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East Side Radio
© Duarte Drago

Visita guiada às rádios online de Lisboa

Há várias rádios independentes em Lisboa. Estas três funcionam online e têm programação regular e diversificada.

Luís Filipe Rodrigues
Escrito por
Luís Filipe Rodrigues
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Nos anos 80 as frequências da cidade andavam em alvoroço. Um grupo de amigos, uma mesa de mistura, um microfone, uns discos e um emissor de FM eram suficientes para navegar as ondas hertzianas. Chamavam-lhes rádios piratas, por não terem uma licença de emissão, mas a sua popularidade valeu-lhes outros nomes mais dignos, como "rádios alternativas" ou "rádios livres". A TSF começou a emitir dessa maneira, mas foram poucas as rádios que sobreviveram – as rádios piratas afundaram em 1989, depois de o governo decidir organizar o espectro FM. Nomes como Rádio Som Livre, Rádio Livre Internacional, Rádio Juventude, Rádio Arremesso ou a Rádio Movimento, que entretanto ressuscitou, são apenas uma memória dessa época dourada das emissões improvisadas.

Passaram mais de 30 anos desde o silenciamento das rádios piratas, mas nunca foi tão fácil emitir para esse mundo fora. De certa forma, as rádios online vão beber a esses movimentos de faça-você-mesmo, ao empreendedorismo e carolice dos anos 80. Mas agora, sem depender de ondas AM ou FM, a navegação é mais fácil. E a pirataria acabou.

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Os novos dias da rádio

East Side Radio

East Side Radio

A primeira imagem que passa da East Side Radio é de descontração e boa onda. Gente de roda de uma mesa de mistura a passar som, com um recorte gigante do Snoop Dogg ao lado e o microfone fora do enquadramento. A voz dos DJs raras vezes se ouve, a música – electrónica e de dança de todo o mundo, mas também pop e rock – fala por si.

Não é descabido falar na imagem da rádio, no ar desde Dezembro, de segunda a sexta entre as 14.00 e as 18.00, já que os programas são filmados e transmitidos em directo online, como acontece lá fora, por exemplo na Red Light Radio de Amesterdão. A ideia da East Side Radio, de resto, começou a ganhar forma depois de os fundadores André Granada e Tiago Pinto, que passam música juntos como Funkamente, terem tocado na Red Light e em rádios semelhantes na Europa.

“Começámos a achar piada à ideia de uma rádio que funciona quase como uma cena aberta e em que os programas não precisam de ser recorrentes. Sem uma linha editorial clara”, explica Tiago, que já tinha feito rádio na universidade, em Coimbra. Granada, que também teve programas, mas na RUM e na Antena Minho, sublinha que “não é uma rádio com uma programação formal e regular, como uma rádio FM será”. E continua: “Queremos ter aqui pessoas, quer sejam de Lisboa ou não, que estejam cá e tenham vontade de partilhar música e gosto pela música, basicamente.”

Actualmente, os estúdios são nas traseiras de El Pinche Mercado, a nova mercearia mexicana da equipa do Pistola y Corazon. “Estamos aqui desde Dezembro”, conta Granada. Contudo, as instalações são temporárias. “A rádio chama-se East Side Radio porque o projecto foi pensado para a Factory, no Beato. E daqui a uns meses vamos mudar-nos para lá. Estamos aqui só enquanto as obras não estão feitas.”

Quando perguntamos sobre a evolução da audiência da rádio, eles não conseguem responder. Sabem apenas que há cada vez mais pessoas a entrarem em contacto para se juntarem ao projecto. “Também temos visto gente que toca cá e está a ter mais bookings”, sublinha Granada. “Há programadores que estão atentos ao que fazemos.” Eles próprios programam uma noite chamada Regulars, todas as quartas, das 22.00 às 04.00, no Le Baron. A entrada é livre. E a selecção musical não anda longe do que passa na rádio.

Rádio Movimento
© Duarte Drago

Rádio Movimento

No passado dia 31 de Março, o Clube Atlético de Campo de Ourique (CACO) abriu as portas para celebrar os dois anos da Rádio Movimento, que entre as seis da tarde e a meia-noite, de segunda a sexta, se pode ver e ouvir em directo no Facebook, no Youtube e, em breve, no Twitter – a emissão continua durante o resto do tempo, no site da plataforma, com música a passar mas sem pessoas nos estúdios cedidos pelo CACO desde 2017.

Contudo, esta história tinha começado quatro décadas antes. “A Rádio Movimento foi uma das primeiras rádios piratas de Lisboa, em 1980”, recorda o fundador António Diamantino. “Fizemos a emissão durante quatro ou cinco anos, até à altura em que fomos silenciados.” Um silêncio que só foi quebrado quando Vítor Machado, um dos locutores de antigamente, decidiu ressuscitar a emissora.

“O projecto nasceu de um desemprego involuntário”, começa por dizer Vítor. “E desafiei o António Diamantino [para se juntar a mim] porque era incapaz de retomar isto não trazendo o pai da criança.”

Hoje, a Rádio Movimento assume-se como uma rádio local, algo que de acordo com ele “falta em em Lisboa”. Nesse sentido, nos próximos tempos, vai haver uma maior aposta no noticiário da cidade, com a ajuda da jornalista e directora de informação Carla Santos Ribeiro, que pretende “ir às associações, fazer reportagens nos arraiais, etc”.

Local e inclusiva, sublinha o director. “Temos um programa de rádio para surdos, apresentado por um surdo, com tradução simultânea em linguagem gestual. Também temos dois locutores invisuais.” Todos ele têm outros trabalhos. E, por enquanto, ninguém aqui consegue viver da rádio. “A rádio é que vive de nós”, contrapõe Vítor Machado, com um sorriso nos lábios.

E não está a exagerar. Ao longo dos últimos anos, António e Vítor terão investido cerca de “45 mil euros” nesta aventura. Um valor considerável, mas que inclui “algumas coisas que já existiam”, segundo o director. “Eu já tinha mesas de mistura, o António já tinha computadores”, explica. “Todas as pessoas aqui trabalham pro bono. Fazem os programas para se sentirem realizadas.”

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Rádio Quântica
© João Viegas

Rádio Quântica

Marco Rodrigues (Photonz) e Inês Coutinho (Violet) estavam a andar de carro e a ouvir rádio, quando alguém suspirou: “Quem me dera que existisse uma [rádio como a rádio online londrina] NTS mas de cá, que em vez de passar isto passava aquilo, que em vez de ter este tipo a falar tinha antes aquele, que em vez de ser ideologicamente neutra dizia abertamente ao que vinha.” Isto aconteceu no Verão de 2015, e em Novembro do mesmo ano foi para o ar a primeira emissão da Rádio Quântica.

Ao fim de três anos e meio, o sucesso do projecto é inquestionável. A plataforma veio preencher uma lacuna que existia no panorama nacional, dando vozes a uma nova geração de artistas e DJs e a comunidades que muitas vezes não tinham espaço nas rádios mais tradicionais. As músicas electrónicas destacam-se na programação, mas também há espaço para punk, metal, reggaeton. E, num campo mais ideológico, nunca pararam de puxar por questões de “inclusão, paridade e feminismo”, nas palavras de Marco.

Quando perguntamos sobre a evolução da rádio, Marco sublinha que há sempre “muita música e muitas crews novas que vão entrando” na Rua das Gaivotas 6, onde ficam os estúdios da Quântica. “Estamos sempre a tentar mostrar o que de mais mais vital se faz em Lisboa e não só. Também no Porto”, continua. “E outros países”, interrompe Violet. “Começámos ligações com crews de fora de Portugal, com colectivos queer.”

Manter um projecto com estas ambições de pé requer “muitos malabarismos”, segundo Inês. “Somos DJs e não temos um trabalho fixo, por isso conseguimos fazer o nosso horário. Temos uma pessoa no estúdio [João Viegas], o que ajuda. Mas não dá para empregar ninguém, por isso acaba tudo por fluir de uma maneira mais orgânica e natural do que se tivéssemos alguém a trabalhar nisto full time. E mesmo assim vão acontecendo umas coisas.”

O maior desafio, para Marco, é “existir enquanto excepção total”, manter a independência num contexto em que o conteúdo digital está cada vez mais dependente de formas de monetização que não são as mais democráticas. “Arriscamos muito, sem ter uma grande robustez estrutural para o fazer. É esse o desafio, que a rádio continue”, assume o fundador. E há-de continuar. “Até porque a rádio já tem uma vida para além para nós”, como reconhece Inês. Marco concorda: “Se nós desaparecêssemos, a Quântica continuava da mesma forma.”

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