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Música, poesia e videoarte: uma instalação imersiva a três no maat

"Viagem pelo Esquecimento" junta João Gil, Mia Couto e Ana Mesquita num vídeo que aborda 12 temas. Para ver até 5 de Maio.

Mauro Gonçalves
Escrito por
Mauro Gonçalves
Editor Executivo, Time Out Lisboa
Viagem ao esquecimento, João Gil, Ana Mesquita, Mia Couto
© Mariana Valle Lima
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Mulheres, migrantes, o planeta, o amor e a vida nas cidades — são 12 os temas resgatados do esquecimento e convertidos em objecto de reflexão através da arte. Ou melhor, com a ajuda de três linguagens, agora fundidas numa instalação apresentada no maat (Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia). Os acordes de João Gil e os poemas inéditos de Mia Couto ecoam numa das salas do museu, embalados pelo trabalho de imagem, luz e som de Ana Mesquita. "Viagem pelo Esquecimento" junta tudo isto numa experiência imersiva desenvolvida durante os últimos quatro anos. 

"Somos amigos há anos. Há anos que o Mia gostava de escrever letras para as canções do João e há anos que eu queria fazer uma instalação. A ideia nasceu lá em casa — o João disse-se que tinha uns quantos na-na-nas que não tinham letra. Pensámos que podia ser o ponto de partida", explica Ana Mesquita, em conversa com a Time Out. Das primeiras notas às melodias consolidadas, a orquestração, feita com a ajuda de Luís Figueiredo, envolveu 14 músicos e uma rede de autores com peças-chave nos Estados Unidos, na Noruega, no Brasil e em Moçambique.

"Quando começámos a trabalhar, o Mia mandou-me alguns poemas e comecei a tentar encaixar música e letra. Mas a libertação só aconteceu quando o Mia percebeu que a sua poesia podia ser livre e encontrar com a música, sem limitações de métrica, sem aquela obrigação de quando se escrevem canções para serem cantadas. Aí sim, vimos o trabalho a começar", detalha João Gil, que resistiu ao primeiro impulso de produzir mais um disco. O trabalho a quatro mãos evoluiria para um território bem mais experimental e acabaria por encontrar nas vozes de artistas como Maria Bethânia, Diogo Infante, Carlão e Manuela Azevedo, entre outros, uma expressão além da música convencional. "Encontrámos vozes para dizer, não para cantar. Nunca fiz nada disto, é um passo gigantesco na minha vida musical, sinto que cresci", remata o músico.

Inéditos, os versos de Mia Couto surgem ao longo de quase 70 minutos, divididos por 12 poemas. "Achámos que tínhamos de contar uma história e essa história é esta viagem por aquilo que foi esquecido sistematicamente: o facto de já termos sido todos escravos e migrantes, das mulheres já terem sido deusas. Tudo isso foi soterrado, tínhamos obrigação de o devolver à luz", assinala o escritor.

Viagem pelo esquecimento, maat
© Mariana Valle LimaJoão Gil, Ana Mesquita e Mia Couto

Se alguns dos temas abordados já eram pertinentes quando a instalação começou a ser concebida, a actualidade encarregou-se de tornar a mensagem ainda mais urgente. "Uma das coisas que me agradou bastante neste trabalho foi a grande sintonia na leitura inteligente da história. Quando ouvimos falar de seres biologicamente puros, rimo-nos. É bom viajar pelo esquecimento para perceber que nada disso é verdade e que a humanidade é fruto de movimentações", adiciona João Gil. "Por isso é que a música que fiz para os migrantes tem um lado tão tranquilo. Não fui pelo lado violento das imagens que vemos todos os dias. Esta 'Viagem pelo Esquecimento' está carregada de pequenas frases poéticas, mas tão tensas e profundas."

Ana Mesquita não foi só a autora do conceito imersivo e colaborativo que deu origem a "Viagem pelo Esquecimento", foi também o elo de ligação entre os diferentes autores — fotógrafos e cineastas envolvidos na recolha e produção de imagens, entre as quais centenas de desenhos da autoria da própria artista. Isabel Nolasco, António Proença de Carvalho, Henrique Blanc, Pedro Senna Nunes e Vasco Pinhol, que mergulhou no mar norueguês para captar imagens subaquáticas, são alguns dos nomes envolvidos no projecto.

Viagem pelo esquecimento, maat
DR

"Quis que envolvesse muita gente e que fosse um projecto multitask, que desafiasse o olhar. E que esta instalação não fosse só mais uma, com imagens plasticamente bonitas, mas que fosse mais multi-sensorial, que as pessoas saíssem daqui mais cheias e até perturbadas com algumas coisas", refere Ana. "Viagem pelo Esquecimento" ocupa uma das salas do maat. Com quase 70 minutos de duração, o filme é exibido continuamente durante o período de funcionamento do museu.

maat. Qua-Seg 11.00-19.00. Até 5 de Maio. Entrada: 9€ (gratuita no primeiro domingo de cada mês).

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