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trigo barbela
Raquel Dias da Silva

O Il Mercato agora serve pizzas biológicas (e nós fomos aprender a fazê-las)

Raquel Dias da Silva
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Raquel Dias da Silva
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No restaurante Il Mercato, nas Amoreiras, já se servem pizzas biológicas, feitas com farinha de trigo antigo. O resultado é tanto fruto do sonho do chef nepalês Tanka Sapkota, obcecado pela sustentabilidade e por produtos locais, como da coragem do produtor Adolfo Henriques para resgatar da extinção cereais portugueses, na Aldeia da Maçussa, na Azambuja.

Uma hora de carro é quanto basta para alcançar a Granja dos Moinhos, composta por três adegas recuperadas, onde Adolfo Henriques vende os seus produtos, entre os quais as geleias, azeites e vinhos, queijos de cabra e pão de barbela. Mas o trigo barbela, outrora extinto, não serve só para fazer pão. Após várias experiências até alcançar a moagem certa, Tanka Sapkota começou a usar, há cerca de um mês, a farinha de trigo barbela, integral e biológica, para fazer pizzas no Il Mercato, um dos seus três restaurantes italianos em Lisboa, este no Páteo Bagatela, perto das Amoreiras. “O teor de glúten é menor, a massa fica mais fofa e é mais fácil de digerir”, explica. “Vão perceber.” Mas, antes de nos sentarmos à mesa na capital, fazemos mais uma viagem: o chef faz questão de mostrar onde tudo começou.

As plantações de barbela e espelta, outra variedade de trigo antigo cultivada por Adolfo sem recurso a quaisquer herbicidas, encontram-se a pouco mais de um quilómetro da Granja dos Moinhos. O cenário é desconcertante. Ao todo, são seis hectares de trigo barbela. Observando-o, alto e dourado, com montes verdes a envolvê-lo, é difícil imaginar que, trazido para Portugal pelos árabes no século VIII, já nasceu e deixou de ser produzido no país três vezes. “O barbela também é conhecido por morto-vivo”, conta Adolfo Henriques, acrescentando que a sua produção não é tão rentável porque tem menos bagos por espiga e não é tão fácil de moer como o trigo moderno. “Mas traz mais nutrientes e é muito rico em óleos naturais.”

trigo barbela
Adolfo Henriques e Tanka Sapkota
Raquel Dias da Silva

“É cinco a seis vezes mais caro, mas os benefícios para a saúde e o sabor compensam”, garante Tanka Sapkota, que trabalha com a farinha de Adolfo há cerca de quatro meses ‒ ainda está a testar a de espelta, uma variedade etrusca. É apenas um hectare, mas Adolfo garante que é a primeira seara em Portugal. “É um momento histórico”, afirma o agricultor, que tem contribuído para a revolução do pão em Portugal, mas também para a recuperação de produtos nacionais que caíram em desuso. Se fosse possível estender a visita, a próxima paragem seria o moinho com mó de pedra, onde o trigo é moído como antigamente, mas está quase na hora de almoço e o chef está com vontade de pôr as mãos na massa.

“O mais importante é o trigo, a fermentação e o acto de amassar à mão”, começa por dizer o chef nepalês, já em Lisboa. No Il Mercato, atrás do balcão da loja do restaurante, onde é possível encontrar produtos italianos à venda, tem uma máquina de amassar especial, a impastatrici a bracci tuffanti. Ao contrário das máquinas automáticas, que aquecem a massa entre oito a dez graus centígrados, esta simula quase na perfeição as mãos de uma pessoa. Como não exerce tanta força, mal aquece.

Antes de amassar, é necessário fazer a massa-mãe. A receita é simples: água da torneira (morna, entre 17 a 18 graus), azeite português, sal, fermento natural e farinha (70% de barbela e 30% de preta amarela, ambas nacionais, integrais e biológicas). Mas não se acrescenta a farinha toda de uma vez. É suposto fazê-lo em três fases e o processo demora, ao todo, uma hora. Depois é preciso mais dois dias de fermentação, para a massa levedar. Se fosse feita com farinha moderna, como as usadas nos outros dois restaurantes, demoraria apenas um dia e meio.

Raquel Dias da Silva

Já na cozinha, os truques são outros. O chef Tanka exemplifica primeiro como criar o formato da base, com o mínimo de manipulação possível, para não perder o ar da massa. Parece difícil e é. Para os menos experientes, as primeiras vezes prometem pizzas deformadas ‒ depois de colocarmos os ingredientes (tomate San Marzano na base, o resto é à vontade do freguês, desde figos biológicos a cogumelos portobello ou porcini), é bem mais fácil cozê-las. O forno a lenha aquece a 320 graus e basta cerca de dois a dois minutos e meio. Depois é apreciar o resultado. A massa é fofa, como nos tinha sido dito que seria, mas não deixa de ser estaladiça e é fácil reconhecer onde havia ar.

Na ementa, contam-se doze pizzas feitas com farinha de trigo antigo e produtos biológicos e DOP (Denominação de Origem Protegida), entre os 10,95€ e os 19,95€. Entre as propostas, encontramos, por exemplo, clássicas como a quattro formaggio, com tomate San Marzano DOP, gorgonzola bolo nero DOP, taleggio DOP, mozzarella de búfala DOP e parmigiano reggiano DOP (12,95€); e a diavola, que leva tomate San Marzano DOP, mozzarella de búfala DOP, nduja DOP, cogumelos portobello bio e azeitonas galegas (13,95€); mas também especiais, como a funghi porcini e tartufo nero, com tomate San Marzano DOP, cogumelos porcini biológicos e trufa negra da época (11,95€) e a fichi, copa stagionata e bottarga, com tomate San Marzano DOP, mozzarella búfala DOP, figos biológicos e copa stagionata e bottarga (19,95€).

“Este projecto de usar mais produtos portugueses é de tal modo importante – e fruto de uma vontade antiga – que posso dizer-vos que no início de 2020 a minha procura pela sustentabilidade irá materializar-se de forma mais sólida”, partilha o chef Tanka Sapkota, proprietário dos espaços Come Prima, Il Mercato e Forno d’Oro. É esperar para ver – neste caso, para provar.

Il Mercato. Passeio do Páteo da Bagatela, Rua Artilharia, 1 51, Bloco B, Loja M (Amoreiras). Ter-Dom 12.00-15.00, 19.00-23.00.

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