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Ljubomir Stanisic está sem manias e com toda a paixão no novo restaurante

Cláudia Lima Carvalho
Escrito por
Cláudia Lima Carvalho
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O novo restaurante de Ljubomir Stanisic no Bairro Alto abriu há pouco mais de uma semana. 

A música dita a experiência: ouve-se “Born Slippy” dos Underworld, música do alucinante Trainspotting. Não é por acaso. O novo 100 de Ljubomir Stanisic é uma viagem empolgante, com muito rock, não apenas pelo mundo, mas pela vida do chef. Neste novo espaço, umas portas ao lado do antigo restaurante, Ljubomir reinventa-se, sem perder o que é: um chef apaixonado e que só quer que os seus clientes desfrutem da refeição. Sem regras nem peneiras.

Ao contrário do 100 Maneiras, agora fechado, o ambiente neste restaurante é escuro. O branco deu lugar ao preto, tornando tudo mais íntimo e sofisticado mas, ao mesmo tempo, mais descontraído. Parece uma contradição, mas é provavelmente a melhor definição de Ljubomir Stanisic.

Fabrice Demoulin/100 Maneiras

À entrada, depois de uma pequena escadaria, está a zona do bar, onde também se pode jantar. Mas a verdadeira experiência mora do outro lado do corredor. É aqui que fica a mesa do chef com 12 espaçosos lugares e vista privilegiada para a cozinha – o que permite não só acompanhar todo o processo, como ouvir algumas tiradas de Ljubomir, ou não fosse ele também conhecido por isso, especialmente depois do programa de televisão Pesadelo na Cozinha. Mas há mesas mais recatadas, se for caso disso. O que interessa é que descontraia e embarque na experiência.

Se o conceito de fine dining pode assustar os mais cépticos ou conservadores — e não esquecendo que quando comparado com o 100 Maneiras, Ljubomir subiu os preços (110€, sem bebidas), apontando a outros públicos — é caso para dizer que neste restaurante ele dá a volta às regras convencionais, aquelas que nos dizem que, em sítios assim, nos temos de comportar de certa maneira.

Fabrice Demoulin/100 Maneiras

A refeição estende-se por sete momentos, todos eles identificados como se de um livro se tratasse – e, falando de comportamentos e à-vontade, os talheres, por exemplo, só chegam com os pratos principais (os capítulos). Até lá, come-se tudo com a mão, sem vergonhas ou cerimónias, ao mesmo tempo que a música salta de Underworld para Márcia e Samuel Úria, por exemplo.

Mas tudo começa com um pão Rosa e broa de milho, acompanhados por ajvar, kajmak, pasteta, stelja e “manteiga” do mar. São eles a capa desta história bósnia. Segue-se uma beterraba com coentros, uma bolacha de arroz de lampreia e lampreia fumada, um tártaro de carabineiro, cabeça desidratada, especiarias e lima, uma bola de fogo com polvo, especiarias e picante e um charuto de Sarajevo, feito com uma espuma de batata, pão de chá fumado e “tabaco” duvan čvarci.

Fabrice Demoulin/100 Maneiras

A Introdução do livro que é a refeição faz-se com uma salada mista, composta por anchovas, trufa preta e parmesão. É para se comer à mão, quase de uma vez.

Chegados à história propriamente dita, o 1º Capítulo arranca com um lingueirão, lardo e manjericão, servidos numa folha a pedir que lhe pegue no final para beber o molho, uma vez mais sem vergonha de fazer figuras.

Vem depois uma cavala, composta com alho francês e caviar servido à frente do cliente, e uns tubérculos e leite de amêndoa para terminar o capítulo.

Fabrice Demoulin/100 Maneiras

O segundo momento da história, que é na verdade a quinta fase da refeição, traz para a mesa um salmonete em “chá” de presunto, uma língua de bacalhau em espuma de amêijoas e macadâmia, antes da majestosa cabeça de vaca, rábano, tutano e pão somum. Não por acaso, este último prato tem por nome “A última ceia” —  não por ser a derradeira (esperemos), mas por se transformar num momento de partilha que dá especial prazer a Ljubomir Stanisic, que pegou na receita do pai para agora servir este prato para ser comido como se comem os tacos, feito a gosto na mesa.

O posfácio, ou pré-sobremesa, é um foie pa’ tosse, uma brincadeira que combina foi gras, rebuçado Dr. Bayard, gelatina de vinho colheita tardia Mais Vale Tarde Que Nunca, iogurte e ras el hanout.

Fabrice Demoulin/100 Maneiras

Para a conclusão, o chef guardou três sobremesas, entre as quais está uma homenagem às vítimas dos incêndios que devastaram o país feita de linhaça, feno queimado e leite de amêndoa. Há ainda um gelado de ervas e flores e a peculiar “Pedra, papel ou tesoura”, em tudo semelhante a um ovo Fabergé, mas aqui em forma de globo, lá dentro esconde-se uma pedra com alho fermentado, chocolate branco e maracujá. “É para afastar as bruxas”, brinca Ljubomir.

Parece estranho? Parece, mas o segredo é seguir sem constrangimentos. Na verdade, em alguns pratos as explicações só chegam depois de se aventurar, já para não torcer o nariz ainda antes de experimentar.

O conselho é que vá com tempo, que ninguém lê um livro a correr. E lembre-se que este livro está sempre a ser rescrito e uma ou outra coisa pode mudar na experiência para respeitar a sazonalidade e a disponibilidade dos ingredientes. Nesta cozinha, o chef só abre o livro com o que é fresco e da época.

Rua do Teixeira, 39 (Bairro Alto). 91 091 8181. Seg-Dom 19.00-02.00 (a cozinha encerra às 22.30).

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