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É assim que se caminha no sentido de um mundo mais sustentável. Devagarinho, passo a passo, deixando o mínimo de pegada possível – ecológica, claro. E foi a pensar em quem quer mudar de vida e torná-la mais verde que nasceu a Peggada, o puzzle agregador das peças soltas que abraçam a sustentabilidade na capital – falamos de restaurantes, hotéis, lojas de segunda mão e de granel. A vertente educativa também lá está, com entrevistas, eventos e muitas dicas para aplicar em casa.
A Peggada tem três cabecilhas, mas foi Marta Cerqueira, jornalista e activista ambiental, que plantou a semente. Há anos que se preocupa com o comportamento ecológico e a forma como as suas acções afectam o planeta, tanto que sempre apregoou a mudança de hábitos e estilos de vida entre amigos e família, que aproveitavam aquela fonte de sabedoria ambiental para tirar dúvidas e pedir conselhos. “As pessoas que me conheciam perguntavam-me coisas sobre reciclagem, roupa em segunda mão e outras coisas relacionadas com o ambiente, e cheguei à conclusão que podia alargar esse espaço de influência a mais gente, foi aí que surgiu a Peggada”, conta Marta.
O projecto acabou a ser um dos finalistas do programa Women4Climate, da Startup Lisboa e da Câmara Municipal de Lisboa, que juntava projectos de mulheres empreendedoras na área da sustentabilidade. Durante o programa conheceu Lígia Gomes, que acabou por se juntar à equipa na parte mais logística e de gestão de comunidade, assim como Hugo Nogueira, que se dedica ao design e redes sociais.
Estavam reunidas as condições para o site da Peggada finalmente vir ao mundo. A plataforma é um meio de consulta dos negócios sustentáveis em Lisboa (para já), como restaurantes, lojas de segunda mão, ecológicas e de granel e hotéis. Cada local tem uma breve descrição e é acompanhado por dados como a morada, contacto e horário de funcionamento.
A base de dados actual resultou de uma pesquisa intensa e de critérios bem específicos, sobretudo no que toca aos restaurantes, locais onde é mais difícil definir se afinal são ou não sustentáveis. “Tivemos que definir alguns critérios para percebermos que restaurantes incluir, e mais um mito que se deita abaixo – não são só restaurantes vegetarianos ou vegan que estão na lista”, explica. “Tivemos de olhar para as práticas de cada um, como a opção de não imprimir factura, não usar descartáveis, fazer reciclagem, utilizar os alimentos no seu máximo. O Pigmeu, por exemplo, é especializado em carne de porco mas está na lista, porque usa o animal de uma ponta à outra. Temos de olhar para tudo.”
Os negócios exclusivamente online são outra história. Assim que a plataforma ficou online começaram os pedidos de quem opera sem barreiras geográficas para fazer parte da Peggada. “Pensámos isto inicialmente como uma plataforma de sítios físicos, apesar de toda a situação actual, mas de facto há muitos negócios, sobretudo coisas que até nasceram durante a pandemia, que funcionam só online”, diz. “Percebemos que havia essa necessidade da parte deles também, de terem uma montra que os agregasse, portanto a nossa ideia será ajudá-los, trabalhar numa etiqueta no site apenas para negócios online.”
A pandemia pôs-nos a pensar mais na sustentabilidade? Mais ou menos – Marta explica que o confinamento teve uma acção directa no ambiente porque as pessoas foram obrigadas a ficar em casa e muitas das indústrias ficaram paradas, “mas isso foi orgânico, não foi a consciência das pessoas a trabalhar”, diz. “Há o outro lado da moeda que é: as pessoas ficaram mais em casa, e apesar de isso permitir que repensem os hábitos, também dá mais espaço a outro tipo de consumos, como mandar vir mais comida ou encomendar as compras de supermercado, dando origem a mais resíduos”.
Além de se assumir como uma plataforma de consulta, mais pragmática, a Peggada também quer desfazer nós na cabeça, cobrir a desinformação e esclarecer preconceitos que ainda estão ligados ao estilo de vida sustentável. “Alguns mitos continuam a perpetuar-se em relação à sustentabilidade, como o facto de ser mais caro e mais complicado. Não é real”, garante Marta. “Trata-se apenas de uma questão de hábito, temos é de ter noção daquilo que conseguimos mudar e não querermos mudar tudo ao mesmo tempo.”
Começar com pequenos gestos é importante – a ideia é olhar para a rotina de cada um e perceber que passos do dia-a-dia é que podem ser mudados sem causar danos. Andar sempre com um saquinho de pano para ir às compras, optar por levar os frascos e recipientes tanto em lojas de granel como, por exemplo, em restaurantes com take-away. “Cada pessoa deve escolher a sua luta, não pode ser tudo ao mesmo tempo – eu pego naquilo que posso mudar, são conquistas, temos de encarar assim”, diz Marta.
A reciclagem é um exemplo daquilo que todos devíamos fazer em casa, mas a missão não pode ficar por aí. “Há um exercício que todos podemos fazer para termos noção da quantidade de resíduos que gastamos – vamos olhar para os ecopontos e vamos perceber que o saco do plástico é sempre o primeiro a ficar cheio”, refere. “Por isso, há que fazer o exercício inverso e tentar recusar tudo aquilo que podemos evitar, pensarmos antes de comprar se podemos reutilizar de alguma maneira, por exemplo.”
Este é o tipo de questões que Marta, Lígia e Hugo querem esclarecer através de artigos com dicas, novidades do mundo da ecologia e entrevistas especializadas – estas podem acontecer em lives de Instagram onde será permitido, sempre que o convidado autorizar, colocar questões no fim da conversa. “Acho que é importante deixar as pessoas fazerem as suas perguntas e haver um contacto mais directo”, afirma Marta. Existe ainda uma agenda de eventos sustentáveis na cidade sempre actualizada, quer sejam festivais, feiras, conversas ou workshops.
O projecto Peggada está por agora focado nos estabelecimentos em Lisboa, mas Marta acredita que “é escalável para outros locais”, até porque os pedidos de lojas e restaurantes para integrar o site começam a vir de todos os cantos do país. É dar mais uns passos, deixar mais umas pegadas e ver onde chega. “Temos a perfeita noção que a sustentabilidade também é social, não é só ambiental. Isto quer dizer que nem sempre é uma prioridade na vida das pessoas pelas mais diversas razões, mas é possível dar passos pequenos nesse sentido”, remata.