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Noite da Má Lingua, Rita Blanco, Júlia Pinheiro, Rui Zink
©Ricardo LopesNoite da Má Lingua

As pessoas com quem queremos jantar em 2022

Se pudesse convidar alguém para jantar no novo ano, quem convidava? Estas são as nossas escolhas.

Escrito por
Editores da Time Out Lisboa
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É a típica pergunta de entrevista de emprego, uma oportunidade para quem quer o lugar brilhar, ou uma rasteira para quem foi mal preparado: “Se pudesse escolher, quem levaria a jantar?” Nós não estamos à procura de um novo trabalho nem pretendemos impressionar quem nos lê com clichés e lugares comuns, mas começamos o ano com um hábito antigo da Time Out Lisboa: a escolha das pessoas com quem queremos jantar no ano que agora começa.

Nos parágrafos que se seguem, não vai encontrar políticos de renome, estrelas de Hollywood, membros da realeza, prémios Nobel da Paz ou deuses de beleza por quem possamos ter uma paixoneta desde a adolescência. Vai encontrar, sim, promessas e rezadas, gente com quem nos queremos cruzar nos próximos meses pelos palcos, museus, restaurantes, ecrãs, livros e redes sociais. Gente que queremos que nos impressione. A nós e a si, que arranca o ano connosco.

Noite da Má Língua
©DR

Noite da Má Língua

Em 2022, vão levar a língua afiada mais longe – e não, não é à televisão. Avizinham-se Noites da Má Língua ao vivo.

Foram, durante anos,os desejados. Em Setembro de 2021, fizeram a vontade aos que pediam (e pediam e pediam) um regresso do programa mítico dos anos 90. A Noite da Má Língua voltou, não aos ecrãs da SIC, mas enquanto podcast do Expresso. O reencontro foi orquestrado por quem, afinal? “Júlia”, dispara Rui Zink, atropelado pela apresentadora que diz que foi “o universo”, seguida por Rita Blanco que garante que foi “Jesus”. Na verdade, “quando se começou a falar da ideia de fazer mais podcasts aqui dentro do grupo Impresa pôs-se a hipótese”, recorda a também directora da SIC Mulher e SIC Caras. Foi o suficiente para reacender a chama entre Júlia Pinheiro, Rita Blanco, Manuel Serrão e Rui Zink. “Na atitude e na forma de ser não mudámos”, diz Serrão, que se junta à equipa por videochamada. “A idade até nos dá a liberdade para dizer ainda mais o que nos apetece. Se há 25 anos não dependíamos de nada, hoje ainda dependemos menos.”

À mesa no estúdio em Paço de Arcos, numa segunda-feira à noite e a minutos de gravar mais um episódio, a conversa flui. Discute-se efusivamente e com fartas gargalhadas. Fica a sensação de que, segundos depois, com o gravador ligado, nada mudou. Nem há preparação prévia. “Estamos só naturalmente atentos ao que se está a passar”, esclarece a moderadora. Este novo formato, sem registo visual e apoiado exclusivamente no áudio, “não é um regresso pela porta pequena, é um regresso pela porta grande”, diz o empresário do Porto, evocando a popularidade crescente dos podcasts. “Nas aldeias mais recônditas de Portugal está tudo nos podcasts”, brinca Rita. A novidade é, para todos, uma bênção. “A liberdade da qual sempre vivemos foi uma das marcas do nosso discurso e de como comunicamos sempre, mas o podcast tem uma liberdade quase transgressora que acho que vai muito bem com as nossas personalidades”, diz Júlia, ciente de que “a televisão implica um determinado acting”. Além disso, o podcast “implica menos poder”, alerta Rita Blanco. “A televisão, quer se queira quer não, dá-nos um pseudopoder que eu não acho muito interessante. Aqui podemos ser tão parvos quanto queiramos e dizer as coisas da forma que nos interessa sem implicar demasiadas coisas.” Com um cenário político inquestionavelmente diferente, o debate hoje não é mais fácil do que há 25 anos. “Salvar a humanidade é complicado, é um trabalho difícil, é sujo, mas alguém tem de o fazer”, ironiza Zink. A Noite da Má Língua, emitida entre 1994 e 1997, chegou a contar também com Miguel Esteves Cardoso – mas é escusado contar com a participação regular do elemento em falta, que deixou uma mensagem no episódio de Natal. “O Miguel está contratualmente ligado ao grupo RTP”, explica Júlia. “Sabemos que nos ouve. Gostaríamos muito de contar com ele, naturalmente, agora vamos lá ver. Para já, aqui a nossa tribo está feliz e contente. Vamos ver na declinação [para outros formatos] o que é que pode acontecer.

Temos muitas ideias.” Uma delas é fazer episódios gravados ao vivo perante uma plateia – já em 2022. “Seguramente, que nós não vamos para novos. Já somos sexagenários”, troça. Sem descartar a hipótese de um evento televisivo, admite que “gostava muito que fizéssemos o podcast ao vivo, em algum sítio”. “Mas vestidos assim, todos normais?”, questiona Rita. “Todos normaizinhos”, promete Júlia. “Eu não vou sem maquilhagem”, avisa Zink. Aquando da exibição do programa, nos anos 90, a equipa chegou a fazer algumas “performances” ao vivo, sobretudo em universidades. “Correu muito bem”, recorda Júlia. “Na altura não se usava, mas fiquei sempre com aquilo na cabeça. E agora como tem aparecido esta nova tendência de fazer podcasts ao vivo, de resto coisa muito bem- sucedida em vários países do mundo, é provável que aconteça. Está aí, está a rolar.”

Idade: Rita Blanco, 59 anos, Júlia Pinheiro, 59 anos, Rui Zink, 60 anos, Manuel Serrão, 62 anos

O que fazem: comentadores de actualidade portuguesa

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Joana Moreira
Jornalista
Rita Vian
©Eva Fisahn

Rita Vian

Em 2022, vai mostrar que a tradição é o que era e o que ainda vai ser.

Quando era pequenina, Rita Vian já cantava livremente o fado sem saber ainda o que era o fado. No seio de uma família musical, entoavam-se fados de forma singela, sem os instrumentos tradicionais – algumas das suas primeiras memórias musicais são na casa da avó, com a família a cantar à volta do piano. As melodias que ela traz na cabeça vêm daí. Depois, na adolescência, o hip-hop atraiu-a pelo ritmo e a rapidez de pensamento, a fluidez fonética e a alma poética. Mais tarde, quando começou a criar canções, gravou com Mike El Nite, Benji Price e DJ Glue, e chegou a integrar os Beautify Junkyards, seduzida pelo lado experimental do grupo. Depois de lançar os primeiros temas a solo, Branko convidou-a a colaborar com ele e produziu o EP de estreia CAOS’A, que saiu em 2021 com o selo da Arraial, o braço editorial da agência Arruada. O resultado é uma mão cheia de canções que deixam pistas promissoras para o futuro. O facto de criar música no silêncio, só com a voz, ajudou-a a imaginar novas possibilidades, criando um som seu, pondo a música electrónica global e a Lisboa multicultural a namorar com a sua forma afadistada de cantar.

Nas suas letras, que brotam de matérias simples mas profundas, respira-se ar puro. São canções sobre a vida, o amor e as mágoas humanas, que tentam abrir novos caminhos sem arrancar as raízes. Rita Vian não é fadista, mas sabe usar a expressividade do fado para elevar o seu canto. Cristalina e enfeitiçante, ela leva na voz a melancolia lusitana, por entre trilhos sarracenos e ritmos mutantes. Em 2022, a artista lisboeta vai continuar a criar e a levar a sua música a palcos maiores. “Estou feliz por tocar em palcos como o do Festival Impulso, no ID NO LIMITS ou no Primavera Sound”, diz-nos Rita Vian. “Prometo coisas novas e palavras cada vez mais próximas do que quero trazer à minha música.” Por cá, vamos manter os ouvidos e os horizontes bem abertos.

Idade: 30 anos

O que faz: música

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Ana Patrícia Silva
Jornalista de Música, Time Out Porto
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Víctor Huarte
©Inês Sá

Víctor Huarte

Em 2022 vai ver a marca Huarte crescer e continuar a explorar o melhor de dois mundos: a criatividade e a indústria.

Víctor não penda em arredar pé do Porto, cidade a que chama sua desde que chegou para fazer Erasmus, em 2017. A proximidade das fábricas e a profusão de ferramentas de confecção seduziram-no e foi em Portugal que este jovem designer espanhol deu os primeiros passos para criar a sua própria marca. Chama-se Huarte e nasceu em plena pandemia. “Estava em casa fechado com a minha máquina de costura e tinha ainda alguns tecidos. Fiz duas máscaras e pu-las à venda. Foi um sucesso. O que começou por ser uma brincadeira acabou por me sustentar durante aqueles meses”, recorda em conversa com a Time Out. Para trás deixou um percurso pouco linear. Começou por estudar Gestão e Marketing, embora já sonhasse com o Design de Moda. A alta-costura de John Galliano para a Dior é uma referência até hoje, embora a sua abordagem seja bem menos teatral e focada num pronto-a-vestir masculino pensado para o dia-a-dia. “Tento que a minha roupa seja criativa, com detalhes que a tornem especial, mas gosto que olhem para ela e pensem em usá-la.” A passerelle é igualmente familiar. Com a colecção de final de curso da ESAD, passou pelo Sangue Novo da ModaLisboa e pelo Bloom do Portugal Fashion, onde a última participação (com a colecção The Lighthouse) lhe valeu uma menção honrosa. “Um dos prémios era produzir um dos coordenados do desfile com a Salsa. Acharam que não fazia sentido e acabámos por incluir mais peças.” O resultado foi uma colecção cápsula de nove peças lançada em Setembro com a marca portuguesa. Mas a relação aprofundou-se. Além da marca própria, Víctor é actualmente o responsável pelas camisas e tricots da Salsa, dentro do departamento de moda masculina. Uma forma de financiar a Huarte quando se prepara para entrar em 2022, ano que trará um novo desfile no Portugal Fashion (o designer já pensa em aumentar a colecção) e uma possível nova colaboração dentro da indústria nacional.

Idade: 30 anos

O que faz: designer de moda

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Mauro Gonçalves
Editor Executivo, Time Out Lisboa
Rafaela Louzada
©DR

Rafaela Louzada

Em 2022, vai continuar a sua investida na mudança de paradigmas: mais direitos para as minorias, mais mulheres e mais sustentabilidade na cozinha.

Rafaela Louzada, Rafa para os amigos, foi aluna da primeira turma do primeiro curso de gastronomia do Rio de Janeiro, aprovado pelo Ministério de Educação brasileiro. “Quando eu era pequena nem sabia que ser cozinheira era uma profissão possível. Eu adorava cozinhar, a minha avó era uma grande doceira e eu fazia bolos às escondidas, porque a minha mãe não queria que eu acabasse com os ingredientes”, conta divertida a chef do restaurante Gruta. “Foi então que ali consegui unir o que amava com uma forma de me sustentar”, diz. O Gruta abriu no Verão de 2021, em plena na Rua de Santa Catarina, no Porto, e aposta forte nos peixes e mariscos portugueses, fornecidos sobretudo por pescadores e produtores do Norte. A paixão por esta matéria-prima surgiu com o pai, também ele exímio cozinheiro, com quem ia todos os fins-de-semana ao Mercado de São Pedro, em Niterói.

Neste seu restaurante – elogiado por outros chefs e muitos jornalistas –, a sustentabilidade é palavra de ordem. Servem ostras do Sado acompanhadas de vinagrete de chalotas e uma fatia de limão (5€); nuvens de bacalhau (3,50€/2 unidades), semelhantes aos bolinhos, mas inspiradas numa receita da avó da chef; moqueca de peixe (17€); arroz do mar; e um prato de peixe do dia, pescado à linha, com puré de batatas e legumes da estação (ambos a 18€). Os pratos são preparados numa cozinha constituída só por mulheres. “Começou por ser um acaso, mas depois virou bandeira”, afirma Rafa, disposta a mudar a narrativa das cozinhas que conhecemos. “Ainda prevalece muito a ideia do chef punitivo. Na minha cozinha prezo muito a partilha de opiniões, o incentivo, a abertura, a confiança. Temos uma estrutura mais horizontal. Não quero que tenham medo dessa figura do chef, que é o mais comum”. Feroz apoiante do sucesso alheio e dos direitos LGBT, conta que a sua maior virtude é a de gostar fazer crescer quem está à sua volta.

Idade: 38 anos

O que faz: chef

Encontre-a aqui e no restaurante Gruta, Rua de Santa Catarina, 447 (Porto)

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Gil Fortuna
©DR

Gil Fortuna

Em 2022 vai democratizar o pão artesanal abrindo, com Vasco Coelho Santos, uma mega fábrica/padaria.

O alarme dispara às quatro e meia da manhã. Gil Fortuna engole uma taça de cereais, despede-se da mulher e da filha e pega na bicicleta. Vai da Cordoaria, onde mora, à Rua das Flores, onde residiu até ao final da semana passada, em formato pop-up, a padaria Ogi by Euskalduna. “É fácil, é sempre a descer”, ri. A primeira coisa que fazia assim que lá chegava era ligar o forno. Depois, verificava as massas e alimentava os fermentos. Quando o forno atingia a temperatura desejada, começava por cozer os croissants. Seguiam-se, depois, as baguetes, os buns, os brioches e os pães, numa cadência que obedecia a uma lógica precisa. Num forno mais pequeno, ao lado, coziam as cookies, os palmiers, os scones e as bolachinhas que faziam as delícias de quem se aproximava da vitrina. “Por volta das oito da manhã começava a fazer as massas de pão na amassadeira”, diz, acrescentando que este processo terminava lá para as 11.00. Enquanto isso, já dera forma a croissants e incorporara boas doses de manteiga nas massas folhadas. As mãos de Gil Fortuna foram, desde sempre, destinadas a produzir obras de arte. Perdemos um escultor, ganhámos um bom padeiro.

“Desde pequeno que queria estudar Belas Artes. Mas desde pequeno que fazia também pão na casa da minha avó. Nunca me passou pela cabeça ser padeiro, queria ser pintor ou escultor. Mas, anos mais tarde, comecei a fazer pão em casa com a minha mulher, pesquisámos muito, descobrimos a massa mãe e os seus benefícios, vendemos a clientes e a colegas na faculdade. Até que, no último ano do curso, durante uma exposição, percebi que o que queria mesmo fazer era pão.” Seguiu- -se uma breve passagem pelo restaurante Areias do Seixo, perto de Torres Vedras – “Foi a experiência mais incrível que tive até hoje”; um período de cinco anos na École Internationale de Boulangerie, em França, onde também foi formador; e um jantar no balcão do Euskalduna Studio, de onde surgiu uma parceria com Vasco Coelho Santos, o chef, e que está prestes a dar frutos: a muito esperada fábrica/padaria com produção de pão artesanal na Rua de Santo Ildefonso, que abrirá em Janeiro ou Fevereiro. “A ideia é fornecer pão de qualidade a restaurantes e hotéis, mas também vamos ter uma loja pequena onde as pessoas podem comprar o seu pão e tirar eventuais dúvidas com os padeiros”, remata Gil.

Idade: 31 anos

O que faz: chef padeiro

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Felipa Almeida
©Matilde Travassos

Felipa Almeida

Em 2022, vai continuar a correr Portugal em busca de objectos e ofícios.

Felipa nunca escondeu o apreço pela pequena escala. Em casa, no atelier ou no rol de interiores que já projectou (em nome próprio ou durante os dez anos em que integrou a dupla AnahoryAlmeida), os objectos de arte ou artesanato, meramente decorativos ou pertinentemente funcionais, estão inscritos no currículo desta curiosa formada em História da Arte. “Um gosto pelo belo”, sintetiza a própria, em conversa com a Time Out.

“Cresci na Suíça e estudei em Londres, então os projectos sempre foram uma oportunidade para ir descobrindo o meu país e o seu artesanato”, explica. Com o passar do tempo, foi desenvolvendo uma colaboração estreita com artesãos de todo o país — oleiros, marceneiros, cesteiros, ceramistas e bordadeiras enriqueceram ambientes como o São Lourenço do Barrocal, o Belcanto ou a Marisqueira Azul. O estúdio fechou portas no ano passado e Felipa prossegue agora na missão de trazer os velhos ofícios para a contemporaneidade. Depois da teoria, no terreno, descobriu o que de imaterial e precioso existe no saber-fazer português. “Estamos a falar de pessoas muitas vezes isoladas, o que tem aumentado esta vontade de servir de ponte, de dar voz e luz, e de, de alguma forma, ser útil. Isso fez-me querer continuar com os projectos e também com o trabalho de curadoria.”

O atelier, que divide com a ilustradora e ceramista Henriette Arcelin em Campo de Ourique, é uma das montras deste impulso recolector. “Há peças tradicionais nas quais não ouso tocar”, resume. É dessas que são feitas as vendas pop-up que organiza de tempos a tempos – uma curadoria de objectos especiais, que saem de oficinas para encontrarem morada nos ambientes urbanos. “Dá-me muito gozo perceber que técnicas antigas podem ser trazidas para o dia-a-dia. Muitas vezes, quando uma peça é posta num espaço onde respira é que se percebe a sua beleza, complexidade e a dedicação que envolve.”

Para 2022, antevê um ano promissor para o artesanato português. A sua viagem pelo património nacional ainda agora começou e, por estes dias, aprofunda conhecimentos sobre antigos utilitários alentejanos para um hotel que abrirá portas naquela mesma região. Em Maio, vai marcar presença em mais uma edição da Lisbon by Design. “Há cada vez mais interesse, da nossa parte e de quem vem de fora. O importante é manter o artesanato vivo e a evoluir, e celebrar o facto de haver um futuro”.

Idade: 42 anos

O que faz: curadora de artesanato

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Mauro Gonçalves
Editor Executivo, Time Out Lisboa
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Alice Neto de Sousa
©André Ferreiro

Alice Neto de Sousa

Em 2022, vai falar mais com as mãos e vamos poder vê-la em mais palcos, a mostrar como a poesia pode ser uma forma de activismo.

2021 teve tanto de estranho como de espantoso. Quem o diz é Alice Neto de Sousa, que nunca imaginou terminar o ano com uma récita de poesia no Teatro São Luiz. Foi na 1.ª edição da Power List da revista Bantumen que a ouvimos ao vivo pela primeira vez, a homenagear as 100 personalidades negras mais influentes da lusofonia. Mas a poeta, licenciada e mestre em Reabilitação Psicomotora, já andava a fazer das suas. Depois de o seu poema “Terra” integrar (e dar nome) à antologia Do que ainda nos sobra da guerra – e outros versos pretos, publicada pela editora brasileira Ipêamarelo, Alice juntou-se à Bolsa de Poetas da associação cultural A Palavra e tornou-se presença assídua no programa Bem-vindos, da RTP África.

“É engraçado: estive quase para seguir contabilidade. Se o tivesse feito, agora seria uma pessoa completamente diferente”, diz-nos ao telefone, logo a seguir a confessar sentir-se poeta desde que, ainda menina, se revia nas mágoas de Florbela Espanca. “Ter estudado psicomotricidade forçou-me a estar mais conectada com as minhas emoções e a desenvolver a relação com o outro. Todo esse trabalho tem feito de mim melhor poeta.” Actualmente, a especializar-se na área da surdez, Alice admite o fascínio pela linguagem do corpo, razão pela qual começou a aprender Língua Gestual Portuguesa (LGP) na Associação Portuguesa de Surdos, e tem estado focada em escrever “poesia para ser dita” também através dos gestos e das expressões.

“Quero explorar esta coisa de falar com as mãos. Ando a investigar sobre poesia em LGP, porque existe e até temos um poeta surdo de referência, o Amílcar Furtado.” Nos entretantos, tem vindo a resgatar versos de “um lugar de muita profundidade”. São sobretudo inquietações, como o seu olhar sobre as prostitutas do metro do Martim Moniz, a quem gostaria de dedicar um livro muito em breve, ou a sua experiência enquanto mulher negra, nascida em Portugal e com raízes em Angola, que tem ainda “muitos caminhos para descobrir” dentro de si. “Não sou nada de levantar ondas. Tenho muito medo de incomodar. Até o digo num poema inédito: ‘Andar a afiar a língua/ O que é que isso importa?’. Se calhar, importa, porque as palavras têm força.” Afinal, diz no mesmo poema, “quem vai perder tempo a escrever versos de amor/ com estes tempos, estas tempestades, estes sismos, estes ismos”. Sem estar preparada, mas com uma bravura inesperada, Alice escreve antes sobre “dores comuns”. “É o ser humano que sou antes de ser poeta”, remata.

Idade: 28 anos

O que faz: poeta

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Raquel Dias da Silva
Jornalista, Time Out Lisboa
Rafaela Jacinto
©Mariana Valle Lima

Rafaela Jacinto

Em 2022, vai escrever um novo espectáculo e concluir a tese de mestrado sobre a influência do cristianismo nas artes performativas.

Durante quase dez anos, Rafaela fez parte de uma ambiciosa produção. Pathos Ethos Logos, a trilogia de Joaquim Pinto e Nuno Leonel, estreou em Locarno, mas muito antes da consagração da obra em ecrãs internacionais, os dois realizadores conseguiram convencer uma jovem indecisa a agarrar numa carreira como actriz.

“Nunca foi bem um sonho. A minha mãe é que queria ter uma filha licenciada em alguma coisa. Estava indecisa entre História e o teatro e fui um bocadinho empurrada pelo Joaquim e pelo Nuno. Conheci-os em 2012 e houve qualquer coisa que me despertou”, recorda.

O Conservatório veio depois. Diz hoje ter resistido à formatação académica, embora tenha feito a vontade à mãe e concluído o curso. O teatro esperava por ela. Começou por trabalhar com Alex Cassal, seguiu-se o Teatro Praga, a Cão Solteiro e o convite inesperado de Luís Miguel Cintra para integrar o elenco de Canja de Galinha (com Miúdos), já em 2019.

Pelo caminho, Rafaela questionou e consolidou a sua própria espiritualidade. A fé cristã, assumida e reiterada, seria o mais estranho dos corpos dentro da comunidade artística. Nos últimos anos, fez dessa a sua causa. “Comecei a aproximar-me da religião e percebi que, no meio artístico, ainda existe muito preconceito em relação a isso. O meu coming out queer foi muito mais fácil do que chegar e dizer: acredito em Deus.”

Crença e vocação tornaram-se indissociáveis, manifestas em produções próprias como Ad Bestias (2018), Choo-Low (2019) e Via Crucis (2021). Ao mesmo tempo, voltou à sala de aula, desta vez para estudar História e Cultura das Religiões. “Peguei na teologia feminista e na teologia queer, temas sobre os quais não existe informação em Portugal. Para mim, é impossível separar as duas coisas, o que é muito problemático para a sociedade. As pessoas esperam que seja queer ou cristã.”

Em 2022, vai continuar. Activismo? Em todas as frentes, incluindo o livro de poesia Regime, que quer continuar a divulgar. Também gostava de dar aulas – de Religião e Moral – e de começar a mudar mentalidades a partir das novas gerações. “Não vou ser a Joana d’Arc, mas sinto que é este o meu caminho. Vejo muita ignorância.” Ao mesmo tempo, quer escrever um novo espectáculo (tendo as stigmata dos santos e a anorexia de Santa Catarina de Sena como ponto de partida) e com ele explorar uma dimensão mais física do seu trabalho.

Idade: 27 anos

O que faz: actriz e activista

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Mauro Gonçalves
Editor Executivo, Time Out Lisboa
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Dani Salles
@vanessareisphotography

Dani Salles

Em 2022, vai “dar um Oi Portugal” – fazer uma viagem de autocaravana de norte a sul do país.

Foi uma das vítimas de Joana Marques no seu Extremamente Desagradável, para a rádio Renascença, embora numa das menos desagradáveis emissões do programa, e assim se tornou conhecida à escala nacional. Bem- -humorada e com uma energia contagiante, Dani Salles é autora de frases como “Se fosse para andar eu também participava” ou “Vou pôr a máscara para não beber mais” (brevemente numa t-shirt perto de si), que ajudaram a garantir novos milhares de seguidores no dia do programa de humor. Um dia em que Dani planeava festejar a meta dos sete mil seguidores da sua página de Instagram Oi Cascais, tendo comprado um balão e tudo, como nos contou. Planos que tiveram de ser adiados com a chegada de mais dois mil fãs à sua página, quase de uma assentada. Mas quem é afinal a nova relações públicas da Linha? Carioca, no início da pandemia trocou o Rio de Janeiro por Cascais, para onde foi morar com o marido à procura de mais segurança. Com ela trouxe a ArtMais, empresa de eventos corporativos que fundou no Brasil, mas o confinamento e as restrições trocaram-lhe as voltas. “Abri a minha página de Instagram, porque os meus trabalhos estavam parados”, descreve. No início, a maioria dos seus seguidores eram brasileiros. “Depois que eu saí na rádio, foram muitos seguidores portugueses, de tudo quanto é lugar. Recebi várias mensagens lindas desses seguidores novos que vieram pela rádio e também pelo programa da SIC Casa Feliz”, onde participou, pós-Joana Marques. “Para mim foi óptimo, eu morri de rir, achei [o Extremamente Desagradável] muito engraçado. E nem conhecia esse programa, foi uma surpresa mesmo”. Em Cascais, também se sente em casa e há um cantinho especial (com dois mil metros quadrados) que Dani diz que vai dar que falar no novo ano: o Palaphita Cascais, um restaurante “eco-lounge” de raízes amazónicas, irmão do Palaphita Galeão, no Rio de Janeiro. “O restaurante é muito conhecido no Rio. Sinto-me em casa, e todo o mundo pode levar o cachorro. Levo o Charlie lá e tomo uns drinks”, diz, referindo-se ao seu cão português (veio do Porto) que é também uma celebridade no Instagram. Em 2022, o Oi Cascais ultrapassa fronteiras e transforma-se em Oi Portugal: Dani vai dar uma volta ao país e animar as redes com a sua energia contagiante.

Idade: “Costumo dizer que tem uma música para esta pergunta: “Forever young, I want to be forever young”

O que faz: influencer

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Renata Lima Lobo
Jornalista
Rafael Morais
©Mariana Valle Lima

Rafael Morais

Em 2022, vai ser assíduo no cinema e na televisão

Quase sem darmos por ele, Rafael Morais tem vindo a ganhar espaço na televisão e no cinema. Não é do nada que dizemos que 2022 pode ser o ano da sua afirmação (se é que não a teve já, depois de se ter tornado num dos poucos portugueses com créditos em duas séries Netflix). O actor, que começou em grande, em 2008, com Amor de Perdição, de Mário Barroso, e Como Desenhar um Círculo Perfeito, de Marco Martins, em 2009, vai ter nos próximos meses nada mais, nada menos do que quatro longas-metragens e uma série de televisão. “O início da pandemia foi bastante duro, estava em Los Angeles e tive de vir para Lisboa”, conta, explicando que inicialmente as perspectivas não eram muitas. White Lines, a série da Netflix onde foi o jovem Boxer, a personagem principal de Nuno Lopes, já tinha sido rodada, e Amadeo, filme de Vicente Alves do Ó, também – este porém acabou por ser adiado e a estreia deverá acontecer até ao Verão.

“Foi estranho, até porque uns meses depois não parei mais.” Poder-se-ia pensar que foi um golpe de sorte. Mas Rafael é peremptório: é resultado de “muito trabalho e muitas audições”. Não há outra alternativa na vida de um actor que quer fazer da arte vida. Foi assim que aconteceu, por exemplo, com Glória, a primeira série portuguesa feita para a Netflix, onde deu vida a Domingos, funcionário da RARET. Em 2022, o mais provável é começarmos por vê-lo no papel do pintor português Amadeo de Souza-Cardoso (1887-1918), um desafio com o seu risco, diz o actor, por se tratar de uma “figura portuguesa conhecida”. Protagoniza ainda A Cup of Coffee and New Shoes On, do realizador albanês Gentian Koçi, e que conta a história de dois irmãos gémeos surdos, inseparáveis, que descobrem que, devido a uma doença genética, ficarão cegos. “Foi um processo muito intenso porque não falo durante o filme todo, tive de aprender língua gestual”, explica. “Depois vou ter Evadidos, que é totalmente diferente.” Filmado em Barcelos, o terceiro filme do realizador português Bruno Gascon é apresentado como uma ficção distópica de um país em ditadura – se tudo correr como planeado, a longa-metragem dará ainda origem a uma minissérie que passará na RTP1.

Também no Norte, Rafael Morais filmou Mal Viver, de João Canijo, realizador com quem já tinha trabalhado em Sangue do Meu Sangue (2011). “Trabalhar com o João Canijo é sempre especial porque há uma grande colaboração e ele dá-nos tempo para explorarmos os nossos personagens, isso é um luxo”, afirma. Para este Mal Viver – que junta no elenco nomes como Rita Blanco, Anabela Moreira, Cleia Almeida, Nuno Lopes, Beatriz Batarda ou Leonor Silveira – João Canijo instalou toda a equipa num hotel em Ofir, Esposende, onde viveram durante três meses. A história, sobre o amor disfuncional entre mães e filhas, mas sobre a qual ainda se sabe tão pouco, estará também na base da série Hotel do Rio. “O mais provável é que o filme faça o circuito dos festivais e chegue depois às salas”, conclui Rafael.

Idade: 32 anos

O que faz: actor

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Nuno Mendes
©Manuel Manso

Nuno Mendes

Em 2022, vai ter novidades em Lisboa e no Porto. Correndo bem, este pode até ser o ano que marca o regresso a Portugal, após quase duas décadas a viver (e a brilhar) em Londres.

Nuno Mendes não gosta de prometer o que não pode garantir que cumpre – e prognósticos só quando as portas estiverem abertas –, mas se tudo correr como previsto, é certo que ouviremos falar do chef mais do que uma vez em 2022. A começar desde logo com a sua declaração de amor a Lisboa em forma de restaurante que abrirá na Primavera em Londres. O Lisboeta, que leva o nome do livro que editou em inglês e português, “é uma homenagem a Lisboa” numa zona cool da capital inglesa, Fitzrovia, bem perto de Soho, “um espaço giro, porreiro, onde se vai poder comer e beber muito bem”, sem ser preciso gastar muito dinheiro, garante- nos. A inspiração são as tascas lisboetas, a celebração é a da cozinha portuguesa, tal como já fazia na Taberna do Mercado. “É um espaço que quero que seja informal, onde se vai poder comer uma bifana, um rissol, uns petiscos fixes.” Mas não só. Apesar de a pretensão não ser a alta-cozinha, que já o levou a conquistar a estrela Michelin em dois projectos (Viajante e Mãos), o Lisboeta terá no piso inferior uma adega “onde vai ser possível fazer uma coisa mais a sério”. E quer isso dizer, jantares temáticos para uma dúzia de pessoas, onde Nuno Mendes espera juntar chefs, produtores de vinhos e amantes de uma boa refeição. “Vai ser uma coisa mais arrojada, é para me divertir e fazer experiências.”

Já em Lisboa, onde é director criativo do BAHR, o restaurante no topo do Bairro Alto Hotel que abriu em 2019, o chef espera finalmente conseguir ter o seu restaurante de rua. Um sonho que está incluído no projecto da reabilitação do hotel desde o início, mas que a pandemia tem vindo a adiar. “Eu gosto de sentir o pulso à cidade, tenho saudades disso, e no BAHR, apesar de tudo, é preciso subir até lá cima, não é a mesma coisa que ter um restaurante com porta aberta para a rua, gostava muito de ter isso.” Nuno Mendes não quer levantar o véu sobre o que ambiciona para esse espaço, mas quando o descreve vagamente não parece estar muito longe do Lisboeta. Perspectivas para a abertura é que não arrisca. “Eu gosto de anunciar as datas duas semanas antes de abrir”, brinca. O mais provável é que chegue ao Porto primeiro, mas aí o silêncio ainda é maior. “É um projecto muito especial, muito lindo”, diz-nos apenas, deixando a maior novidade para o fim: “A minha ambição é voltar a viver em Portugal com a família.”

Idade: 49 anos

O que faz: chef

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2022, bora lá

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2021 foi o rescaldo da reviravolta de 2020 e demorou ainda até a agenda da cidade voltar a animar. Mas não desista já de 2022. Pode ser que queira ser seu amigo e o convide a sair mais vezes. Para o ajudar, temos uma lista de agendas, para todos os gostos e carteiras. A ideia é começar a planear os eventos a que não vai faltar e tudo o que quer realmente fazer em 2022. Desta é que é.

  • Coisas para fazer

No total são 13 os feriados nacionais, mas este ano só quatro vão dar azar – que é como quem diz que calham ao fim-de-semana. Mas planeando com antecedência, é possível marcar fins-de-semana prolongados para uma ou outra escapadinha. Os feriados são a oportunidade perfeita para estender as férias e passear com a cara-metade, ou juntar a família para um programa de festas especial. Para o ajudar, reunimos propostas de coisas para fazer. Como bónus, temos também ideias para os feriados municipais de Lisboa e arredores.

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  • Viagens

Em 2022 não vão faltar razões para dar a volta ao mundo. Aberturas de museus impressionantes, exposições campeãs de likes nas redes sociais, peças de teatro imersivas, festivais de música e até um parque temático de Game of Thrones: todas são óptimas desculpas para apanhar um avião e conhecer uma nova cidade ou revisitar um sítio onde fomos felizes. Seleccionámos 22 destinos e coisas para descobrir em 2022, um género de bucket list do ano novo, em tom de esperança no que aí vem.

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