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Noites Príncipe: a batida do gueto alastra-se por Lisboa

Uma batida mutante, com origens em África mas tão portuguesa como o fado. Escrevemos sobre o passado, o presente e o futuro da editora que celebra sete anos no sábado, com festas simultâneas em quatro salas de Lisboa e uma do Porto.

Luís Filipe Rodrigues
Escrito por
Luís Filipe Rodrigues
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"A Príncipe é uma editora de Lisboa, inteiramente dedicada a editar música 
de dança contemporânea 100% real a ser produzida nesta cidade, nos seus subúrbios, bairros sociais e guetos. Novos sons, formas e estruturas com o seu próprio código de poética e identidade cultural.” Era assim que a Príncipe, que celebra sete anos no sábado, se apresentava ao público no início de 2012, e continua a ser verdade. O texto terminava com uma declaração de intenções: “Queremos certificar-nos que o trabalho incrível que está a ser produzido aqui deixe de permanecer desconhecido.”

Ao longo destes anos só não ouviu falar da Príncipe quem não prestou atenção. Os seus discos são elogiados em Portugal e no estrangeiro. E as suas festas, no Musicbox, são momentos inspiradores, onde gente de diferentes lugares e condições sócio-económicas se junta e se deixa tocar pela chamada “batida do gueto”, uma música electrónica com origens em África mas tão portuguesa como o fado.

“Aquilo é uma igreja. As pessoas vão lá libertar-se”, diz Cílio Manuel, 24 anos, a viver na Quinta do Mocho e mais conhecido como DJ Firmeza. Estreou-se nas Noites Príncipe em Maio de 2012, aos 17 anos, a convite do pioneiro DJ Marfox, e desde então tornou-
se um dos pilares da editora. “Há muitos estrangeiros que vêm de propósito”, continua. “Já aconteceu sermos contactados por malta que vem a Lisboa e quer marcar a viagem para coincidir com a próxima Noite Príncipe”, acrescenta o patrão José Moura.

Além de José Moura, a editora é gerida por Nélson Gomes, André Ferreira e Márcio Matos, que é o responsável pelas capas dos discos e a identidade visual do projecto. Pedro Gomes foi outro dos fundadores, mas saiu entretanto. José Moura faz, contudo, questão de sublinhar que nada é mais importantedoqueosartistas:“Amúsica é deles. Nós não inventámos nada. O que fizemos foi uma espécie de tradução para fora e para um público mais alargado.”

©Marta Pina

Música do tamanho do mundo

“O objectivo também foi exportar a música para o estrangeiro.” E a exportação tem sido um sucesso. A histórica editora Warp chegou a ter uma parceria com a Príncipe. Jornais como o The New York Times e revistas como a Fader dedicaram páginas inteiras à sua música. Sites como a Pitchfork ou o Resident Advisor mandaram jornalistas a Lisboa. Não há um lançamento que não seja noticiado internacionalmente. E os DJs actuam frequentemente no estrangeiro.

“Temos mais datas lá fora do que em Portugal. E as pessoas gostam mesmo de nós”, afirma DJ Firmeza. “Por exemplo, fui à China, subi ao palco só para ligar o computador e
 eles começaram logo a fazer barulho. Não acreditava. Tinham ido lá mesmo para me ver. Em Pequim. Parecia mentira. Pensei: ‘Porra, se morrer amanhã todo o mundo na China vai ficar triste’.” E desata-se a rir.

Não é só DJ Firmeza que tem histórias destas. DJ Marfox e Nídia, dois dos nomes com maior exposição internacional do plantel, lembram episódios parecidos. DJ Narciso, que é um dos mais recentes membros da família, estreou-se a tocar em Londres na passada sexta-feira, a convite de Tash LC, que trabalha para a BBC. O jovem da Rinchoa entrou no radar da editora há pouco mais de um ano, quando Márcio Matos encontrou a sua música no Soundcloud. Uns meses depois, o seu colectivo, a RS Produções, estava a lançar o primeiro disco com a etiqueta da Príncipe.

A internet, sublinhe-se, tem desempenhado um papel importante em toda esta narrativa. Foi online que os DJs Di Guetto, a crew de DJ Marfox, DJ Nervoso e outros nomes cruciais deste movimento largaram
a lendária compilação Djs Di Guetto Vol.1
em 2006. Nos bairros periféricos de Lisboa, quem os ouviu quis fazer o mesmo. A crew
de DJ Firmeza, por exemplo, chamou-se Os Piquenos DJs do Guetto por causa deles. Sem esse disco, sem esses produtores, hoje talvez não existisse nada disto.

José Moura também sublinha o papel das redes na criação e desenvolvimento desta música. “O circuito está todo no Soundcloud”, garante. “Nós somos apenas um veículo para que esse circuito se torne visível cá para fora.” Narciso sabe que é verdade, no entanto ressalva que “com a editora a música circula mais. Antes circulava entre as pessoas do próprio bairro, mas agora sai para fora de lá.” DJ Firmeza acrescenta outra ideia: “A Príncipe pegou em diferentes promotores, diferentes grupos e juntou-os.”


Nem tudo são rosas. Quando se fala em desafios, DJs e editores dizem que não têm
 a agenda tão preenchida como gostariam. “Por exemplo, nós temos capacidade de tocar em todos os festivais de Lisboa. Não tocamos porquê?”, interroga-se Firmeza. Quando se pergunta se isso não pode ter a ver com algum racismo, é peremptório. “Não. Racismo, não. Se calhar é porque ainda não fizemos barulho suficiente. Temos de batalhar mais uma beca para as coisas mudarem.”

A maioria ainda não consegue viver da música, por muito que lhes gabem o trabalho. “Dantes dizia que dava para viver disto. Mas agora, com um filho para criar, não dá. Não consegues, por exemplo, alugar nem comprar uma casa se não tiveres um contrato de trabalho”, conta Cílio. “No estrangeiro podem falar muito de ti, mas só isso não basta.”

“Às vezes, começo a ver que o melhor é emigrar. Porque aqui não dá”, continua o jovem produtor. “Não quero ser aquela pessoa que correu o mundo e acabou sem nada. Percorreste o mundo todo, fizeste tudo, e depois? O que vais deixar para os teus filhos? Não tens nada.” O texto podia terminar aqui.

©DR

Uma história por escrever

Mas ainda faltam muitos capítulos na história da Príncipe. O próximo escreve
-se já no sábado. Durante uma noite, os
 DJs da Príncipe vão ocupar algumas das melhores casas de Lisboa: inevitavelmente o Musicbox, mais a ZDB, o Lounge e as Damas. E um quinto clube no Porto, o Pérola Negra. “Acaba por ser uma maneira de reconhecermos o apoio que estes sítios deram à Príncipe e aos nossos DJs ao longos destes anos”, explica José Moura. Ele acredita que as pessoas vão circular pelos vários espaços. “Quem for às Damas também pode ir à ZDB, fazer o circuito todo, descer ao Lounge e acabar no Musicbox. Estamos à espera que as pessoas encarem 
a noite como uma espécie de um festival.”

Em Março voltam a concentrar energias no Musicbox, a sua igreja. Mas no sábado vão pregar para outras paróquias. Amém.

Mais noite

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