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Afogado, partido, enforcado: os castigos ao Santo António para se cumprir o casamento

Escrito por
Catarina Moura
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Um Santo António pendurado pelo pescoço pode parecer heresia, mas na verdade é tradição. O santo é casamenteiro, mas alguns devotos (especialmente raparigas) tinham de sofrer até conseguirem o namorado ou o casamento desejado. Depois de pedir a bem, por vezes era preciso apertar com o santo e castigá-lo até haver um compromisso sério – e por todo o país há relatos dos castigos de Santo António que o Museu de Lisboa — Santo António colecciona.

Neste espaço que se dedica à vida e ao culto do santo popular há uma vitrina cheia de imagens mais toscas, guardadas pelas famílias, e algumas estão em posição de quem ainda não cumpriu a função casamenteira: um está virado para a parede, outro não tem o menino ao colo, outro ainda está todo retalhado, como quem se partiu e foi depois colado. “São tradições muito antigas e enraizadas na cultura portuguesa, e já o Padre António Vieira, no século XVI, fazia referência aos pedidos singulares que se faziam a Santo António: ‘Se vos adoece o filho, Santo António; se vos foge o escravo, Santo António; se mandais as encomendas, Santo António; se esperais o retorno, Santo António; se aguardais a sentença, Santo António; se perdeis a menor miudeza da vossa casa, Santo António; e, talvez, se quereis os bens da alheia, Santo António’”, conta Pedro Teotónio Pereira, coordenador do museu no largo de Santo António da Sé. “Tradições mais actuais referem-nos a colocação da imagem de Santo António de cabeça para baixo dentro de um copo de água, ou mesmo dentro do congelador.”

Desde o século XIX que antropólogos e etnógrafos, como Leite de Vasconcelos, Armando de Matos ou Teófilo Braga, registam esta relação com o Santo António. “Ele é o advogado dos casamentos das raparigas, e quando se não digna protegê-las, metem-no num poço ou partem-no em pedaços”, escreve Teófilo Braga em 1905 sobre o que acontece em Lisboa. “Vê-se o mesmo costume no Algarve: as raparigas quando querem casar enforcam Santo António, deitam-no ao poço de cabeça para baixo, depois tiram-lhe o menino, e não o tiram do molho sem que ele tenha feito o milagre.”

Não perde nada em tentar pôr o santovirado de costas para a sala, que é coisas que não mazela. Talvez seja melhor do que atirar o Santo três vezes ao chão, como também relata Leite de Vasconcelos – é que se o santo cumpre o castigo, vai ser colar os cacos todos.

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