Sílvia Pérez Cruz
© Alex RademakersSílvia Pérez Cruz
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Sílvia Pérez Cruz: “Portugal está no meu coração”

A cantora catalã Sílvia Pérez Cruz editou há uns meses o álbum ‘Farsa (género imposible)’. Falámos antes da sua digressão portuguesa.

Luís Filipe Rodrigues
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Escutam-se muitas músicas na música de Sílvia Pérez Cruz. Ao longo dos anos, a cantora catalã molhou o bico no flamenco e noutras músicas latinas, mas também no jazz, na folk, até no fado. E em Farsa (género imposible), o álbum que lançou este ano, está tudo isso e muito mais. As novas canções nasceram de colaborações e de trabalhos para outros campos artísticos, mas partilham o mesmo ADN, o dela. Devia ter vindo apresentá-las em Portugal no Verão, mas a Covid-19 obrigou-a a adiar a visita. Se tudo correr bem, vem agora. Deve começar uma mini-digressão com a Farsa Circus Band na segunda, 7, no CCB, em Lisboa; sobe até à Casa da Música, no Porto, na quarta, 9; e desce até ao Teatro das Figuras, em Faro, na terça, 15. A 19 de Dezembro, apresenta-se sozinha na Casa da Cultura de Ílhavo.

Apesar de seres catalã, tens uma relação antiga e próxima com Portugal. Cantaste fados, trabalhaste com músicos portugueses. De onde vem essa proximidade?
Há 20 anos que vou regularmente a Portugal. A minha irmã é casada com um português e os meus sobrinhos são portugueses, são alentejanos. Por isso, pelo menos uma ou duas vezes por ano vou aí. E compus muito do disco 11 de novembre numa casa no Alentejo profundo. Também sou muito amiga do Salvador Sobral, cantei com o António Zambujo, com Júlio Resende, com muita gente. Portugal faz parte da minha vida, do meu mapa vital. Está no meu coração.

O teu novo álbum chama-se Farsa (género imposible). Qual é a farsa a que te referes?
É uma alusão à diferença entre aquilo que sentimos e aquilo que mostramos, sobretudo nas redes sociais. A força que estamos sempre a tentar passar cá para fora e a fragilidade que na realidade sentimos. É importante reflectirmos sobre essa dualidade. Sobretudo nesta época em que o poderoso, o forte, o triunfante, o alegre e o estival são objectivos quase impossíveis e que na verdade só criam frustrações.

É um disco muito rico e variado, que remete para diferentes geografias. Consegues elencar as suas influências musicais?
É difícil de responder a isso, porque este disco resultou de três anos de trabalho em conjunto com outros artistas. Foram muitas horas, muitos meses, um trabalho de criação super-rico. Por exemplo, há influências americanas, do folclore argentino, uruguaio, até venezuelano, do Simón Díaz. E depois a Björk também é uma artista que sempre admirei muito, e talvez tenha influenciado algumas canções mais experimentais a nível musical. Também há uma canção de tango. Há música ibérica, por exemplo em “Pena Salada”. Há boleros, ainda uma influência de quando fiz o disco En la imaginación. E há também novos mundos, novas estruturas que não tinha trabalhado antes, como em “Ensumo L’Abril” ou “Fatherless”, que tem uma estrutura mais por capítulos, quase influenciada pela música clássica, mas não só... A estrutura lembra, por exemplo, aquela canção do Freddy Mercury. Como é que se chama?

A “Bohemian Rhapsody”?
Exacto. Vai passando por diferentes mundos. E eu nunca tinha feito isso. Também está aqui o flamenco, claro. E o fado, de certeza, na minha maneira de cantar. E a música clássica, pelo trabalho com o coro, há uma harmonia que lembra Bach. E depois acho que é um disco muito visual, quase como uma banda sonora. Nota-se que trabalhei as músicas desde muitos ângulos. E pronto, não sei se respondi à tua pergunta.

Sim, e de que maneira. Consegues definir a tua música só com uma palavra ou duas?
O que digo, por exemplo, quando entro num táxi e me perguntam o que faço, é que canto canções e emoções. Gosto de música. É verdade que neste disco se podem distinguir estilos – porque a obra de teatro ou a dança ou o filme para o qual foram pensadas originalmente o pediam – mas a minha relação natural é com a música. De certa forma, o parêntesis do título, a ideia de um “género impossível”, sempre definiu o meu trabalho. Porque perguntam-me sempre que estilo de música faço, e eu não faço estilos. Tento simplesmente transformar as minhas emoções em canções. Daí o género impossível. Adoro esse parêntesis.

Mas podemos dizer que, quando começaste a cantar com Las Migas, há mais de dez anos, eras uma cantora de flamenco. Ou não?
Não, não, não, não. Eu nunca fui nada.

Não dirias que Las Migas eram um grupo de flamenco?
Eram um grupo de flamenco. Mas repara que éramos uma violinista alemã, uma guitarrista flamenca da Bretanha francesa, uma guitarrista sevilhana que vivia na Holanda há dez anos. E eu que era catalã, que quase nunca tinha ouvido flamenco. Éramos quatro pessoas, amantes da música e do flamenco, que criaram um som próprio e começaram a tratar do flamenco de uma maneira muito própria, como um grupo. Mas nunca fui cantaora. Eu sou eu.

CCB. Seg 7, 19.30. 18-35€.

Conversa afinada

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