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Francisco Frazão
Inês FélixFrancisco Frazão

“Emergente é um adjectivo, não é a artista que está a começar”

Francisco Frazão é o director artístico do Teatro do Bairro Alto, que antes da abertura real apresenta seis projectos, a partir de sexta-feira, que são uma espécie de pré-inauguração.

Escrito por
Miguel Branco
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Esteve 13 anos a programar teatro na Culturgest. Quando a rede de teatros municipais foi reorganizada, candidatou-se a director artístico do Teatro do Bairro Alto (TBA), dedicadoà criação experimental. A abertura, no local onde vivia a Cornucópia, está prevista para o fim do ano. Para já, comecemos antes de começar. O (Quase) Teatro do Bairro Alto leva seis projectos às imediações do TBA e levanta o pano sobre o que nos espera.

Comecemos isto de forma desconfortável: disseram-lhe o motivo de ter sido escolhido para este cargo?
Tinha que ver com o trabalho desenvolvido na Culturgest. E houve algumas coisas que o júri focou, como a ideia de fazer um programa a duas velocidades, ou seja, ter um tempo lento, com carreiras mais longas, mas não abdicar da aceleração e oferecer a possibilidade de ver dois espectáculos na mesma noite.

Continuando no desconforto: tem-se falado das obras do TBA, que têm retardado a abertura. Já há data oficial?
Não há um dia, não, mas continuamos a apontar para o último trimestre deste ano.

Ok. E afinal o que vai mudar no espaço?
As obras não são muito profundas, só que o edifício é muito grande. As áreas de intervenção são claras, uma é a tornar o teatro capaz de receber público com mobilidade reduzida. Na parte técnica há bastantes alterações que não são evidentes para quem conhece o espaço só como espectador.

Regressando à ideia das velocidades, para se ter dois espectáculos na mesma noite há que ter vários espaços.
Temos quatro espaços possíveis. A sala principal pode ser utilizada na totalidade ou parcialmente. A bancada é amovível. É possível ter um espectáculo no palco e outro só na sala. Há o foyer, usado para pequenos espectáculos, leituras e conversas, e a sala de ensaios.

O que é o (Quase) Teatro do Bairro Alto?
Mesmo na fase da candidatura, uma questão era a abertura do teatro. Era muito difícil dizer “é este espectáculo”. A ideia a que chegámos foi a de ter vários momentos que funcionassem como uma declaração de intenções. A temporada 2019/20 terá vários desses momentos. Mas depois começámos a pensar: porque não começar antes de começar? Porque não começar na cidade, já que é de um teatro municipal que estamos a falar, e depois trazer a cidade para dentro do teatro? A ideia de continuar a começar. O quase vem daí: está quase a abrir. Depois há aquela coisa de se chamar Teatro do Bairro Alto e não ser no Bairro Alto, mas sim quase no Bairro Alto. É “quase” também porque tudo o que vamos fazer é aqui na zona do Príncipe Real, Rato, Amoreiras. E também é tudo quase teatro, ou seja, nada é propriamente o teatro convencional, é mais na ordem da performance e da instalação.

Falas-me um bocado desses projectos?
São seis, dois portugueses, quatro estrangeiros. Alguns têm explicitamente a ver com a ideia de cidade. É o caso do Lookout, do Andy Field [29 e 30 de Junho, Centro Europeu Jean Monnet], que olha de alto para a cidade e que imagina o futuro de Lisboa daqui a 20, 30, 50 anos, com a ajuda de um grupo de crianças daqui, do Colégio da Casa Pia do Rato. O projecto da Joana Braga [Partituras Para Ir, ponto de encontro: Bloco das Águas Livres, 22 de Junho], um passeio performativo que quer suscitar a atenção para a cidade invisível. Outro tem que ver com a ideia de no centro desta cidade cheia haver um teatro vazio, que é o TBA, e então vamos ter umas conferências-performance do artista italiano Augusto Corrieri [In Place Of A Show, CAB – Centro Coreográfico de Lisboa, 26 e 27 de Junho]. O primeiro e o último projectos, que são uma espécie de balizas, um sobre a morte e outro sobre o sono, como se no meio...

...como se pudesse ser tudo um sonho?
Sim, esta programação ser uma espécie de sonho. Outro, sobre activistas mortos da Revolução Síria, é da libanesa Tania El Khoury [Gardens Speak, Teatro da Politécnica, sexta e sábado]. Há uma conferência-musical do norte-americano Ian Nagoski [Don’t Le Me Be Lost To You: Early 20th Century Near-Eastern Music In New York City, CAB – Centro Coreográfico de Lisboa, 19 de Junho], que tem recolhido gravações em Nova Iorque, mas de músicos da Síria, do Líbano, da Turquia, e que são uma espécie de substrato esquecido da música americana, que ele recupera.

Portanto a ideia de memória.
Sim. E depois o último espectáculo é uma instalação-performance da Patrícia Portela [Parasomnia, Reitoria da Universidade Aberta, 2 a 7 de Julho] que esteve no FITEI e que virá a Lisboa, são vários espaços ligados que levam o público a uma viagem “soporífera”, como ela diz. Diria que é um programa entre a morte e o sono, entre a memória e o futuro.

Esta pequena amostra de programação parece indicar o desejo de o TBA ser mais do que um espaço dedicado ao teatro, daí também a equipa que tem consigo: Ana Bigotte Vieira (discurso), Diana Combo (música) e Laura Lopes (artes performativas).
São três vectores. Mas este programa é uma visão parcial do que podemos fazer. Vamos apostar na produção experimental, isso é o foco principal, mas a maneira como esse experimental se articula vai ser variável, vamos ter uma programação que não tem que ser sempre coerente, que pode chocar entre si. Há uma coisa que já disse algumas vezes: lemos o emergente como um adjectivo, como algo que está a vir à superfície, que está a acontecer e não como a artista nova que está a começar e que pela primeira vez tem uma oportunidade de se mostrar numa instituição.

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