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Rita Blanco
Fotografia: Mariana Valle Lima

Rita Blanco: "Há alturas em que não sei porque é que sou actriz"

Rita Blanco é uma das grandes figuras da ficção nacional, mas não tem grandes peneiras. Por graça, sentámo-nos a conversar com a actriz num dos mais luxuosos hotéis do país.

Renata Lima Lobo
Escrito por
Renata Lima Lobo
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Entrevista originalmente publicada em Dezembro, na edição de Inverno 2022/2023 da revista trimestral Time Out Lisboa

O Hotel Palácio Estoril foi o cenário escolhido para entrevistar Rita Blanco, que celebrou 60 anos de vida em Janeiro de 2023. Depois da telenovela da SIC Por Ti [terminou em Março], e da minissérie de três episódios da OPTO do remake do clássico O Pai Tirano, estreado em Julho de 2022 nas salas de cinema, regressou ao pequeno ecrã com outra minissérie, desta vez inédita, inspirada na vida do cantor Marco Paulo. De riso fácil, mas também de lágrima sempre à espreita, Rita Blanco preferiu um tratamento “por tu”. E assim contamos-lhe como foi, optando por não recorrer a didascálias como [ri-se] ou [dá uma gargalhada] ou mesmo [lacrimeja]. De certeza que o leitor as irá ouvir, enquanto lê.

Rita Blanco
Fotografia: Mariana Valle Lima

Tens uma carreira com cerca de 40 anos. Há pessoas que assinalam anos de carreira, ligas a essas coisas?
Nem sei o que isso quer dizer. Há pessoas para quem isso faz sentido e eu acho muito bem. Eu tive um princípio de vida artística, ou lá o que é isso, muito saudável, muito bom. Conheci pessoas que me interessavam muito, aprendi imensas coisas com elas, muitas esqueci, e portanto tive muita sorte também. Ainda agora tive outra vez sorte, quando achava que a sorte tinha terminado. Estava muito ligada afectivamente, e não só, à Cornucópia e pensei: “Pronto, não faço mais teatro. Acabou.” E de repente aparece-me o Pedro Penim com aquela proposta [a peça Pais&Filhos] e foi mesmo a melhor coisa que me podia ter acontecido.

Porque é que não querias fazer mais teatro?
Tenho imenso medo de falhar e uma memória muito esquisita. Por exemplo, na televisão, que tem uma carga de memorização muito grande, encontrei um processo que é: aproprio-me do texto e torno-o meu. Não digo o que lá está, e isso facilita-me. Como é natural, é muito cansativo, porque tenho de estar sempre a reinventar, a pensar no que vou dizer. Mas é um trabalho de sapa, fazer novelas é ser uma espécie de corredor de fundo.

E tens feito muitas novelas.
Só a partir dos 50 é que comecei a fazer novelas.

Por necessidade ou por gosto?
Foi uma altura em que achei que queria fazer um outro tipo de vida e que precisava de mais dinheiro. Eu estou há muitos anos ligada à SIC. Fiz A Noite da Má Língua [1994-1997], fiz uma série que gostei muito de fazer [Sai da Minha Vida, 1996], realizada pelo João Canijo, adaptada de uma série inglesa. E eu gostava muito de trabalhar com o Emídio Rangel, acho que ele foi muito importante numa determinada altura para o panorama da televisão portuguesa. Ele era um tipo que gostava mesmo de televisão e isso pegava-se aos outros. Entretanto, a vida vai-se encarregando de nos fartar de estarmos sempre a fazer as mesmas coisas, mas claro que a televisão é uma maneira de ganhar dinheiro. E isso depois deu-me acesso a ganhar mais dinheiro ainda. Porque comecei a fazer publicidade. Mas reservo-me o direito de escolher aquilo que faço no teatro e no cinema.

Recusas muitas coisas?
Algumas, sim. Porque é assim, eu tenho tanto medo de fazer teatro, que só quero fazer os espectáculos que me apetecem muito. Com pessoas com quem me apeteça muito trabalhar. Às vezes escolho bem, outras menos bem. Mas no teatro acho que escolhi sempre bem. Ou fui escolhida. Escolhemo-nos, vá. No cinema, a mesma coisa. Fiz muito cinema, hoje em dia faço muito pouco cinema, e também me reservo o direito de escolher.

Não estás a filmar?
Não, o último filme que fiz é o do Canijo [Mal Viver, que entretanto venceu o Urso de Prata no Festival de Cinema de Berlim].

Recentemente, disseste numa entrevista que és de esquerda, porque não suportas o sofrimento dos outros.
Eu francamente estava a usar as palavras de outra pessoa. De um homem chamado José Mário Branco, que dizia que era de esquerda, porque não suportava o sofrimento dos outros. E apenas me limitei a imitá-lo, a referi-lo. Não expliquei na altura isso, mas felizmente aqui posso dizer. Porque de facto é difícil vivermos num mundo sabendo que há muito sofrimento. Mas muito. Estou aqui a falar e parece que sou alguma activista. Não sou. Sou uma incapaz, eu faço parte dos carneiros, mas fico mesmo triste. E por isso isolo-me. Eu quero estar em casa, no meu quintal, com os meus cães, os meus gatos. É outra forma de alienação, mas é insuportável nós estarmos sempre a tropeçar no sofrimento dos outros.

Mudando de tópico, para um não menos difícil. Temos um novo ministro da Cultura.
Que defende a tourada, que é uma coisa impensável nesta altura do campeonato para um ministro da Cultura. Se ele defende, é lá com ele, guarde em casa. Os políticos têm de começar a pensar que trabalham para os outros, e se não têm capacidade de abnegação, então se calhar têm de ir fazer outro trabalho. A classe tauromáquica tem protecções que os outros artistas não têm e subsídios que outros artistas não têm. Outros artistas? Enganei-me, eles não são artistas. Ninguém pode fazer espectáculos sobre o sofrimento alheio. E calma lá, já está mais que provado que os animais são seres cientes, e isto quer dizer que são seres que sofrem. E o especismo não pode continuar, devemos ser contra todas as formas de sofrimento dos outros seres humanos ou seres vivos. Não se pode só dizer “ah, mas eu sou LGBT activa”. Tem de ser activa contra toda a espécie de sofrimento. Não pode ser às mijas.

Vamos à Noite da Má Língua. É-te especial aquele lugar onde falam da actualidade com humor à mistura?
Somos parvos mesmo, é preciso dizê-lo com toda a frontalidade. Somos uns parvalhões. Mas acho que hoje em dia é essa a ideia. A Má Língua teve outro formato, que era televisivo, que eu acho que na altura foi engraçado, porque os políticos tinham lá o seu altar e nós, de alguma forma, ajudámos a desmistificar um bocadinho que afinal aquilo eram só pessoas que cometiam imensos erros. Oh, se cometiam.

Como é que foste convidada para o programa?
Foi o Emídio Rangel que me pediu para ir e houve ali umas alturas que foi complicado. A Júlia era a moderadora, mas o painel era constituído por homens e eles fizeram panelinha. A ideia era que eu fosse uma espécie de personagem que não conhecia os políticos e não sei quê, como se fosse a parva de serviço. Mas eu, mau feitio, disse: “Não, nem pensem.” E continuei lá sempre a querer manter a minha posição. Houve alguns dissabores, mas criaram-se amizades e depois começámos a fazer coisas muito disparatadas que nos divertiam imenso. Depois apareceu esta ideia de fazer o podcast. O problema é: como a gente não vê ninguém, pensamos que estamos em casa. Então vai disto, que amanhã não há. E é um bocado arrogante estarmos ali sempre a cagar sentenças. Às vezes saio dali a pensar: estás sempre a dizer mal do bullying, mas tu própria às vezes…

Gostava de aprofundar o humor. Fazes muitos papéis dramáticos, intensos, mas…
Eu faço o que me derem para fazer. Mas o humor está presente mesmo nessas personagens. A tragédia às vezes é muito cómica. Desde que seja feita a sério, tu podes-te rir imenso. Já fiz muitos papéis muito sérios, por exemplo um papel que gostei muito de fazer no Sangue do Meu Sangue. É uma personagem séria e trágica, uma espécie de heroína abnegada, e tem muitos momentos cómicos. E são sempre meus.

Quando trabalhas com o Canijo, e já fizeram mais de dez filmes juntos, há essa liberdade de criares o texto?
O texto é sempre meu.

Quando é que percebeste que querias ser actriz?
Eu sempre quis ser actriz, mas não sabia como é que isso se fazia. Passava a vida a pensar nisso e, porque tinha muitas ansiedades, lia imenso para me libertar e estava sempre a viver imensas vidas. E achava que aquilo devia ser muito bom, poder expor imensas vidas. E o meu pai disse: “Então podes ir para o Conservatório.” E eu: “Ó pai, o que é isso?” Eu vivia realmente no mundo da Disney. E aos 18 anos entrei no Conservatório.

Deve ter sido numa época engraçada, no início dos anos 80.
Sim. O Conservatório, na Rua dos Caetanos, era no centro, onde aconteciam as coisas. Saíamos dali e íamos para os teatros e trabalhávamos. Cheguei a fazer figuração na ópera, no Teatro São Carlos e no Teatro Nacional Dona Maria II. Conheci aqueles actores do teatro nacional, o Varela Silva, a Irene Isidro, a Fernanda Borsatti… E logo no primeiro ano, o Conservatório dizia para irmos às produtoras. Uma trabalhava com os estrangeiros, porque à época fazia-se cá cinema estrangeiro, porque era muito mais barato e eram muito bons os profissionais de cinema. A produtora era a Paisà e a minha turma foi lá dar o nome. Eu tinha vergonha de tudo e estava lá um homem que disse: “Psst, ó, tu aí.” E eu: “Ó, diacho.” Perguntou-me: “Falas francês?” E eu: “Falo.” E aquele senhor era o João Canijo, que era assistente de realização de um filme francês. E foi o primeiro filme em que entrei.

O Círculo das Paixões?
Le cercle des passions [1983], exactamente. O João depois foi assistente para um filme do Jorge Silva Melo, que quis fazer-me um teste. Eu não fazia ideia quem era o Jorge Silva Melo, ok? Eu não conhecia nada do meio, zero. Depois entrei no filme do Jorge e com quem é que contracenei? Com o Luís Miguel Cintra.

E sabias quem era o Luís Miguel Cintra?
Vagamente. Tenho de dizer com toda a franqueza. Mas sabia, porque o João [Canijo] já me tinha explicado. E depois, o Luís Miguel Cintra ia fazer a reposição de uma peça do Jean Paul Wenzel, que era a Mariana Espera Casamento, e convidou-me. Mas lá fiz esse filme, com actores extraordinários que eu também não sabia muito bem quem eram. Ganhei imenso dinheiro e até foi um bocadinho ridículo, porque nem me lembrava que era preciso receber. Veio um senhor francês, pegou num envelope, começou a tirar notas e eu perguntei se aquilo era tudo para mim. Pensei que ia ser assaltada, nunca tive tanto dinheiro na minha mão, era um maço de notas. Pronto e foi assim que começou a minha vida.

E desde então já fizeste mais de 50 filmes e séries.
Entre filmes e séries não, só filmes já são 50 e poucos.

E continuas a fazer muitas coisas ligadas à SIC, como a minissérie sobre o Marco Paulo que está quase a estrear, onde fazes de mãe dele.
Mas isso é um papel muito pequenino. Minúsculo. Foi-me pedido pela SIC e até teve graça, porque o Marco Paulo não queria que fosse eu, queria que fosse a Noémia Costa a fazer de mãe dele. Eu quando cheguei lá tive de dizer: “Olhe, desculpe lá, espero poder apesar de tudo não o envergonhar a fazer de sua mãe, mas realmente a Noémia não pode.”

[Um funcionário do hotel interrompe a entrevista para oferecer uma peça de joalharia à Rita, feita pelo próprio]

Rita Blanco
Mariana Valle Lima

Porque é que as pessoas te adoram?
Porque eu adoro as pessoas.

Só para embrulhar este assunto: que tipo de relação tens com a música do Marco Paulo?
Mas queres falar do Marco Paulo?

Pela rama.
Houve uma época que toda a gente conhecia o Marco Paulo, é impossível dizer que nunca se ouviu uma música do Marco Paulo. Eu também ouvi e ouvia-se na rádio. E eu gosto de ouvir rádio, a minha maior lacuna é nunca ter feito rádio. Gostava de fazer.

A Noite da Má Língua é quase.
É, por acaso faz lembrar um bocadinho. Mas não é. Eu gosto imenso da ideia de não me verem e não ter de me vestir e maquilhar. E estar ali a conversar e o público poder interagir e dizer o que é que li, o que é que ouvi… tenho a mania que sou educadora do povo.

Já agora, o que lês, o que ouves?
Sou muito ecléctica. Leio muito, nem sequer consigo tomar o pequeno-almoço sem estar a ler. E agora está-me a acontecer uma coisa muito esquisita. Li muitos autores consagrados, por exemplo, um que morreu há relativamente pouco tempo, o Philip Roth, que eu gostava imenso. E agora dão-me raiva, e só me apetece ler mulheres. Estou com uma resistência enorme à literatura masculina. Está errado, porque há autores maravilhosos, mas soube-me que nem ginjas quando a Annie Ernaux ganhou o Prémio Nobel, mais que merecido, uma autora inacreditável. É quase como se ela não fizesse literatura, é como se ela fosse a escrita, porque ela fala sobre si própria. De facto as mulheres são extraordinárias.

Rita Blanco
Fotografia: Mariana Valle Lima

Disseste também há pouco tempo que gostavas de passar para trás da câmara, de realizar. Há alguma história…
Há. É por causa dessa história que eu quero passar. Não é porque quero ser realizadora. Mas quando li O Retorno [2012], da Dulce Maria Cardoso, percebi que tinha que fazer aquele filme. É um passado recente que pareceu ter ficado branqueado. Os retornados, tudo o que isso implicou e o que tem a ver com o ser pessoa e ser português. As pessoas que se foram embora daqui, porque não tinham como viver em Portugal à época e foram para as nossas ex-colónias. O que aconteceu lá, o voltarem e estarem também completamente fora desta sociedade. E aquilo é o olhar de uma família sobre isso. Fiquei mesmo interessada naquele monte de pessoas que veio recambiado e gostava de perceber, filmando. Eu fiquei fascinada e, porque tenho muita sorte, a Dulce quis que fosse eu. Agora, será uma batalha hercúlea para que eu possa realizar, porque não tenho experiência de realização e é um meio complicado. Se a Dulce não desistir de mim, eu jamais desistirei disto.

Fazes 60 anos em Janeiro, é uma data redonda. Isto de querer passar para o outro lado da câmara tem a ver com pôr as coisas em perspectiva e experimentar coisas novas?
Tem, claro que tem. Tive a sorte de já ter feito papéis que me fizeram ultrapassar-me. Depois há uma altura em que pensas assim: já fizeste várias coisas, já foste a vários sítios e vais sempre buscar algum desses sítios, portanto já fizeste. E há uma altura que já não vale a pena, já estamos a chover no molhado. Isto é válido só para mim. E apetece-me fazer outras coisas, até porque depois há uma sensação também que com a idade, neste tipo de sociedade, tu vais perdendo valor. Se calhar as pessoas também já não precisam tanto de ti, ou nunca precisaram. Portanto, estás livre para ires para outros sítios.

Mas não estás muito livre.
Sim, não me estou a queixar de falta de trabalho. O que estou a dizer é: apetece-me fazer outras coisas, preciso de pensar que ainda estou viva. Há alturas em que não sei porque é que sou actriz. Estou em crise nesse sentido.

Há um desencanto?
Sim. Também já não sei para que é que serve. Para fazer mais um papel, para verem se eu faço bem? O que é que isso muda na vida das pessoas? Ou na minha? Nada. Fazer papéis é já um bocadinho ego trip. Também depende do que vais fazer. Ainda me apetece fazer uma peça com o Penim, a próxima que vamos fazer, porque sei que vamos falar sobre coisas que ainda me interessam. E trabalhar com aquelas pessoas é sempre um gosto.

Entretanto, não temos ainda a última temporada do Conta-me Como Foi, na RTP. O que se passa?
É uma história estranhíssima, faltam imensos episódios. Eles pararam, num momento que ainda por cima era uma história a desenvolver. Não percebo, não sei.

Há uns tempos disseste que no Conta-me estavam a acelerar o ritmo de filmagens e que aquilo não era uma novela, era uma série.
Aquilo primeiro foi muito bem feito pela RTP, mas como há pouco dinheiro para os episódios, as pessoas começam a trabalhar a um ritmo que não é compatível com o pormenor. E quando aquilo passou a ser produzido por outras pessoas, não havia dinheiro que chegasse para os episódios e, portanto, começou a ser feito mais dentro do esquema do que é uma novela. E produzir uma novela não é igual a produzir uma série. Tem mesmo que haver dinheiro. Se formos então ao supra-sumo da barbatana de valores, que é The Crown, dá para fazer não sei quantos filmes em Portugal durante quantos anos? Claro que o mercado não é o mesmo, mas sem ovos não se fazem omeletes.

Participaste na curta-metragem #000000, do rapper ProfJam, em 2020. Como acontece esta colaboração?
Ele, apeteceu-lhe. Havia ali umas coisas que eu achava engraçadas e depois fiquei entusiasmada – isto tudo ego trip – a pensar que há pessoas que são jovens e que ainda querem estar ao pé de mim. Por exemplo, com o Penim, estar com aquelas actrizes e actores de 23 anos e não sei quê, foi como se me tivessem feito uma transfusão de sangue. E se não fosse a minha filha não conhecia milhões de coisas. Lembro-me que uma vez, já não sei em que programa, às tantas perguntaram: “Então, assim, uma pessoa…” E eu: “Plutónio.” Porque tinha acabado de ouvir uma música do Plutónio maravilhosa, que eu me tinha fartado de chorar, eles ficaram assim: “Plutónio?” Realmente, porque é que não posso gostar do Plutónio? Isso mantém-me viva, muito mais do que ser actriz. Fico mesmo feliz quando vejo coisas a acontecerem que vão para além do meu entendimento e que me obrigam a esforçar-me para perceber. Adoro isso.

Agora queria recuar no tempo, ao Casino Royal [1990], do Herman José.
Eu adorava o Herman e uma vez fui à rádio para assistir a um programa, estava lá a Ana Bola, o Vítor de Sousa, a trupe da altura. E eles estavam a fazer um programa que ele fazia na rádio que era hilariante. Passarinhos? Tens de ver, porque eu tenho uma memória de merda [era o Rebéubéu Pardais ao Ninho]. Fiquei sentada no chão a assistir, morri a rir. E depois um dia, o Herman foi ver um espectáculo que estávamos a fazer no Clube Estefânia, do David Mamet [Perversões], que era o Miguel Guilherme, o José Pedro Gomes, a Alexandra Rosa e eu. E depois chamou o José Pedro Gomes e chamou-me a mim e começamos a trabalhar com o Herman.

Curiosamente, Casino Royal é o nome do primeiro livro do 007, escrito pelo Ian Flemming, que esteve hospedado aqui neste hotel.
Mas para mim, bem mais importante: a minha avó tinha um restaurante que se chamava Café Royal, onde foi parar um grupo de surrealistas – porque o meu pai o herdou e o meu pai estava ligado aos surrealistas. E claro que o restaurante foi à vida, o meu pai não tinha nada a ver com a restauração. Depois iam todos para lá e há um livro… não sei se é o Cesariny que fala do Café Royal e do Pepe, que era o meu pai, onde eles se encontravam.

Gostavas de fazer mais comédia?
Não penso muito nisso, se acontecer é porque vale a pena. Eu vou fazer comédia agora, penso que esse espectáculo do Penim deve ter alguma coisa a ver com comédia, não posso falar sobre isso. Mas sim, adoro fazer comédia. Adoro fazer rir.

Isso é claro como a água.
E às vezes até digo coisas horríveis, porque acho que fazem rir. Depois fico muito arrependida. Eu tenho essa coisa n’A Noite da Má Língua, que é retractar-me. Eles já fazem graça disso, porque eu digo: “Hoje, quero retractar-me, porque no outro dia disse uma coisa que não devia ter dito.” E acho que nós todos devíamos retractar-nos constantemente, relativamente a muitas coisas que fazemos.

É também importante para ti representar as mulheres portuguesas.
Sabes que eu não acredito que se possa falar de uma coisa que não se conhece. Pode-se, e se calhar é maravilhoso, porque na arte não há regras. Mas eu falo daquilo que penso que eventualmente sei um bocadinho, que é ser mulher portuguesa. Aconteceu-me muitas vezes pensar assim, mas isto só serve para mim: vou fazer um papel de uma inglesa em Inglaterra? Estão lá milhões de ingleses que vão fazer isso muito melhor do que eu. That’s for sure. Eu nasci aqui, as minhas raízes, de onde eu venho, é disso que eu quero falar.

E se alguém te convidar assim para Hollywood, só vais se a personagem for portuguesa?
Eu não posso sair de Portugal. Tenho os meus cães, os meus gatos, não dá mesmo. E não tenho grande prazer nisso. Se quando era nova tivesse feito um filme de aventuras, porque eu era muito física, a ideia de fazer uma pessoa que sobe ao tecto e não sei quê, podia ter achado piada. Agora seria um bocado difícil, porque, pronto, baixava-me e provavelmente já não me levantava. Mas era por essa brincadeira. Já me convidaram para fazer outros papéis, em geral para fazer de portuguesa, mas depois também não eram muito entusiasmantes. E a ideia de me ir embora, mata-me. Não acho piada nenhuma a estar a trabalhar lá fora. Pronto, já fiz, até já entrei num filme que ganhou um Óscar e uma Palma d’Ouro [Amour]. O papel era pequeno? Era. Mas contracenei com o Trintignant. Tudo o que pudesse preencher a ego trip, está feito. Adeus, obrigada, siga.

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