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Não havendo resposta ao “inferno instalado na cidade”, Plataforma Lisboa promete tribunal

Paula Teixeira da Cruz, mandatária do grupo de 18 movimentos e associações de moradores, fala de "atentado a direitos fundamentais". Sujidade, ruído e consumos "a céu aberto" são principais queixas.

Rute Barbedo
Escrito por
Rute Barbedo
Jornalista
Bairro Alto
Said Karlsson | Erasmus Corner | Bairro Alto
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"Lisboa é hoje um imenso bar aberto, onde se consome álcool e droga, com ruas transformadas em casas de banho públicas." O retrato é feito pela advogada Paula Teixeira da Cruz, mandatária que irá, em regime pro bono, defender as causas do grupo cívico Plataforma Lisboa, apresentado esta quarta-feira, 2 de Julho, e formado para reivindicar uma melhor gestão da cidade tomada pelo excesso de ruído, lixo e desregulação da vida pública.

Formada por 18 movimentos e associações de moradores, a Plataforma Lisboa vai apresentar um caderno de reivindicações ao poder público (começando pela Câmara Municipal de Lisboa, e dirigindo-se, se necessário, ao Governo central) no sentido de combater o "inferno instalado na cidade", nas palavras de Magda Costa, da associação Aqui Mora Gente. "Vamos dialogar com os órgãos municipais e com a administração central. Muitas das associações aqui presentes, aliás, já apresentaram propostas e nós vamos continuar esse caminho, só que não vamos esperar muito. Temos uma agenda claramente definida e vamos tratar disto de uma forma muito profissional e objectiva. Os órgãos da administração pública estão obrigados a exercer as suas competências", afirma a antiga vereadora da autarquia lisboeta e ministra da Justiça do governo de Pedro Passos Coelho. Havendo "restrições a direitos fundamentais, a lei prevê meios de acção de tutela jurídica", acrescentou, fazendo ver que "a lógica é resolver, não litigar". Depois do diálogo, não assistindo a respostas aos problemas da cidade, o grupo promete partir para a via judicial.

Acção de protesto contra ruído dos moradores de Santos
DR (via Aqui Mora Gente)Acção de protesto contra ruído dos moradores de Santos

Entre os direitos fundamentais colocados em causa, Paula Teixeira da Cruz nomeia o facto de "as pessoas não poderem circular livremente". Dois exemplos: "uma criança de 12 anos que não pode ir sozinha à mercearia" e os idosos que "sentem receio de sair de casa" em diferentes zonas de Lisboa. Já para Paulo Ferrero, do Fórum Cidadania Lx (que também integra a Plataforma Lisboa), a preocupação é com a destruição do património. Da sujidade das ruas, ao graffiti e ao vandalismo, passando pelos "lagos secos da Avenida da Liberdade", pela venda ambulante ilegal ou pelo incumprimento da distância mínima que deve ser deixada entre uma esplanada e o fim da via pedonal, deixando espaço para os peões circularem, são inúmeros os pontos elencados pelo responsável, que acusa o poder público de não responder à degradação da cidade, agravada no pós-pandemia. Para Paulo Ferrero, "só com mais pressão sobre as entidades responsáveis é que talvez se consiga mudar alguma coisa".

Outros motivos que conduziram à formação deste novo grupo foram a insegurança, a insalubridade, a degradação e a descaracterização do espaço público, mas também as condições de funcionamento de alguns estabelecimentos comerciais, incumprindo horários de fecho ou os parâmetros de ruído regulamentados.

Em suma, "são anos de degradação continuada, de que a Câmara de Lisboa tem total conhecimento, nem que seja através das reuniões descentralizadas regulares onde todos estes problemas são denunciados. E não tem uma acção, uma estratégia ou sequer uma vontade de resolver", acusa o grupo de moradores Aqui Mora Gente, citado pelo jornal Público.

"Muito para além do centro histórico"

O "inferno instalado" de que fala Magda Costa, de um movimento cívico que conta 12 anos de luta contra o excesso de ruído, lixo e outros desequilíbrios entre a animação nocturna e a vida dos moradores, sobretudo na freguesia da Misericórdia, já se restringiu ao núcleo da cidade, mas hoje "vai muito para além do centro histórico", constata a responsável. "Prova disso é que na Plataforma Lisboa há associações de quase toda a Lisboa", contando com Alvalade, Alcântara ou Arroios. Espera-se, inclusive, que o grupo integre outras associações, que já terão manifestado o interesse pela causa.

Praça das Flores
DR via JFMPraça das Flores

Arroios é, aliás, um "exemplo paradigmático do que se está a passar na cidade, com bares a debitarem música para dentro das casas das pessoas e as entidades responsáveis a fazerem absolutamente zero para resolver", defende Filipe Dias, do grupo de moradores Vizinhos de Arroios. "O fenómeno já chegou às Avenidas Novas, a Alvalade, e, em breve, se nada for feito, vai chegar a casa de todas as pessoas", reflecte o morador, dando conta de um "crescimento exponencial" do número de estabelecimentos de restauração na freguesia, desde 2020. Hoje, 132 fecharão entre as 23.00 e a meia-noite, e 55 entre a 01.00 e as 02.00, de acordo com as contabilizações do grupo. 

Licenciamento zero, fiscalização zero

A falta de fiscalização por parte da Câmara de Lisboa e por entidades como a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) é uma das queixas apontadas pelos moradores. "Em Lisboa, o licenciamento zero [que entrou em vigor em 2013 para simplificar os processos de abertura, modificação e encerramento de estabelecimentos comerciais, retirando a necessidade de emissões de licenças ou autorizações] passou a ser sinónimo de fiscalização zero e foi esta a porta de entrada para o caos actual", aponta Magda Costa.

O fim do licenciamento zero foi pedido ao Governo pelo presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, em Fevereiro deste ano, atirando assim a responsabilidade ao poder central. Mas "a Câmara pode sempre fiscalizar, pode fazer mais", alerta Paula Teixeira da Cruz.

Além de um diálogo activo com as entidades responsáveis e do recurso a vias judiciais caso encontrem entraves ou ausência de respostas, a expectativa é que a Plataforma Lisboa cresça, abrangendo ainda mais território. 

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