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Chef, Empresário, Restaurateur, Olivier da Costa
©Mariana Valle LimaOlivier da Costa

Olivier da Costa: “Se és bom num negócio, ele dá dinheiro. E nisso eu sou o melhor”

Entre a vaidade de se sentir o melhor no que faz e a mágoa de não ser reconhecido por isso, Olivier da Costa anuncia novos restaurantes no meio da maior crise de que o sector tem memória. No fim, deixou-nos a pensar em molejas.

Escrito por
João Pedro Oliveira
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A conversa antecede o plano de desconfinamento por umas horas. Olivier da Costa não sabe ainda quando pode abrir os seus restaurantes, mas diz-se pronto para pôr a carne toda no assador. No momento em que a restauração atravessa a sua maior crise, sucedem-se as notícias de novos investimentos seus, em Portugal e no mundo. Promete voltar a Cascais, à Comporta, ao Algarve, e fala de projectos a andar em Londres, Paris, Nice ou Banguecoque. Em Lisboa, comprou o velho XL e vai abrir o novo Yakuza. Há 25 anos que abre restaurantes e gaba-se de não ter fechado nenhum a perder dinheiro. Acredita que a verdadeira medida do sucesso está inscrita numa folha de balanço e garante que, por essas contas, não pede meças a ninguém. Mas diz-se vítima de duas coisas: de um lobby que gosta de mandar o Olivier abaixo; e do Olivier que fala primeiro e só pensa depois.

Cozinheiro, empresário, empreendedor, restaurateur... como é que se costuma apresentar?
“Olá, sou o Olivier.”

Eficaz.
(Riso) Eu sou isso tudo, na verdade. Tenho restaurantes, adoro restaurantes: apresento- -me assim.

Estamos a atravessar a pior crise de que há memória no sector e sucedem-se as notícias de novos restaurantes seus. Explique lá isso.
Isso é a minha forma de reagir, de me defender. Sempre disse, desde o primeiro minuto, que “resiliência’’ era a palavra-chave.

...e a palavra da moda, também.
É preciso resiliência, a verdade é essa. Para tentar superar... isto ainda não acabou. Não vou dizer que estava à espera que isto acontecesse, mas já passei por fases complicadas. Não sei se sabes, mas estou neste negócio há 25 anos, não sou propriamente novato...

Sei que abriu o primeiro restaurante com 21 anos.
Sim, em 1996, a Esplanada do Castelo. Já passei por muita coisa. Ainda ontem estava a comentar aqui com o Joel [Pires, director comercial e de marketing do Grupo Olivier, que acompanha a entrevista sentado ao lado] que vi o meu pai [chef Michel da Costa] falir noutra crise, aí em 2001. Teve de fechar a Gare Marítima, teve de fechar o restaurante no Castelo de São Jorge. Lembro-me de como isso pode ser complicado. A verdade é que os meus 25 anos também não foram só rosas. Mas pronto, eu gosto de navegar em águas de tempestade.

Quantos projectos novos tem em andamento?
(Riso) Não sei se te posso dizer todos... Mas posso dizer que se não tivesse acontecido o Covid, neste momento eu teria 22 restaurantes pelo mundo fora. Meus, a 100%, toda a gente sabe: o Yakuza, o KOB, o Guilty e agora o novo XL, esses são meus. Depois tenho parcerias estratégicas com grupos hoteleiros, como a Minor (Hotels), a United (United Investments), a Maison Albar, para fazer projectos cá e lá fora. Temos vários negócios fechados à espera que haja melhores dias. Temos Paris pronto para abrir, Algarve pronto para abrir, Cascais para abrir, Savage para abrir, Londres pronto para abrir... no dia em que puder trabalhar vou pôr a carne toda no assador. E temos várias propostas em andamento, Nice, Roma, Banguecoque... chega, não?

Já me perdi.
Também eu. O mais grave é isso. Ainda hoje estava a dizer ao Joel que estamos a perder o fio à meada disto.

Estes investimentos são uma fuga para a frente ou há mesmo uma oportunidade nesta tempestade?
Lembro-me de um grande amigo dizer “a gente investe quando há sangue na rua”. Foi o que eu fiz. Eu estava preparado para investir e nem fiz grandes investimentos, na verdade. Fiz um, que estava previsto antes do Covid, que foi o novo Yakuza. E apareceu uma oportunidade que foi o XL. Podíamos estar em crise ou não, que eu iria investir na mesma. Só que as oportunidades para fazer negócio agora são maiores. Mas o risco também, que ninguém sabe quando é que isto reabre.

Criticou o movimento Sobreviver a Pão e Água por estar à procura de protagonismo. Acha mesmo que aquilo foi só – como lhe chamou – “uma birrinha”?
Isso foi a resposta a uma pergunta num podcast, um bocadinho sem pensar. Eu posso confirmar que não me revi nesse protesto. O Ljubomir é meu amigo, ligou-me antes e eu disse-lhe que não me revia naquilo. Acho uma perda de tempo. Quando disse que era birrinha... foi uma coisa que me saiu um bocado sem pensar.

Acontece-lhe muito?
Sou assim, queres o quê?! Lixo-me por isso, também. Às vezes... Mas não era nada disso que eu queria dizer. Acho que quem lá estava fez o que fez por acreditar, com vontade de fazer. Mas eu acredito mais em arregaçar as mangas e trabalhar, do que fazer greves, manifestações e sei lá... Já disse várias vezes: nunca pensei que o Estado nos ajudasse nem com um centavo. Nunca! E essas ajudas vieram.

Mesmo estando preparado, também recorreu às ajudas?
Claro, como todos. Tenho muita gente a depender de mim. O problema é quem antes não declarou, quem já não estava bem, não tinha as contas em dia... claro que teve problemas! Nós pedimos ajudas de tudo o que estava ao nosso alcance e tivemos uma taxa de sucesso grande, porque tínhamos tudo certo e direito.

Há muita gente a perder tudo por força das medidas de saúde pública. Não é normal que se mobilizem para reclamar ajuda?
Vai haver muita destruição. Há muita gente a perder muito e a passar muito mal. Eu fui o primeiro a ajudar. Entregámos milhares de refeições, fui o primeiro a avançar nisso. Isto é uma guerra e a gente tem de safar e ajudar os outros como podemos. É isso que estou a tentar fazer desde o primeiro dia.

Mas não acha que fazia sentido uma resposta colectiva do sector?
Mais uma vez, se calhar não disse a coisa da forma mais certa... não tenho muito jeito para entrevistas...

Eu também não, deixe lá.
Pronto, estamos bem então. É assim: eu não estava à espera de apoio nenhum. No primeiro confinamento, achei que isto ia ser por 15 dias, nem sabia o que era o lay-off, vê lá. Quando percebi, já tinha pago os salários ao pessoal todo. Custou-me 200 mil euros a brincadeira. Depois trocámos por férias, mas foi uma pancada grande, é muito dinheiro... entretanto perdi-me...

(Joel Pires: Existem organismos próprios...)

Isso. Vamos lá a ver uma coisa: se houvesse organismos para fazer isto, por exemplo a AHRESP, que é representativa, isso fazia sentido. Eu não estava à espera de nada, nunca tive um subsídio. Não vamos dizer que o Estado não ajudou. Ajudou. Mas os bolsos têm fundo.... Quem lá foi dar a cara devia ter pensado duas vezes. Alguns deles toda a vida tiveram ajudas e subsídios. Quem teve graves problemas foram as discotecas e a noite. Esses sim, perderam tudo. Eu ainda consigo fazer take-away.

Quanto tempo mais é que aguenta as portas fechadas?
A minha caminhada esta manhã foi a pensar nisso. Não sei quanto tempo mais... pffff... é cansativo. Estávamos aqui a planear 5 de Abril, já percebi que não vai ser tão cedo. As nossas contas e provisões, vamos ter de rever tudo. É muito cansativo. Temos muita responsabilidade e as novas ajudas... enfim, já disseram que estão para vir, mas dinheiro na conta nada. Todos os meses pum, mete, mete, mete. Isto tem um limite.

Chef, Empresário, Restaurateur, Olivier da Costa

Não dispensou ninguém?
Dos meus empregados, não. A espinha dorsal está cá toda. Ainda contratámos gente no meio disto tudo. No dia em que abrir vou ter de contratar mais.

Como acha que vai estar a restauração daqui por um ano?
No dia em que isto abrir, vai ser o efeito rolha de champanhe. Bum! Toda a gente a querer jantar fora. Tenho pensado nisso: vou abrir projectos novos no momento em que toda a gente vai querer sair, a jogada é menos arriscada por isso. Depois, é incerto. Se der para as pessoas viajarem, acho que vamos novamente ser invadidos por estrangeiros como em 2018, e quem sobreviver até vai trabalhar mais. O que é o que mais me assusta é haver uma variante pior do vírus e isto ficar tudo entre abre e fecha. Aí vai ser dramático. Mas temos de ser duros e não nos podemos deixar ir abaixo. Tenho quase duzentas pessoas a depender de mim. Uma das coisas que tentei sempre fazer foi mantê-los felizes e motivados neste período.

Como é que se faz isso?
(Joel Pires: “Estando ao lado deles”) Estando ao lado deles. A trabalhar, a almoçarmos juntos... continuando a pagar, a ter novos projectos, novas ideias. Faço-te a pergunta a ti: estás aí fechado, estás motivado?

Eu?! Pffffff.... estou aqui que nem posso.
Pois, estás a ver? Eles têm vindo trabalhar quando é possível, têm estado regularmente com o patrão, temos estado cada vez mais juntos... estou a falar dos que trabalham directamente comigo, os chefs, por exemplo. Hoje estive na cozinha a formar, a resolver um problema numa tortilha, vê lá. Pequenas coisas, para que eu normalmente não tenho tempo. Estamos a criar união, amizade, isso é importante.

Gere a empresa como um clã.
Podes dizer que sim. Tenho muitos empregados que me tratam como pai.

Já o ouvi dizer que havia de morrer à mesa de um restaurante...
Espero que sim. Como o meu avô morreu: feliz.

... e também o ouvi dizer que nunca viu um restaurante seu morrer. Isto é mesmo verdade?
Nunca fechei um restaurante a perder dinheiro. Já vendi restaurantes, já tive uns que não correram tão bem, mas perder dinheiro não. Não quer dizer que seja o super-homem, faço muitos erros, mas nestes 25 anos... ou melhor, 43 anos, que eu, desde que me lembro de ser pessoa, estou dentro de um restaurante. Sinto que nasci numa cozinha e os restaurantes são a minha vida. Quando nasci, o meu pai já tinha restaurantes, quando ele deixou de ter restaurantes eu já tinha os meus. Acho que nunca tive um dia na minha vida em que não fosse a um restaurante. Isto é o que eu sei fazer e acho que sou muito bom no que faço. Tive todos os maiores sucessos em Portugal na minha área de restauração...

Que área é essa?
É uma restauração de ambiente – é assim que gosto de lhes chamar e não tem muito que explicar. São os restaurantes que libertam dinheiro. Têm onda, não têm prémios, não têm estrelas, nem garfos de ouro. A única coisa que é quantificável é que dão dinheiro e dão emprego a duzentas pessoas. É isso que me satisfaz, não são as estrelas.

Diz isso com um certo amargo...
Já disse muitas vezes que gostava de ser reconhecido em Portugal por ser um bom chef, ou restaurateur, ou o que quiserem chamar...

Sente que não é reconhecido?
Não. Até pelo contrário. Sinto que os outros chefs gostam de denegrir a minha imagem. Gostam de dizer que não sou chef, que não faço isto, que não faço aquilo...

Isso acontece porquê?
Medo.

Medo?!
Medo.

Como assim?
Porque sou cem vezes melhor que eles todos. É mais fácil dizer mal para não ter de chegar perto. É fazer as contas: em 25 anos nunca fali nenhum restaurante, nunca perdi dinheiro, não devo dinheiro a ninguém, o negócio fala por si. A medida do sucesso para mim é esta, e por essa medida sou melhor que os outros. O Ronaldo é o melhor porque marca golos e faz dinheiro. Não podes ser o melhor jogador do mundo e estar a jogar no Estrela da Amadora.

Chef, Empresário, Restaurateur, Olivier da Costa

Isso é uma piada com as estrelas?
(Riso) Não era... com todo o respeito.

Com todo o respeito pelo Estrela da Amadora...
Sim, claro. Se és bom num negócio, ele dá dinheiro. E nisso eu sou o melhor. Quando temos negócios que não libertam dinheiro e até perdem, não se pode dizer que sejam bons. Mas pronto, isso é a minha ideia. Não me querem reconhecer como um dos melhores restaurateurs do país, ou um dos melhores chefs? Pronto, está bem. Tenho mais reconhecimento internacional do que nacional.

Em concreto, que reconhecimento deveria ser esse?
O restaurante estrela Michelin não liberta dinheiro. É um restaurante para o chef ser estrela. Nos meus restaurantes, a estrela é o cliente, não sou eu. Eu faço negócio para fazer dinheiro, não para fazer estrelas.

Percebo que não procura o reconhecimento das estrelas. A pergunta é outra: que reconhecimento lhe falta?
Falo de reconhecimento a nível de colegas e de jornalistas. Sempre fui injustiçado. Sempre fui o patinho feio, a comida uma porcaria e tudo o mais. Se a comida não fosse boa eu não tinha o reconhecimento mais importante, que é o dos meus clientes, nem tinha os restaurantes completamente cheios.

(Joel Pires: E não pediam para abrir restaurantes lá fora.)

...e não pediam para abrir restaurantes lá fora. Não sou um cozinheiro só. Faço tudo, de A a Z, o projecto, a decoração. Aqui, no (novo) Yakuza, até o projecto de luz fui eu que tive de resolver. Tenho uma noção muito grande do que é um restaurante e por isso vêm buscar- -me para projectos lá fora. A Maison Albar, a United, a Minor, hoje em dia, não fazem um restaurante sem me perguntar se eu quero fazer ou como é que eu acho que devem fazer. É o tal reconhecimento internacional.

O reconhecimento que lhe falta é dos pares e dos jornalistas, então.
Há um lobby feito de estrelas e de pessoas que escrevem. Nunca quiseram que o Olivier aparecesse. Aí por 2015, quando houve uma grande revolução na restauração, passámos do word of mouth (passa-palavra) para os TripAdvisors, os Zomatos, os jornalistas que vêm de fora, e eu não estava preparado para uma coisa dessas. Assumo. Houve colegas meus que trabalharam muito bem – tiro-lhes o chapéu –, que perceberam como isto ia funcionar nos próximos tempos. Eu demorei a perceber, a arranjar uma solução. Foi a muito custo e custou muito dinheiro. A solução, que foi pensada, foi trabalhar com influencers portugueses. Eu quando viajo quero ir aos restaurantes que estão na moda para os locais, não os que estão na moda para o TripAdvisor. Tu quando viajas vais ao Google ver quais são os melhores restaurantes ou vais pelo word of mouth?

Eu vou sempre, única e exclusivamente, pela Time Out, e em público jamais admitirei o contrário.
Mas fazes bem! A Time Out é uma marca reconhecida por isso, por conhecer bem o local. Normalmente, se escreve bem sobre um restaurante é porque ele é bom, não porque alguém pagou.

Quando diz que isto lhe saiu muito caro, refere-se ao investimento em influencers?
Vamos lá a ver: o investimento é mais food cost. Temos um acordo, eles vêm e fazem stories e nós oferecemos a comida. Foi um trabalho que não foi fácil. Mas hoje em dia todos querem, basta eu enviar uma mensagem e vêm logo.

(Joel Pires: Gostam das marcas...)

...exacto, gostam das marcas, as marcas são apelativas. Temos uns mais novos para fazer Guilty e Savage, temos uns mais velhos para fazer Seen, Yakuza e KOB...

Parece uma agência de talentos.
Pois. É Lisboa, Porto, Algarve, vai ser Comporta também... Em Portugal são muitos restaurantes e para estar top of mind é preciso tê-los consecutivamente a fazer stories dos meus restaurantes. Cria ambiente, cria onda, cria vontade de as pessoas irem, e isso já se percebeu que funciona.

Como é que se decide abrir um restaurante?
(Riso) Eu decido abrir restaurantes todos os dias, é mais forte que eu. Depois há uns que vão avante e outros que não. É uma doença, isto.

Mas não é só por impulso, calculo. Quais são os factores de decisão?
Como dizem os americanos, location, location, location. Tenho pessoas a bater-me à porta, quase todos os dias, a dizerem que têm um espaço e se não gostaria de fazer alguma coisa. Antes de mais, penso location. Depois penso se me vai canibalizar os outros negócios que tenho. Vou te dizer, e está aqui o Joel ao meu lado que me pode corrigir: nos últimos dois meses, rejeitámos umas oito propostas, fácil. Em Portugal já não quero crescer mais pelo menos até 2024. É verdade que já tinha dito isto antes, e entretanto vou abrir o XL... mas não posso mesmo abrir mais. Tenho o Porto com três restaurantes, tenho Lisboa com cinco, tenho Cascais, vou ter Comporta, vou ter Algarve... nem sei se vou ter mão para gerir isto tudo.

E sem ser restaurantes, há espaço para outros negócios?
Já me meti noutros negócios, uns correram bem, outros menos. Vamos ficar pela restauração. É mais fácil, é um negócio em que eu estou à vontade. Se ganho dinheiro com isto, para que é que vou estar a inventar? Não vale a pena.

Continuo interessado nessa sua queixa sobre os outros chefs. Por exemplo, o Ljubomir...
Eu gosto muito do Ljubomir, atenção! Somos amigos. Aquela coisa da birrinha não era para ele. Foi uma expressão que me saiu sem querer. Sou bom a fazer muita coisa, mas a falar não. Sou muito espontâneo.

Era aí que queria chegar: acha que isso o prejudica?
Sim, mas, quer dizer, mais espontâneo que o Ljubomir não há, e não me parece que isso lhe faça mal nenhum a ele. Está a fazer um óptimo trabalho, está a safar-se muito bem. Neste momento é o número um a nível de televisão, é super-comunicativo, as pessoas gostam. E eu gosto que as pessoas tenham sucesso e ganhem dinheiro. É a minha maneira de estar. O que eu não gosto é de pessoas que não têm sucesso, não ganham dinheiro, mandam restaurantes abaixo e ainda dizem que são os melhores. Mas pronto, esses lobbies foram feitos, fico triste de não fazer parte, de não ser reconhecido como a referência que acho que sou. Podes contar pelos dedos das mãos os restaurateurs que fizeram o trabalho que eu fiz. Aliás: sozinho, com dinheiro próprio, a ser o seu próprio patrão, sou só eu, não há mais nenhum. Isso se calhar assusta os outros, por isso é mais fácil mandar abaixo. Quanto ao Ljubomir, é um amigo e aquilo foi um episódio sem importância. Nem sequer falámos sobre isso.

Fica alguma mágoa nessa conversa. Sente que precisa de provar alguma coisa ainda?
Não. Nos últimos 25 anos fiz os maiores sucessos da restauração do país. Mesmo recentemente. Temos o Praia, no Algarve, que foi um sucesso enorme; o Seen, outro sucesso estrondoso... em São Paulo então, entre 44 mil restaurantes, estamos no top five. E depois chego aqui e o Olivier é o alvo a abater. Estive envolvido desde a Casa do Castelo, o Olivier Avenida, o Guilty... o Guilty, vê bem: uma pizzaria, hamburgaria que era o sítio que vendia mais champanhe em Portugal, em 2014, 2015, está aqui o Joel, que trabalhava na Bacardi Martini e não me deixa mentir. Para o bem e para o mal, foi um sucesso. E disse-se muita estupidez...

Criou-se uma imagem do Guilty que não batia certo com a realidade?
Não sei que imagem foi essa.

Deixe-me então perguntar assim: foi vítima de preconceito?
Foi vítima do sucesso. Era mais fácil mandar abaixo. Mas eu aprendi e por isso é que, hoje em dia, afasto o conceito de noite dos meus restaurantes. Numa metrópole funciona, o restaurante que se transforma em festa. mas numa cidade em que trabalhas com dois mil clientes, isto torna-se muito pequenino. É conceito dinamite. Ganhas muito dinheiro mas não aguentas muito tempo. Por exemplo, no Seen, podia ter feito isso e não quis, por isso. E há sempre preconceito, começam a dizer que está mal frequentado, mais isto e aquilo.

Com a noite a coisa degenera?
Disseste a palavra certa: degenera. Uma coisa é um restaurante que fica aberto até às duas, com um DJ que sabe ler o ambiente, música agradável e tal. Outra coisa é à sexta e ao sábado a coisa virar loucura. Não vale a pena. Já não tenho idade, já não bebo, já não tenho paciência. E esses negócios funcionam com o olho do dono lá em cima, senão...

O Olivier já não quer festa, acabou-se a festa.
Isso. Quero ir jogar golfe de manhã, dar as minhas caminhadas. Quero fazer reuniões aqui com o Joel e pensar em novos negócios.

O XL passa a XXL. Gosta de aumentativos não é? Hambúrgueres que ninguém consegue comer, sandes de cagulo, tudo em grande...
São conceitos, ó João Pedro. Tenho tanto de alta costura como tenho de Zara. Gosto de ser o primeiro a fazer as coisas, de fazer coisas inovadoras. O food porn foi uma delas. Ninguém estava a fazer e eu fiz, como achava que tinha de ser feito. Mas também era só um hambúrguer, não era mais nada.

Também houve o Absurdo, o restaurante das sandes descomunais.
Pois... o Absurdo foi daqueles conceitos que eu adorei fazer, mas no final do dia adorei vender. Comprei uma coisa por 18 mil euros, vendi por 80 mil três semanas depois. Se calhar, não é mau negócio. Em bom português, caguei para o Absurdo.

Chef, Empresário, Restaurateur, Olivier da Costa

Para que serve o segundo X em XXL?
Prometi ao Vasco [Gallego, anterior proprietário] que não lhe ia matar a marca. O novo X sou eu a acrescentar alguma coisa, mas preservando a marca. Estás a querer pôr-me como um tubarão que anda atrás de sangue, não é nada disso. As oportunidades surgem quando está tudo em baixo. Nunca teria feito o negócio que fiz com o XL antes do confinamento, claro. Mas também estou a assumir o risco. Lembro-me do XL como um grande restaurante, da tal restauração de ambiente de que falo. Um restaurante de bairro bem frequentado, onde as pessoas iam para se ver. Quero recriar isso. Um bistrot, com comida que vem daqui [mão no peito], a comida abraço de mãe. Um restaurante sem caganças, que não quer sobressair por ser alta gastronomia. É o restaurante onde vou estar sentado à noite com os meus amigos.

Quando pensa num restaurante pensa sempre nele à noite?
(pausa) Sim... por acaso... boa pergunta. Vamos lá a ver: o restaurante abre almoço e jantar, mas como sabes o almoço é um mercado completamente diferente. Fui dos primeiros a lançar o menu executivo em Portugal. Hoje em dia ninguém está para pagar cem euros ao almoço. É possível ter uma boa experiência por menos dinheiro. E já que tenho os custos, prefiro ter as cadeiras ocupadas, vender a ganhar menos dinheiro.

No meio disto tudo, ainda cozinha? Acho que nunca cozinhei tanto. Faço todos os dias almoço e jantar num dos meus restaurantes. Ainda hoje fui a um talho buscar ris de veau. Sabes o que são?

Não, confesso.
São molejas de vitela de leite, mandei vir de França.

Molejas gosto.
Ainda vou ter de pensar como faço aquilo, tem uns truques. Com um puré de batata crémeux e umas couves ligeiramente braseadas... Que tal, soa-te bem? Queres vir cá almoçar com a gente? És meu convidado.

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