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Marlene Vieira
Mariana Valle Lima

Marlene Vieira: “Ninguém me vai dizer onde é que é o meu lugar”

Era para ter aberto em Março de 2020, mas a pandemia obrigou a um adiamento. Marlene Vieira está finalmente no restaurante de fine dining onde espera conquistar uma estrela Michelin.

Cláudia Lima Carvalho
Escrito por
Cláudia Lima Carvalho
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Marlene, a destemida. Marlene, a lutadora. Marlene, a chef. É assim que Marlene Vieira se apresenta no seu novo restaurante de alta cozinha, um sonho há muito adiado. Marlene, assim com a vírgula colada ao nome, está de portas abertas, no Terminal de Cruzeiros de Lisboa, na porta ao lado do Zunzum. Mas se o gastrobar que abriu em plena pandemia é cheio de cor, Marlene, é sóbrio. Tons escuros, meia luz, a cozinha no centro de tudo, rodeada de um balcão. De fora, pouco se vê, no interior está tudo à vista. 

A ambição é entrar oficialmente para a lista dos melhores chefs, nada menos que uma estrela Michelin. É para isso que trabalha há anos, numa caminhada que se tem revelado mais difícil também por ser mulher, desconfia. Mas ai de quem lhe ponha um travão. É o seu momento de brilhar e os dias à beira-rio têm sido agitados. 

O menu não se anuncia, pede-se entrega à chef. À mesa, chega apenas uma apresentação quase em forma de declaração. “Marlene, é a minha história. É o reflexo das minhas memórias e convicções, num misto de tradição e inovação. É a união do meu saber com o desejo de proporcionar experiências memoráveis. Neste espaço depurado, serve-se uma viagem gastronómica que é reflexo da minha aprendizagem, numa busca por uma cozinha portuguesa moderna, com preocupações de sustentabilidade e de sazonalidade”, lê-se. 

São dois os menus, o maior com 12 momentos (130€, a que acresce a harmonização com seis vinhos por 85€) e o mais curto, com sete (95€, com harmonização de quatro vinhos, por 65€). A chef não quer desvendar muito dos pratos, não só para que não se perca o efeito surpresa, mas também para que a liberdade na cozinha se mantenha. Quem ao Zunzum já foi, reconhecerá alguma coisa. Afinal, foi ali que se foram testando muitas das combinações. Consigo nesta aventura está Mário Cruz, braço direito de há muitos anos, e Gabriela Marques, a sommelier que veio do Cura, no Ritz. Três rostos de uma equipa maior e que a chef não tem dúvidas de que será vencedora. 

Marlene,
Mariana Valle Lima

Finalmente, um sonho há muito adiado. 
Por acaso, hoje de manhã um amigo pasteleiro mandou-me uma mensagem a dizer aquelas coisas, boa sorte, tal, tal. E lembrou como isto demorou para caraças. É o Luca [Arguelles]. Ele ia fazer parte deste projecto, íamos trabalhar em conjunto. Tinha-lhe dito para fazermos uma parceria para ele fazer consultadoria de sobremesas e ele dizia: tu és capaz. Mas eu queria a experiência dele. Íamos partilhar ideias, entretanto isto demorou imenso e ele foi à vidinha dele. [Na altura] eu disse-lhe “depois falamos”. E passaram dois anos. Dois anos. Nem parece, acho que ficámos suspensos. É incrível, isto era para abrir no final de Março. Abriu, mas dois anos depois. 

Não fez sentido abrir antes?
Não, optámos por abrir o Zunzum por ser maior, por ter espaço exterior, por ser muito mais descontraído. Apesar de eu ter dado uma entrevista sobre os conceitos que iriam funcionar [no futuro] e ter dito: os fine dinings. E a verdade é que os fine dinings tiveram muito mais procura. 

Porquê? 
As pessoas não se iam importar com o preço que pagavam, queriam era ter experiências e estarem completamente livres de tudo e aproveitar ao máximo. E não era só ir comer fora, porque isso já era banal. 

Passou a valorizar-se, é isso?
O fine dining representa esses momentos especiais, tem essa conotação de ser um momento que fica na memória. Normalmente, as pessoas escolhem datas especiais para vir a estes espaços. Naquela altura, eu achava que qualquer dia em que se pudesse sair seria especial. Então, os fine dinings iam estar sempre associados a isso. E não me enganei. Mas o Zunzum abriu naquela altura e foi muito bom e agora estamos a abrir este e também está a ser muito bom. 

Mas a imprevisibilidade e o adiamento levaram a que fizesse alterações aqui no Marlene,?
Não. Houve coisas que foram maturando. Na altura eu tinha muito a ideia de que teria só um menu, queria que a experiência fosse igual para todos. E a única coisa que fiz foi ter mais uma opção de menu, mas mais pela quantidade. Optámos por isso porque há pessoas que não conseguem estar dispostas a comer 14 pratos ou 16 pratos. São 12 momentos, mas, na verdade, são 16 pratos. Então achámos que poderia haver pessoas que não querem. No menu mais pequeno conseguimos também proporcionar uma experiência completa e sermos um bocadinho mais flexíveis. 

Qual é a visão que tem para este restaurante?
Quero uma estrela Michelin aqui, não vou mentir. Até porque a estrela Michelin é importante para trazer pessoas dos vários cantos do mundo a conhecer um espaço que eu acho que é diferente, que marca a diferença em Lisboa. Estamos muito afastados de toda a restauração, estamos descentralizados, apesar de estarmos em Lisboa. E é importante que haja essa comunicação internacional, através deste guia em particular, mas outros também. Isto acaba por ser uma montra da cozinha portuguesa moderna, é mais uma. E se nós não tivermos essa exposição é difícil irmos alimentando e desenvolvendo coisas novas. Isto precisa de clientes, obviamente. Tem que ser sustentável de vários pontos de vista. E quanto mais rápido, melhor para nós, porque tivemos dois anos a alimentar um projecto e a investir num projecto que nos custou muito caro e agora queríamos recuperar. Sendo que sabemos que temos um caminho para fazer e estamos dispostos a fazê-lo. Engraçado que no primeiro dia em que fizemos um soft opening para alguns clientes especiais, ou melhor habituais, porque especiais são todos, um deles, cliente de há muitos anos, organizou um jantar e trouxe dez chefs, dos melhores chefs de Lisboa. Eu não sabia, não foi organizado por mim, mas acho que foi o melhor que podia ter acontecido porque houve logo uma crítica construtiva para nós rapidamente acertarmos e afinarmos coisas. Foi o melhor que nos podia ter acontecido. São os melhores críticos. 

Porque sabem o trabalho que está ali?
Exactamente, sabem como mudar ou evoluir. Sabem o que falta, o que não falta. Às vezes os clientes podem dizer-nos que falta qualquer coisa e não sabem explicar o quê e estes sabem, não é? Foi especial por isso. Mas pronto, o Marlene, propõe-se a ter um serviço de qualidade, ingredientes do melhor, não só portugueses mas também alguns que são especiais para o mundo, e sazonais, porque essa é uma das nossas bases. E depois as técnicas são as que eu e o Mário [Cruz] já conhecemos. E estamos a desenvolver outras, que não partem só de técnicas de cozinha portuguesa, nós misturamos um bocadinho. Sabemos o que queremos proporcionar em termos de textura e de experiência degustativa e depois é encontrar a técnica certa para o prato. É essencialmente isto, mais nenhum segredo. Os meus pratos são sempre muito intensos de sabor. 

E com muitas texturas. 
Muito sabor e muita textura.

Marlene,
Mariana Valle Lima

Qual é que foi o maior desafio na construção do menu?
É uma boa pergunta. A história da mesa portuguesa foi o nosso fio condutor. Quando fazemos um jantar ou almoço comemorativo em família ou com amigos, o que é que encontramos na mesa? Fomos pegando na questão do tremoço, por exemplo, como é que o tremoço está na mesa? Normalmente está de forma natural, como ele é, só cozido. E como é que podemos dar uma experiência de fine dining com tremoço e embelezar este ingrediente tão simples? Aqui, a nossa simplicidade não é simples. Quisemos transformar aquela textura de trincar o tremoço, mas que depois se derretesse na boca. Foi esse o processo criativo. Isso aconteceu com todos os outros pratos que fazem parte do menu. Esta foi a nossa base, o que é que temos normalmente? Camarão, queijos, manteigas, azeites, pão. E depois o que é que tínhamos a seguir, o que é que o português come normalmente em épocas festivas? Bacalhau, um assado ou um arroz. Nós não temos aqui um arroz literalmente, mas temos um produto, o mais caro do nosso país, o mais valorizado, que é o pinhão nacional. Tirámos o arroz e usámos o pinhão. Depois terminamos, não com doçaria conventual ou regional, mas com produto da época. Eu gosto muito de fruta nas sobremesas, é um gosto particular desde sempre, então fiz duas sobremesas com fruta. Até começámos a fazer uma com papo de anjo e não resultou a textura, não gostámos, mas não quer dizer que isto não evolua para outras coisas porque esse também é o objectivo do Marlene,. É que começamos com esta base e depois podemos decidir tirar isto e juntar outra coisa. 

Vai haver rotatividade?
Vai. Mesmo com o ingrediente base vamos experimentar outras combinações. 

E porque é que decidiram que o menu não seria revelado?
Porque não nos queremos comprometer com [a ideia de que] vão encontrar aqui um bacalhau com pinhão porque pode não acontecer. E se não temos pinhão nesse dia?

Depois têm de gerir as expectativas...
Exactamente. Nós temos também de ter uma certa liberdade criativa e queremos que o nosso cliente venha à procura dessa criatividade e que confie em nós. É esta confiança que eu acho que criei ao longo de mais de 20 anos de carreira. Quem me segue pode confiar porque eu não vou servir má comida, garantidamente. Já aconteceu clientes ligarem e perguntarem qual é o menu e nós dizemos que não vamos revelar, dizemos se são 7 ou 12 momentos, damos o preço e é uma experiência que vai descobrir no momento. Só temos de saber se tem restrições. Esta é a nossa abordagem, se o cliente está disposto, muito bem. Se não está, não vai ser o nosso cliente. 

E a maioria dos clientes está disposta, não?
A maior parte, sim. Não têm de pensar, vêm totalmente livres de alguma responsabilidade na escolha. É só dizer-nos se quer o [menu] de sete ou 12, se quer pairing de bebidas e deixar-se levar e gostar. 

Voltando à estrela. Não é a primeira vez que trabalha para isso. No Avenue era esse o caminho que estava a ser feito. 
Foi interrompido, não é?

O que é que aprendeu nesse caminho?
Aprendi muita coisa. Isto já deu tantas voltas, eu já aprendi tanta coisa. Foi uma frustração. Ficámos muito frustrados porque estávamos a fazer um caminho já com muita consistência, e claro, levámos ali um travão muito grande, mas acho que agora tenho muito mais maturidade. Quando há algum problema com um prato sei rapidamente corrigir, ou é mais fácil para mim corrigir. Arrisco mais se calhar em determinadas coisas. No Avenue, eu estava muito presa a respeitar alguns sabores, isto é, se um cabrito assado fosse acompanhado com batatas e não sei quê, eu respeitava muito aquilo, não fugia. E este caminho fez com que [percebesse que] a base pode estar ali, mas eu posso ir à procura de outros sabores e misturar e ser surpreendida por essa conjugação. Acho que foi essencialmente isto. Conheci muita coisa entretanto, também sou consumidora de muitos restaurantes e percebi que nós podemos desmontar tudo. 

Está melhor hoje?
Sim, com certeza. 

E nestes dois anos, o Zunzum foi servindo também de laboratório para o Marlene,. Como é que vai ser a partir de agora? Esse laboratório vai existir só aqui ou vai continuar a testar algumas coisas no Zunzum?
O Zunzum tem uma coisa que é a sugestão do dia, a sugestão do chef, e todos os dias é nesse prato que vamos descobrindo e pondo em prática certas misturas e combinações. Isso vai continuar a haver. A carta vai ser um bocadinho mais consensual, vá, e um bocadinho mais para o português. Nós estávamos constantemente a mudar a carta no Zunzum. De dois em dois meses, mudávamos. Agora já não, mudamos só duas vezes no ano: Primavera/Verão e Outono/Inverno, para ter um bocadinho mais de consistência. Isto porquê? No ano passado tive um pica-pau de percebes que tirei rapidamente e os clientes quase que me matavam. “Porque é que tiraste o pica-pau?” Porque não há percebes. Este tipo de pratos no Zunzum às vezes também causa alguma frustração porque temos muitos clientes habituais e que se habituam àquilo. Lembro-me do corn dog. As pessoas matam-me porque não tenho o corn dog, vou ter de o pôr. É uma coisa que aprendi a fazer nos Estados Unidos quando vivi lá, só que lá fazem com salsicha de carne e eu aqui sempre fiz de peixe. Eu gosto muito mais de trabalhar peixe e o Zunzum prepara-se para viver muito mais de peixe do que de carne. Vamos ter dois ou três pratos de carne só, o resto vai ser tudo à volta do peixe e do marisco e legumes.

A vantagem de testar pratos no Zunzum é haver mais massa crítica?
Pois, nós sabemos logo se agrada à grande maioria. Aliás, nós temos aqui uma tarte de percebes que evoluiu desse pica-pau. A verdade é que ele foi concentrado numa pequena tartelete, mas começou ali. Temos um outro que é o ceviche de vegetais. Na verdade, grande parte deles foi testada ali com clientes. Percebemos logo o que ia resultar. É interessante, tivemos essa oportunidade e por isso também o Marlene, já abre com uma maturidade. Se tivesse aberto há dois anos ia ser mais lento. Agora já entramos com essa experiência. Tivemos dois anos a treinar pratos. Que restaurante tem essa oportunidade? Acabou por ser um privilégio que muitos espaços não têm. 

Marlene,
Mariana Valle Lima

E depois ainda há o espaço no Time Out Market.
E continua. Já vai fazer oito anos. 

Onde é conhecida por arrasar, não é?
É verdade, o Marlene Vieira lá no mercado é um sucesso. Mas também foi um sucesso porque os meus tropeções são coisas boas na minha vida. A interrupção que houve no Avenue obrigou-me a estar focada só no Mercado da Ribeira e eu transformei aquilo num sucesso porque sou muito obcecada com determinadas coisas e enquanto aquilo não estava consistente como eu achava que tinha de estar… Tinha timings para servir a comida, nós desafiávamo-nos a nós próprios. Tínhamos todos os dias um desafio para cumprir. Hoje temos 15 minutos para entregar os pratos, amanhã temos de vender x pratos, eu fiz isto com a equipa e estava lá com eles, de manhã à noite. E foi muito bom porque a equipa absorveu isso de mim e alguns elementos que ainda lá estão desde o início são piores que eu, tornaram-se mais obcecados que eu e criam desafios ainda hoje. É muito giro de ver. Tenho mesmo muito orgulho naquele espaço. Mas se não tivesse tido este tropeção do Avenue, isto se calhar não tinha acontecido. Assim como se calhar a maturidade com que abro este espaço, o Marlene,, não teria acontecido se não tivesse havido uma pandemia. Eu também sei aproveitar um bocadinho esses tropeções, eu acho. 

Não se deixa ficar parada?
Claro, vou fazer o quê? Vou chorar? Só tenho duas hipóteses, ou fujo ou enfrento o bicho, como se costuma dizer. Normalmente, não fujo. 

E como lida a chef com a empresária, que a Marlene também é?
Com muitos erros também, mas vamos fazendo. Um problema de cada vez, é o que eu costumo dizer. Não vamos conseguir resolver tudo, não vai ser perfeito, vamos gerindo prioridades. Qual é a prioridade? Claro que temos algumas perdas no meio disto tudo, temos alguns dissabores, é impossível, isto não é tudo perfeito. Mas se concluirmos 80% do objectivo, está óptimo. Esse é o meu plano. Há coisas que acontecem e que são imprevisíveis e que nós não controlamos, então vamo-nos adaptando, mas por norma consigo pôr pessoas ao meu lado e dar alguma autonomia para que resolvam os problemas. Coisa que não fazia muito no início, aprendi a delegar. Tens isto, isto e isto que é preciso resolver portanto desenrasca-te. 

Até para não ficar sobrecarregada…
Não consigo, no início eu é que causava isso, porque normalmente ajudava a resolver. E hoje já não faço isso. Hoje escolho os meus problemas e distribuo problemas por pessoas. Isso também foi evoluindo muito na minha forma de gerir, porque só estava habituada a gerir equipas de cozinha e de certa forma tinha pequeninos problemas. Hoje tenho problemas gigantes e então distribuo problemas por pessoas. Vou distribuindo cartas. 

E depois ainda há o marido chef em casa [João Sá, do Sála]. 
Ainda há mais essa questão [risos]. 

Os vossos processos criativos cruzam-se de alguma forma?
Mais ou menos. Eu, por exemplo, não falo muito de trabalho em casa. Não quero, não gosto, quero dar espaço livre à minha cabeça. Divido a meio, metade para a família, metade para o trabalho. O João absorve-se muito ainda com o trabalho. Como temos uma menina, no início percebíamos que ela ficava muito ansiosa quando falávamos de problemas e o meu instinto protector agora, já, pumba! A partir dali, problemas do trabalho são para ser resolvidos no trabalho, vamos tentando gerir assim. Nuns dias fica ele com ela, outras vezes não dá e eu tenho de a trazer para aqui. O Sála é muito pequenino, então trago-a aqui para o Zunzum, anda aqui de bicicleta ou de trotinete ou joga à bola, tem mais espaço. E muitas vezes a Isabel vem para aqui para junto da mãe porque é filha de dois chefs e tem de ser. Também vai para as avós, ou as avós vêm tomar conta dela, é normal. Acho que é assim com todas as famílias. Vai-se fazendo. O João pensa muito os pratos com a equipa dele, eu penso os pratos com a minha equipa. Nós nisso... Se bem que no futuro, a nossa visão é que vamos trabalhar juntos, os dois. 

Ai, é? Mas pontualmente ou juntos num espaço?
Juntarmo-nos num sítio. É uma coisa que queremos mesmo. Se vamos conseguir? Não sei, mas já estamos a começar a plantar. 

Portanto, agora que Marlene, abriu, já há aí um novo objectivo. 
Sempre, há sempre um novo já à vista. A longo prazo. Eu sou mesmo assim, sou uma louca. 

É por isso que o restaurante é Marlene, com vírgula?
Exactamente. É sempre uma continuidade do trabalho. Eu gosto muito de estabelecer projectos e fazer coisas novas e estar em constante movimento. Esse é um projecto a longo prazo, mas eu sei que tenho de pôr a semente entretanto. Já não vou para nova, se calhar nasce daqui a dez anos, não sei. Se calhar aparece uma oportunidade e vamos ficando e construindo devagarinho, é possível. Não sei. A semente já está, agora vamos ver o que acontece a seguir. Não vamos forçar nada. Se tiver que acontecer, acontece, mas é uma coisa que nós queremos, no futuro, juntarmo-nos. 

E voltando aqui ao Marlene,. Foi buscar a Gabriela Marques para sommelier. Acho que não há nenhum restaurante do género em Lisboa com duas mulheres ao comando.
Acho que não. 

Isso foi pensado?
Foi, claro que foi. Esse era o nosso sonho, se íamos conseguir, não sabíamos, mas conseguimos. Pelo menos por enquanto. Estamos a conseguir e acho que isso pode ser um exemplo. Se bem que há já restaurantes pequeninos aqui pela cidade que têm só mulheres. Eu também não sou assim, eu gosto de estar misturada, mas é muito importante que haja oportunidade para as mulheres e eu também já levo um bocadinho essa bandeira às costas. 

Marlene Vieira e Gabriela Marques
Mariana Valle Lima

E durante anos foi a cara, a mulher chef. 
Sim. A verdade é que eu acho que as mulheres são muito completas e acho que é uma mais valia para nós termos alguém como a Gabriela, não só por ser mulher, mas por ser a profissional que é. Acho importante termos a sensibilidade do lado feminino neste espaço, tão minimalista, limpo. Aqui não há muito ruído de extravagância, nada a tapar a visão das coisas mais importantes. Eu quis criar este palco, não só para as mulheres, mas muito para as mulheres. Isto vai acontecer ao longo deste percurso, vamos ter aqui mulheres convidadas do mundo todo. Esse é o grande projecto do Marlene, – ser um palco não só meu, não só da Gabriela, não só do Mário, é de outras mulheres no mundo. Vamos focar-nos muito nas mulheres, porque não há a oportunidade que eu gostava que houvesse. 

Mas nota uma evolução?
Ui, meu Deus. Muita, muita evolução, mas foi um bocadinho forçado. 

E uma luta muito sua também, não acha?
Muito minha. A verdade é que todas as coisas que fui fazendo foi porque eu também forcei muito a minha entrada, eu andei ali a esburacar. Sendo que no Time Out Market isso não aconteceu, foi pelo nosso trabalho que nos foi dada aquela oportunidade. Mas, eu também só tive uma montra no Avenue porque fiz com que um cliente comprasse o restaurante. Eu é que procurei essa visibilidade, ninguém me deu essa visibilidade. Forcei-a. E é sempre este caminho mais difícil que as mulheres têm de fazer para poder ter algum palco, algum espaço para poder mostrar o seu trabalho. 

E isso consome energia. 
Muita, muita. O que tenho pena é que os prémios em Portugal ainda sejam manipulados muito por homens. Este prémio internacional que foi entregue há pouco tempo… [“Chef de l'Avenir" da Academia Internacional de Gastronomia entregue a Vasco Coelho Santos]. Eu acho que a pessoa que ganhou, ganhou bem, mas as pessoas que lá estão, estão lá há 20 anos. Nem um presidente da República está 20 anos no poder, ninguém está 20 anos no poder. Isso é completamente démodé, completamente fora... Há um ciclo vicioso. Não há em 20 anos uma mulher nomeada para chef. Será que em 20 anos não houve uma mulher merecedora deste prémio? Somos assim tão más enquanto cozinheiras? Não, é porque o lobby está feito e os homens têm muito o instinto protector.

A mulher ainda assusta?
Assusta e eu não consigo entender porquê. Qual é o medo? É isso que me deixa irritada um bocado. É as pessoas estarem no poder e gostarem demasiado do poder. 

É por isso que não temos assim tantas mulheres na alta cozinha?
Também é, não há visibilidade. Este prémio, apesar de ser de uma academia internacional é dado por portugueses. Fui ver a história daquela academia e nunca houve uma mulher. O júri é todo composto por homens, pessoas que estão lá desde sempre, um senhor que já devia estar na reforma. O José Bento dos Santos tem que dar o lugar a outra pessoa. Pá, chega. O senhor está cansado, vá descansar, vá viajar, vá usufruir. Ele que gosta tanto de comer e de degustar, que vá e dê o lugar a outra pessoa. Chega. Dê o lugar a uma pessoa mais jovem, com outra visão, com outras formas de estar na vida, sem política à mistura. Há muita política no meio destes prémios, há muitos interesses a seguir, há muitos objectivos que só eles sabem quais são e que não são o de evidenciar mulheres. Não há esse lugar para as mulheres porque o lugar das mulheres não é estar nesses cargos, porque eles assim o entendem. E depois não se abrem outras portas. Há convites internacionais, há eventos internacionais que vêm através deste prémio. 

Criam-se holofotes. 
Holofotes só para aqueles lobbies. É como a entrega de lojas a nível camarário, são entregues a certas famílias, a certos estatutos sociais, a certas coisas. E aqui neste prémio da Academia Internacional é a sensação que dá. Há muita política à mistura, há muito lobby. Não quer dizer que essas pessoas não tenham potencial, porque têm, mas nós ficamos sempre com a pulga atrás da orelha porque são sempre as mesmas pessoas. Os critérios deles são sempre os mesmos e por isso são sempre as mesmas pessoas, não há diversidade de critérios nem se explica o porquê daquele prémio. Era muito importante que se viesse explicar porque é que aquele prémio foi atribuído, como é que foi, houve votação do público? Não houve. Aqui são três pessoas [que decidem]. Isso não é votação. O que me assusta não é a pessoa que ganha, são as portas que se abrem. Para as mulheres nunca há essa porta que se abre, nós é que temos de dar um pontapé na porta, constantemente. E chega a um ponto em que ficamos sem força. Estamos sempre a dar pontapés, é cansativo. 

Se é difícil para uma chef Marlene Vieira, mais difícil será para quem está a vir?
Claro. E há mulheres que não querem dar pontapés na porta, não querem ter de forçar nada porque sentem que não têm de forçar porque as coisas têm de ser naturais. 

Mas está a mudar?
Mudou muito, há vinte e tal anos eu queria ir para a frente e as mulheres diziam: não vais, o teu trabalho não é ali ao lado deles, é atrás. As mulheres faziam isto às mulheres porque queriam pôr-nos num lugar. Mas eu dizia que o meu lugar é onde eu quiser estar. Ninguém me vai dizer onde é que é o meu lugar. As mulheres diziam: pensas que és mais que nós? Eu não quero ser mais nem menos, só quero ser eu. Eu não quero que ninguém me agarre os braços, porque eu corto-vos os braços. Saiam-me da frente porque eu vou e vou mesmo. E isto começou assim há 20 anos. Hoje não, hoje estamos ao lado umas das outras, hoje somos muito mais companheiras.

Mas foi preciso passar por isso. 
Foi de uma luta muito mais com mulheres do que com homens, porque os homens viravam as costas e diziam: eu não tive uma mulher chef, não vais ser tu a primeira. E eu: está bem, vai-te embora. Agora quando eram as mulheres a dizer, eu pensava: coitada daquela mulher, está presa numa coisa que só existe na cabeça dela. Quer dizer, não era só na cabeça dela, era na sociedade em geral. Mas eu percebo que sendo homem ou mulher, esta é a minha personalidade. Os meus pais educaram-me para eu fazer aquilo que tivesse vontade. Somos seres humanos e podemos fazer o que nós quisermos. Se eu fosse homem, eu também seria assim. Teria outras lutas, mas iria ter esta vontade de fazer, descobrir, experimentar e fazer coisas novas. O facto de ser mulher nunca me prendeu porque a minha educação também foi muito nesse sentido. Começa tudo na educação. 

E algumas dessas pessoas que lhe bateram com a porta, hoje já deram o braço a torcer?
Não, porque eu afastei-me. Houve uma pessoa, se calhar, um chef com quem trabalhei e que me fez a vida negra. Ele também teve azar porque apanhou um furacão pelo meio. Eu nunca me fiquei, fiz-lhe a vida negra um bocado e hoje em dia já conversamos. Ele até me disse uma frase que eu já nem me lembrava que tinha dito. "Sabes o meu nome, não é? Daqui a uns anos tu vais ouvir falar muito na Marlene.” Eu nem me lembrava que tinha dito isto, devo ter dito num dia de raiva, saiu e passou-me logo. Eu também expludo e depois no dia seguinte já estou a avançar. 

Não fica presa?
Não. Houve pessoas que não perdoei, não fui capaz de perdoar. Sei lá, um formador na escola que me fez a vida muito negra. Pediu-me perdão, até queria vir trabalhar comigo e eu não fui capaz porque isso ia levar-me para memórias que podiam afectar a minha caminhada e eu não quis ficar agarrada àquilo. 

Até porque o trabalho numa cozinha já é muito intenso.
É. De certa forma eu dei essas chapadas, de uma maneira ou de outra. E as pessoas, umas pelas redes, outras por telefonemas ou mensagens, foram pedindo desculpa aqui e ali. Eu acabo por desculpar, mas nunca se esquece. Não quero é ter muito contacto com essas pessoas, passo à frente. 

Marlene,
Mariana Valle Lima

Voltando aqui ao restaurante, a chef fala sempre da importância que dá a pequenos produtores e negócios, optando por chegar a vários lados. Não só na comida, como na loiça, por exemplo. Porque é que isso tem tanta importância para si?
Para eles serem sustentáveis, para poderem continuar a caminhar e continuar a fazer coisas boas para nós. Temos que alimentar estas pessoas, temos que comprar as coisas deles para continuarem a existir. As minhas amizades são todas feitas à volta do meu trabalho. Eu gosto de criar laços com pessoas que eu admiro. As pessoas trabalharem para nós e não darmos valor a isso... Agora aparece um novo e eu vou largar aquele. Não, eu tenho de arranjar maneira de ter um bocadinho dos dois. Não consigo descartar. Há uma construção em conjunto. É muito importante sentir isso, ajuda-me a sentir-me bem no meu dia a dia, sentir que estou a fazer alguma coisa por todos, não é só por mim. 

E essa construção foi feita aqui?
Está em tudo. No chão, nas mesas, nos talheres, nos copos. Tem é que ser de qualidade, isso não há volta a dar. Há uns tempos houve alguém que me disse que o Studioneves só aceita se fizer o conjunto todo. Olha, o que havia de faltar. Ele é que faz as regras? Quando os chamei, disse que queria trabalhar com vários ceramistas e escolhemos o que fazia sentido ter do Studioneves. Temos coisas deles, temos coisas da Bipolar, temos coisas da Malga, temos coisas de outros ceramistas que não são conhecidos, até a Vista Alegre ou a Bordalo Pinheiro, que já são grandes mas que também fazem parte da nossa história. Há lugar para os bons, ponto. Sejam muitos ou poucos. 

No Marlene, o ambiente, do que pudemos experienciar, é bastante tranquilo e descontraído. 
Sempre. Nós temos um cozinheiro ali no Zunzum, que entrou há meia dúzia de dias, e que me disse uma coisa muito engraçada: “Ai, chef, se sentisse o alívio que tenho de estar numa cozinha zen.” E eu: “Mas as outras cozinhas onde trabalhaste não eram assim?” Ele disse que não, é uma pressão, um stress. Na cozinha da Marlene isso não acontece. 

Nem sequer há barulho. 
Detesto. Não há berros na minha cozinha, não gosto, não quero. E achei piada ele dizer isso porque eu não tenho mesmo noção como é noutras cozinhas. Não sei, não estou lá e as pessoas que trabalham comigo, alguns deles, já estão comigo há muito tempo. Claro que discutimos ideias, há abertura, mas berrarmos uns com os outros? Nunca na vida. Eu já pus cozinheiros para fora da cozinha por estarem maldispostos. Vêm de casa chateados e eu digo para irem para casa descansar, apanhar ar. 

Sanidade mental acima de tudo?
Sim. Trabalhar com pessoas maldispostas não é para mim. 

Isso quer dizer que está sempre bem-disposta?
Eu posso vir maldisposta, mas fico bem. A cozinha para mim é uma terapia, o trabalho é o sítio onde esqueço os meus problemas, de casa, de família. Eu chego ao trabalho e passa tudo. 

A Marlene diz sempre que gosta muito de ir a restaurantes. O que é que gosta mais num restaurante?
Gosto muito de ser surpreendida. Gosto de experimentar coisas novas. Sair para comer peixe grelhado para mim não funciona. Eu faço peixe grelhado em casa. Gosto de comer comida de conforto em casa. A cabidela, para mim, come-se em casa. O cozido também, uma feijoada também. Portanto, eu visito mais restaurantes de autor, com uma identidade própria, do que visito restaurantes de comida tradicional portuguesa. Para já, sou muito exigente. Gosto de bons ingredientes. Muitas vezes até podia ir a um sítio, [onde] gosto muito do chef e tal, que faz comida tradicional, mas tenho medo de me desiludir. Prefiro não arriscar, prefiro deixar-me com uma imagem bonita. Vou normalmente a cozinhas de autor, onde sei que vou encontrar identidade e vou aprender também. 

E o que é que a desilude?
Mau produto deixa-me muito nervosa e irritada, porque Portugal tem dos melhores produtos que há no mundo. E se ainda por cima os chefs são conhecidos e vangloriam-se com o produto e eu chego lá e... Eu ir a um restaurante à beira-mar, ou junto a pescadores ou junto ao mercado, e comer peixe congelado? Isso é um problema para mim e eu não vou ser capaz de mentir, vou ter de dizer a verdade. Se não tens robalo hoje, vende carapaus, vende cavalas, o que tiveres. Não vou aceitar isso. 

E como é que se convence alguém que esteja de pé atrás a gastar dinheiro num fine dining?
Não se convence, é muito difícil. Há pessoas que não valorizam mesmo o facto de dar 150 euros por uma refeição, que dão por um perfume, ou por umas calças, um cinto ou uma carteira. Isso não se convence. Por isso é que eu tenho muita preocupação com a parte da comunicação, para onde é que se comunica, em que meios é que se comunica, por causa da expectativa das pessoas. Eu sei que há pessoas que gostam de me seguir nas redes que se viessem aqui ao Marlene, iam sair daqui com uma neura que nem quero pensar, porque acham que faço comida tradicional portuguesa. Eu faço, mas também faço outras coisas. Se forem ao Time Out Market vão encontrar bacalhau à lagareiro e polvo à lagareiro, não é o super-tradicional, mas os sabores estão lá. Esse tipo de pessoas não se convence. O Marlene, vai ser um restaurante para as pessoas que gostam destes conceitos, que vêm cá naturalmente, e por isso também só tem 30 lugares, é para um nicho muito pequeno. Claro que queremos que o máximo de pessoas possível venha experimentar este espaço, mas nós sabemos que comprar carteiras da Louis Vuitton não é toda a gente que aprecia. A mim não me diz absolutamente nada. Se calhar um dia se me oferecessem ia aprender a valorizar. E eu acho que essas pessoas convencem-se oferecendo alguma coisa, como um voucher para ir a um restaurante. Há pessoas a quem esse bichinho entra e depois já não conseguem ir a qualquer restaurante, já gostam de ir a restaurantes gastronómicos, que é isso que o Marlene, é. O Marlene, é um restaurante gastronómico. Mas há outras a quem esse bicho nunca vai entrar, é o que é. Vão continuar a não gostar, vão preferir o prato cheio porque valorizam outras coisas. 

Qual é o melhor lugar do restaurante: ao balcão ou na mesa?
Não sei, o balcão para nós cozinheiros é um desafio muito grande.

Marlene,
Mariana Valle Lima

Estão muito expostos. 
É verdade, sou louca. No Mercado da Ribeira disse ao arquitecto que tapasse a cara para termos alguma privacidade, mas ainda assim que desse para o cliente ver o nosso trabalho. E aqui... Eu gosto de sair da minha zona de conforto e isto é sair da minha zona de conforto porque nós gostamos de dizer asneiras, palavrões, de tratar mal os clientes, estou a brincar. Mas às vezes falamos mal dos clientes, não vou estar a mentir. Assim: pá, aquela pessoa é mesmo difícil. Aqui vamos ter de dar o corpo às balas e se calhar aprender a respeitar muito mais ainda o cliente. É sem filtros total. Acho que para o cliente que gosta de ver e quer aprender, o balcão é melhor. [Para] um casal que vem numa data especial as mesas são o mais indicado. E para um grupo há uma mesa. É a mesa do chef, onde pode acontecer tudo. O lugar ideal vai depender do cliente. Tem muito a ver com a ocasião. 

E um cliente que queira voltar várias vezes?
É no balcão que tem de ficar. 

E o que acontece ao menu desse cliente?
Entra aí o nosso trabalho, vamos ter de mudar três/quatro pratos. Há pratos que eles querem sempre, mas também gostam um bocadinho de novidade. Não vamos mudar o menu todo porque há coisas que se ele vem é para comer, mas haverá sempre uma surpresa.

Avenida Infante D. Henrique, Doca do Jardim do Tabaco, Terminal de Cruzeiros (Santa Apolónia). 912 626 761. Qua-Sáb 19.30-23.30

“O vinho vai complementar o que já vai ser incrível”

Mariana Valle Lima

Em restaurantes onde o menu de degustação já tem um preço elevado, nem sempre a harmonização de vinhos é olhada com a devida atenção, mas Gabriela Marques, sommelier com vasta experiência e alguns prémios conquistados, quer desconstruir essa ideia. A experiência ficará completa se as duas coisas acontecerem. “Já sabemos que a comida é espectacular e que o cliente vai ter uma experiência incrível com o que vai comer, portanto a forma como nós abordamos a pessoa será sempre no sentido de complementar essa experiência”, diz-nos, explicando que “é isso que a maior parte das vezes o vinho faz”. “A função do vinho nas harmonizações consiste em ampliar os sabores e complementar o prato. Ao fazer um wine pairing o cliente está a potenciar toda a sua experiência”, aponta. 

Já por isso, o trabalho da sommelier é sempre feito em conjunto com a cozinha. “Acabamos sempre por dar o nosso insight acerca da intensidade de alguns pratos, da forma como estão as texturas, o que é que podemos melhorar para o vinho casar melhor, há aqui uma sinergia muito grande”, continua Gabriela, que se mudou do Cura, no Ritz, para o Zunzum. 

O facto de ter a chef aos comandos também pesou na decisão. Até porque nunca tinha trabalhado com uma chef. “Duas mulheres ao comando entendem-se sempre bem, mais não seja por conseguirmos perceber o trabalho e a dedicação de cada uma.” E não tem dúvidas de que, tal como nos vinhos, há diferenças entre aqueles que são feitos por mulheres e aqueles que são feitos por homens. “Também penso que na cozinha funciona um bocado assim no que toca à delicadeza e ao sentido dos pratos. Acaba por ser uma experiência enriquecedora para mim também trabalhar com uma senhora.”

E se o Marlene, se apresenta de forma mais descontraída que o Cura, por exemplo, Gabriela garante que a sua linha clássica se mantém, apesar de admitir ter maior espaço hoje para experimentar coisas diferentes. “Isso também é importante para o crescimento de qualquer sommelier.” Quanto ao maior desafio, Gabriela não tem dúvidas: “as texturas”. “Conseguir realmente que os vinhos sejam os mais adequados mantendo o perfil do prato”, concretiza.  

A carta de vinhos, por agora, mantém-se pequena, mas toda ela portuguesa. São cerca de 60 referências, que no futuro podem vir a crescer, incluindo até vinhos de fora. Mas tudo a seu tempo, até porque a sommelier não duvida da qualidade nacional. “Temos vinhos portugueses muito bons. Não ficam atrás de nenhuns outros. É uma questão de se escolher o que é mais adequado e o que potencia, tal como outros potenciariam, os pratos”, defende. Até porque um bom vinho, acredita, é aquele que a pessoa gostar. “Não gosto muito de dizer que o que faz um bom vinho é A, B ou C, porque é aquele que a pessoa gostar – e isso é muito pessoal e é muito intransmissível. Para mim, um bom vinho é aquele que me dá prazer beber.”

Rota das estrelas em Lisboa

  • Restaurantes

Ainda não foi este ano que o Fifty Seconds de Martín Berasategui recebeu a segunda estrela Michelin, mas no topo da Torre Vasco da Gama sabe-se que é uma questão de tempo. E isso não se deve apenas ao trabalho do chef espanhol, o mais estrelado na Península Ibérica (já são 12), mas também a Filipe Carvalho, o chef executivo do restaurante que não tem medo do aparente lugar à sombra, por saber perfeitamente que quando um brilha, todos brilham. Com Filipe Carvalho, não há falsas modéstias, nem meias medidas. 

  • Restaurantes
  • Haute cuisine

Não foi a noite que se esperava, mas foi ainda assim melhor do que a edição anterior quando apenas dois restaurantes saíram premiados (o 100 Maneiras, de Ljubomir Stanisic, e o Eneko, do basco Eneko Atxa, ambos em Lisboa). Na gala de 2021 do Guia Michelin para Portugal e Espanha, que aconteceu em Valência, foram cinco os restaurantes portugueses a conquistarem uma estrela. O maior destaque vai para o restaurante da Herdade do Esporão, em Reguengos de Monsaraz, liderado pelo chef Carlos Teixeira, que não só conquistou a primeira estrela como venceu uma estrela verde, pelo compromisso com a sustentabilidade. Em Lisboa, só o Cura, no hotel Ritz, do chef Pedro Pena Bastos foi distinguido nesta edição. A boa notícia é que nenhum dos anteriores perdeu a estrela. 

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