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Ben Wilson: “Lisboa é a porta da Europa para o mundo”

O historiador inglês Ben Wilson esteve em Portugal a promover o seu novo livro ‘Metrópoles’, onde Lisboa ocupa algumas páginas. Falámos no centro da cidade.

Renata Lima Lobo
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Renata Lima Lobo
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Metrópoles é uma viagem pela história das cidades, das primeiras grandes urbes erguidas há sete milénios até à actualidade. E é também uma análise social sobre estes territórios que sempre foram palco dos momentos mais marcantes da civilização, entre revoluções políticas, sociais e artísticas. 

Ben Wilson, historiador britânico, nasceu em Londres e é um confesso admirador das zonas densamente povoadas e de onde, diz, resulta o progresso da humanidade, principalmente em alturas de grandes mudanças, económicas, bélicas e, hoje, ambientais. Para o bem e para o mal, as cidades são para Ben Wilson as grandes impulsionadoras do progresso e criatividade – e estão a viver uma nova mudança, em grande parte ligada às alterações climáticas. Cidades mais verdes, com mais oferta de proximidade, com menos espaços de escritórios na sequência do teletrabalho são para Wilson uma solução ideal num futuro próximo e uma forma de defendermos as urbes, para que não definhem e com elas a capacidade inventiva da humanidade. 

“Cubro um grande território num livro relativamente pequeno para este tema. Mas o que estou a tentar dizer é que muito do nosso progresso enquanto espécie está ligado às cidades desde o início. São locais onde nos juntamos, inovamos, geramos ideias, é onde a mudança acontece muito rapidamente”, explica. 

Lisboa partilha um capítulo deste Metrópoles com Malaca (Malásia), Tenochtitlan (antiga capital do Império Asteca), e Amsterdão, cidades do mundo que se destacaram entre os anos de 1492 e 1666. Começa assim: “‘Ilustre e gloriosa’, Lisboa surpreendeu o médico e geógrafo Hieronymus Munzer de Nuremberga quando a visitou em 1494. Transformada, de um canto obscuro da Europa, na cidade mais excitante do continente, Lisboa ficava numa nova fronteira.” Uma fronteira que, como se lê neste capítulo, foi desbravada pelo rei D. Manuel I, mudando o país e Lisboa até aos dias de hoje. “Lisboa é há muito tempo a porta da Europa para o mundo. E é visível na arquitectura, na comida... todas estas coisas são fascinantes. As cidades são como livros, têm ecos do passado e nelas podemos descodificar a história, como evoluiu e porque é que as coisas são como são”, conta.

Metrópoles
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Ventos de mudança

Lisboa continua a ser uma cidade multicultural e cosmopolita virada para o mundo, mas experimenta as mesmas dores de crescimento que outras cidades globais: a gentrificação e, agora, a pandemia. “Guerras ou pandemias mudaram as cidades no passado e este é um momento ‘reset’ para pensar em como podemos mudar. As cidades são maleáveis, às vezes gradualmente, às vezes é um choque, mas adaptam-se, porque são lugares de criatividade”, defende Wilson, para quem é fundamental a conversão das cidades em espaços mais verdes com menos carros em circulação.

O debate que existe hoje em Lisboa sobre mobilidade acontece um pouco por todo o planeta. “Privilegiar o carro foi um erro histórico. Era utópico, uma reacção natural à mudança tecnológica, é compreensível. Mas temos de reconhecer que foi um erro. Em Berlim, durante a pandemia, muito espaço de ruas foi convertido em ciclovias e ficou permanente. Em Londres também fecharam ruas para as tornar mais verdes, o que criou tensão junto das pessoas que querem usar o carro. Na Coreia do Sul, em Seul, removeram uma auto-estrada para recuperar o rio. Eu não sei o que vai acontecer, mas acho que a tendência global para as cidades é mesmo remover os carros”, defende o historiador, para quem é urgente aproveitar as crises para trazer mudanças.

“Durante a pandemia tornou-se desagradável viver nas cidades, falou-se no fim das cidades, as pessoas queriam sair. O que pode acontecer é que as pessoas se habituem a trabalhar em casa e haverá uma menor necessidade das cidades terem tanto espaço de escritório. Podemos vir a libertar zonas para se tornarem mais residenciais e menos intensas em termos de negócios e turismo”, acrescenta.

O poder das comunidades

Ben Wilson identifica problemas das cidades ao longo da história, locais de “vício e imoralidade” que tanto atraem como afastam residentes. Mas as diversas comunidades são fundamentais. “Acho muito importante nesta era quando enfrentamos alterações climáticas e uma migração sem precedentes de pessoas para as cidades, manter a fé nas cidades e vê-las como o que são: lugares de grande crescimento, da base para cima. Devemos resolver os nossos problemas a nível local, a mudança consegue-se com os nossos vizinhos. Podemos viver mais próximos uns dos outros com uma economia circular. Encontrar um caminho para gerir o desperdício, a energia, os recursos”, defende o autor, adepto da ideia das “cidades dos quinze minutos”, mais sustentáveis. “Há uma necessidade de criar espaços verdes, as cidades têm de conseguir, por exemplo, absorver a água da chuva. A próxima fase da evolução é tornarem-se mais conectadas com a natureza”.

O historiador acredita que os transportes públicos deveriam ser o coração do actual desenvolvimento urbano e tem um elogio no bolso para Lisboa. “Já visitei Lisboa muitas vezes e adoro. Acho que é muito fácil circular e está bem posicionada para ter sucesso. E o seu clima, os espaços verdes, as ruas calmas tornam-se activos para a cidade. Cidades de tamanho médio como Lisboa ou Talin, na Estónia, podem ser as cidades do futuro, ao contrário do que temos privilegiado: as megacidades globais como Londres. As cidades médias têm melhor ambiente”. O outro lado da moeda é que “ainda há muitos carros a tomar o espaço” na capital portuguesa. “Dentro de dez anos espero que essas ruas tenham sido reclamadas por mais pessoas”.

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