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Moradores querem jardim em vez de contentores no Martim Moniz

Renata Lima Lobo
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Renata Lima Lobo
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Na sessão de esclarecimento que decorreu no Hotel Mundial, ficou clara a vontade de quem frequenta a maior praça da Mouraria. Manuel Salgado ouviu com atenção.

Na Sala Azul do Hotel Mundial, decorreu nesta terça-feira à noite a apresentação e debate público do projecto de requalificação da placa central do Martim Moniz. Uma sessão que decorreu a pedido do presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, e onde se fez ouvir, bem alto, o desacordo da população presente relativamente ao novo projecto.

Pouco antes das 20.00, a hora marcada para o começo da apresentação, já Manuel Salgado e Miguel Coelho ocupavam os seus lugares, juntamente com o engenheiro Paulo Silva, representante do novo concessionário da placa central do Martim Moniz, o grupo Moon Brigade. Desde 2012 que o espaço é explorado pela NCS Audiovisuais, produtora mais conhecida por ter oferecido o Out Jazz a Lisboa, mas nos últimos anos multiplicaram-se as queixas, seja pela falta de manutenção do espaço, pela fraca qualidade da oferta ou pelo barulho até altas horas da noite.

O dono da empresa manterá a concessão, embora com novos accionistas, a tal Moon Brigade. Juntos desenharam um novo projecto para o Martim Moniz (na imagem de destaque) feito à base de contentores marítimos reciclados, adaptados à função do futuro mercado e que fazem uma ponte simbólica com a frente ribeirinha da cidade. “Uma solução flexível e funcional que permite recriar um ambiente de bairro”, explicou Paulo Silva, acrescentando que serão desenhados de forma a recriar ruas estreitas e pequenas praças.

O espaço estará apto para acolher algumas obras de arte urbana, uma curadoria que será feita pela Galeria Underdogs, e a oferta passará por cozinha do mundo, comércio local (da florista ao talho) e integração de algumas associações locais que se mostrem interessadas em ter aqui um espaço. Em alguns contentores, cada um com 2,5 metros de altura (alguns poderão ter dois pisos), será possível aceder à cobertura para admirar as vistas. A redução da utilização do plástico e a promoção de louça biodegradável e copos reutilizáveis também esteve em cima da mesa, bem como um parque infantil de dimensões generosas no lado do Hotel Mundial. O lago do extremo da Rua da Palma será mantido, segundo o projecto apresentado.

Mas nada disto convenceu a assembleia presente na sessão promovida pela Junta de Freguesia de Santa Maria Maior. E os que pegaram no microfone para fazer uso da palavra teceram duras críticas ao projecto. Moradores, arquitectos, associações e representantes políticos falaram durante mais de uma hora para no fim ficar bem claro que o povo quer paz e sossego. E um espaço verde que lhes devolva o silêncio e lhes permita respirar numa cidade cada vez mais lotada.

"Precisamos de silêncio"

Fernanda, moradora da Rua da Madalena, defendeu que esta operação é “completamente errada”. “As pessoas precisam de espaços vazios para descansar, precisamos de silêncio”, continuou arrancando palmas no final da sua intervenção, uma das primeiras. Maria João, moradora na Rua da Mouraria, desabafou o que tem sofrido com esta praça: “As pessoas não têm direito ao seu silêncio? Só falta um carrossel para ser a Feira Popular”.

Fábio Salgado, eleito pelo Bloco de Esquerda para a Assembleia de Freguesia, definiu este projecto como um “plano de urbanização do Martim Moniz”, repudiando a ideia de um bairro dentro de uma praça e não a opção por uma grande praça, onde ninguém falou de bancos, de mesas ou de sombras para descansar. Susana, moradora e arquitecta, rematou com “coisas que nascem tortas, dificilmente endireitam”, referindo-se à história desta praça, onde acredita que ficaria mais bem servida com um jardim público para ler um livro à sombra, sentada sem ter de consumir.

Lurdes Pinheiro, eleita da CDU para a Assembleia de Freguesia, também falou: ”Não temos um espaço para descansar a cabeça, é por demais. As pessoas estão muito infelizes”. O morador Bruno Carapinha pediu mais oxigénio: “Faz falta um espaço verde, até para baixar a temperatura da cidade. Os próprios turistas têm interesse”. Cristina, que vive na Mouraria há 20 anos, juntou-se aos apelos: “Ruas estreitas temos em todo o lado, precisamos de um jardim. Esplanadas temos em barda”. Alexandra Esposito, do grupo de moradores Coração Alfacinha, defendeu que “uma praça não deve ter texto. Uma praça é ao ar livre e os contentores ficam bem nos navios do Tejo”. E muitos mais assinaram por baixo estas opiniões.

No final, Paulo Silva explicou que vão impôr aos futuros inquilinos a proibição de ruído e que o que presidiu à concepção deste projecto foi fazê-lo para a população local e para o bairro. “Não foi a nossa intenção apresentar um projecto turístico”.

Manuel Salgado ouviu tudo em silêncio e a palavra foi-lhe devolvida no final da sessão. “Tomei nota do que foi dito. Ouvi que a maioria das pessoas prefere um jardim público e isso ficou claro no meu espírito”. E prometeu que irá discutir o assunto no executivo da Câmara Municipal de Lisboa, deixando claro, no entanto, que não promete qualquer desfecho: “Não me cabe a mim decidir, é a única coisa que vos posso dizer”.

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