meter o acordeão de João Gentil ao barulho. “Não é um instrumento clássico, no entanto enquadra-se bem neste repertório. E achei que ia ajudar a orquestra, dando um toque diferente a algumas canções que estavam mesmo a pedir um acordeão. Algumas já têm até de origem. Além disso, pensámos que era um instrumento que podia desarrumar um bocado as coisas. Porque se o Variações não era uma pessoa direitinha e arrumadinha, nós também não queríamos ser.”

Variações no grande ecrã. E no ecrã gigante

Não é só nos Jardins da Torre de Belém que nos vamos reencontrar com as canções de António Variações este ano. A 22 de Agosto estreia-se finalmente o filme Variações, realizado por João Maia, protagonizado por Sérgio Praia e em gestação há mais de uma década, com uma batalha judicial pelo meio. Em Belém vai ser possível ver alguns momentos da longa-metragem pela primeira vez. 

“O espectáculo vai ser pontuado por pequenos clips de vídeo que são excertos do filme”, avança Varatojo. “Isso vai ajudar-nos um pouco a contar a história do Variações enquanto músico. A mostrar como é que ele encarava a música e a compunha” Estes vídeos vão surgindo em vários momentos ao longo da actuação, encaixados entre as músicas. “Vão funcionar como o fio condutor do espectáculo.”

Cronologia de um cometa

António Variações passou fugazmente pela pop nacional, mas deixou um rasto notável. Hugo Torres mediu a cauda deste corpo celeste.

1944

Fiscal, seis da manhã. É a madrugada de 3 de Dezembro que dá as boas-vindas ao quinto filho de Jaime Ribeiro e Deolinda de Jesus. António Joaquim Rodrigues Ribeiro passa a infância na pequena aldeia minhota. Quando termina a quarta classe, desce para Lisboa, para trabalhar como marçano. No final dos anos 1960, é destacado como soldado para o Ultramar: Angola. Regressado são e salvo, trabalha como escriturário e depois barbeiro.

1981

Na década de 1970, viaja por Londres, Amesterdão, e acalenta um sonho: cantar. Estreia-se no Scarlatty Clube, salta para o Trumps e daí chega, em 1981, a O Passeio dos Alegres, o programa de Júlio Isidro na RTP. Leva à televisão “Toma o Comprimido” e “Não Me Consumas”. É o início da lenda. Com contrato assinado com a Valentim de Carvalho, grava dois álbuns: Anjo da Guarda (1983), com os GNR, e Dar & Receber (1984), com os Heróis do Mar. Actua por todo o país. O seu folclore vanguardista é um sucesso.

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1984

Dia de Santo António. Variações morre na sequência directa de uma broncopneumonia bilateral. Os sintomas anteriores indicavam que estava infectado com o HIV/Sida, mas como a doença ainda era em grande parte desconhecida, nenhum documento oficial indica o vírus como causa primeira.

1987

Delfins e Lena d’Água são os primeiros a gravar versões de Variações: “Canção de Engate” e “Estou Além”, respectivamente. Muitos foram os que se lhes seguiram. Isabel Silvestre cantou “Deolinda de Jesus”, uma homenagem à mãe. Os Dead Combo, com Márcia, e os Linda Martini atiraram-se a uma tarefa mais ardilosa: “Visões Ficções”.

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1997

O Melhor de António Variações é um momento de redescoberta. Em 2006, é editada uma segunda colectânea, A História de António Variações – Entre Braga e Nova Iorque, que traz no alinhamento dois inéditos em disco: “Toma o Comprimido” e “Não Me Consumas”.

1998

A Expo-98 e o reordenamento da zona oriental de Lisboa abriu-lhe as portas da toponímia. A Rua António Variações fica entre as estações do Oriente e de Moscavide.

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2004

Manuela Azevedo, Camané e David Fonseca são as vozes dos Humanos, o projecto que pegou em inéditos e fez, na prática, um novo disco de originais. Chegou a platina. “Maria Albertina” e “Mudar de Vida” foram os êxitos. Em 1989, Lena d’Água já o tinha feito, mas o impacto esteve muito longe de ser o mesmo.

2006

Manuela Gonzaga escreve a primeira biografia, António Variações: Entre Braga e Nova Iorque (editado pela Âncora e reeditado recentemente pela Bertrand). Dois anos mais tarde, Paulo Marques assina o caderno biográfico António Variações: Um Homem Além do Tempo (ed. Parceria A.M. Pereira).

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2009

O apartamento em Lisboa era uma espécie de museu particular, onde Variações guardava e expunha os mais diversos objectos. Em 2009, alguns deles foram a leilão no CCB. A maior parte dos 200 lotes – que incluíam ainda cassetes com gravações originais, manuscritos e peças de vestuário – foi vendida.

2014

Uma década depois dos Humanos, o Rock In Rio Lisboa seguiu-lhe as pisadas, montando um espectáculo com Linda Martini, Gisela João, Rui Pregal da Cunha e Deolinda. Zé Ricardo e Nuno Galopim estavam ao leme.

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2016

Variações, de António subiu ao palco da sala Mário Viegas no São Luiz. Um monólogo encenado pelo realizador Vicente Alves do Ó e protagonizado por Sérgio Praia.

2019

A muito aguardada biopic chega às salas de cinema a 22 de Agosto. Variações, de João Maia, tem novamente Sérgio Praia a dar corpo ao excêntrico barbeiro, cantor e performer.

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  • Música

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