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C. Tangana (Sónar 2022)
Ana Paez SedanoC. Tangana (Sónar 2022)

O Super Bock Super Rock este ano resume-se a um nome: C. Tangana

C. Tangana, um dos maiores vultos da música latina, é o nome que mais se destaca no cartaz do Super Bock Super Rock deste ano. Toca esta sexta-feira, 15, na Altice Arena.

Luís Filipe Rodrigues
Escrito por
Luís Filipe Rodrigues
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Quando C. Tangana se estreou ao vivo em Portugal, em Fevereiro de 2019, alertámos para a dimensão do acontecimento nestas páginas. Na altura, o nome estava longe de estar nas bocas de tanto mundo como hoje, mas já era suficientemente falado para encher uma sala do Cais do Sodré. Três anos, uma pandemia e um daqueles álbuns que fazem uma carreira depois, reencontramo-nos com ele. Agora no topo do cartaz do segundo dia do Super Bock Super Rock, esta sexta-feira, 15, menos rapper, menos machão, mais pop, mais emotivo e aberto ao mundo. Quase como um xamã que guarda dentro de si – e partilha com todos aqueles que o ouvem – anos e anos de músicas espanholas e do continente sul-americano.

C. Tangana sempre gostou de partilhar o que tinha – palavras e canções que pegam fogo nas plataformas de streaming. Foi esse gosto pela partilha de músicas e de ideias que lhe valeu os primeiros Grammys da carreira, por ter escrito com a sua ex-namorada Rosalía a maior parte das canções de El Mal Querer (2018), o segundo álbum da cantora espanhola. E que o levou a editar uma mixtape repleta de convidados, como Avida Dollars, também de 2018, onde a palavra “featuring” (ou, em espanhol, “con”) se lia no final de todos os títulos.

Todavia em El Madrileño, álbum-charneira do ano passado, levou essa tendência para partilhar ideias ainda mais longe – além do habitual co-conspirador Alizz, que co-produziu o disco com ele, os créditos são uma espécie de quem é quem da música latina ao longo das décadas. Estão lá veteranos como os populares Gipsy Kings, o guitarrista brasileiro Toquinho, o cantor e guitarrista cubano Eliades Ochoa, do Buena Vista Social Club, o cantor e compositor porto-riquenho José Feliciano, o roqueiro (e não só) argentino Andrés Calamaro, dos madrilenos Los Rodríguez, ou o músico espanhol Kiko Veneno. Mas também gente um pouco mais nova, como o mexicano Ed Maverick, o norte-americano Omar Apollo, a espanhola La Húngara, o uruguaio Jorge Drexler ou o produtor catalão Raül Refree, entre outros.

Todos estes homens e mulheres ajudaram a enformar o disco. No lugar do trap e da música urbana latina dos álbuns pré-2020, ouvimos uma série de idiomas populares de Espanha e da América do Sul. Ouvimos o flamenco, claro, mas também a bossa nova, o son cubano, o tango argentino, corridos mexicanos e muito mais, tudo isto filtrado por uma sensibilidade e uma produção muito de agora, muito pop. E depois há as letras, despidas e emotivas, onde o madrileno questiona a maneira como a masculinidade tóxica o deformou, as relações que sabotou e as cicatrizes deixadas pelas mulheres que ele magoou e que o magoaram (sejam elas desconhecidas ou celebridades como a cantora Rosalía e a modelo e actriz Berta Vázquez, que não são chamadas pelo nome, mas é óbvio quando está a cantar sobre elas).

Numa das muitas entrevistas que deu no ano passado, a alguns dos maiores meios de comunicação do mundo, como The New York Times, Rolling Stone ou NPR, Antón Álvarez Alfaro, o homem que conhecemos como C. Tangana, disse que El Madrileño foi o resultado de uma espécie de crise dos 30. Estava a ficar (um pouco mais) velho e não queria ser um daqueles rappers “embaraçosos”, que se comportam como se tivessem menos dez anos.

Não foi só isso que aconteceu, porém. Noutra conversa, com o periódico espanhol El País, admitiu que “se não fosse pela pandemia, só ia ter começado a fazer El Madrileño no final de 2021. Tinha gravado um disco de música urbana, com muitíssimo rap, onde superava o trap. Mas começou a pandemia e comecei a ficar incomodado, pareceu-me que não estava à altura do momento. Este disco está.” Não por ser um disco confinado e opressivo, antes pelo contrário, é conciliatório e aberto ao mundo, uma celebração da canção espanhola e dos seus legados, mas também do que acontece de bom e de mau quando pessoas com diferentes vidas e influências se cruzam, quando os corpos se roçam, fundem e contorcem. É uma lembrança do que perdemos naqueles dois anos e uma garantia de que, mais cedo ou mais tarde, vamos voltar a tê-lo.

Ou melhor, era. Um ano mais tarde, voltar a El Madrileño é ouvir uma promessa cumprir-se. As pessoas voltaram a sair à rua. E voltaram ainda com mais ganas. Perdeu-se muito. Muitas vidas, muitas relações, muitas amizades. Muitos corpos são, por dentro e por fora, ruínas do que foram antes do vírus entrar nas nossas vidas – quer tenha ou não entrado nos nossos pulmões. Mas continuamos aqui. E esta sexta-feira, pelas 22.00, numa Altice Arena transformada em Palco Super Bock, vamos celebrá-lo. Com as pessoas à nossa volta, com El Madrileño, com C. Tangana, um homem disposto a expor as suas cicatrizes para não termos medo de destapar as nossas.

Super Bock Super Rock. Parque das Nações. Qui-Sáb 16.30. 58€-225€

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