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A portrait of the director Sam Mendes
Photograph: Andy Parsons

Sam Mendes: “Não quero que o público se aperceba da câmara”

O novo filme de Sam Mendes, “1917”, é um dos favoritos na corrida aos Óscares. Falámos com o realizador, que deixou os filmes de James Bond para se dedicar à I Guerra Mundial.

Phil de Semlyen
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Phil de Semlyen
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Sam Mendes realizou os dois últimos filmes de James Bond, Skyfall e Spectre, mas não tem grande vontade de falar do novo título da série, que se estreia este ano e no qual não esteve envolvido. “Não há melhor maneira de parar de pensar nisso do que fazer um filme tão absorvente como este”, responde a dada altura, referindo-se a 1917 e voltando a centrar a conversa no seu épico de guerra, entretanto nomeado para dez Óscares. Percebe-se: o seu novo filme sobre a I Guerra Mundial foi exigente, levando-o frequentemente ao limite. É a história de dois soldados britânicos atrás das linhas inimigas (George MacKay e Dean- Charles Chapman), que parte de uma história que o avô, veterano da guerra, lhe contou. E foi filmado praticamente como dois longos planos-sequência, com as várias cenas cosidas através de cortes invisíveis.

Durante a rodagem do 1917, chegou a pensar: “Onde me fui meter...”?
Todos os dias pensava por que é que estava a fazer uma coisa daquelas a mim próprio. Mas era o argumento que, de certa forma, me obrigava a fazer o que fiz. Escrevi-o com a Krysty [Wilson-Cairns], se bem que a ideia foi minha e não queria mudar nada, portanto não havia muito a fazer. Às vezes, estava a filmar um take de sete minutos e, depois de seis minutos e meio de magia, alguém tropeçava e tínhamos de começar do princípio. Era de partir o coração. No entanto, quando corria tudo bem, era uma sensação incrível.

Tem um plano-sequência favorito no cinema?
Há um plano de Os Filhos do Homem em que o Clive Owen entra num edifício cercado, e é mesmo de cortar a respiração. O Alfonso [Cuarón] é um mestre. Olhei para esse plano uma vez durante a pré-produção, para ver se era tão bom quanto o recordava e, sim, era.

As pessoas costumam falar da sequência do carro nesse filme.
Para mim essa depende muito dos efeitos visuais... Ou melhor: é um plano espantoso, contudo não é o tipo de plano que estava a tentar filmar. No 1917, a câmara não entra num buraco da fechadura, não atravessa um vidro ou as paredes. Não quero sequer que o público se aperceba de que a câmara está lá.

O seu avô serviu de inspiração à história. O que acha que ele teria pensado do filme?
Ele era um romancista, por isso acho que se sentiria orgulhoso por um dos netos também se ter dedicado a contar histórias. Mas teria sido difícil para ele ver o 1917. Ele passou 60 anos a evitar falar do que lhe aconteceu, provavelmente por ter sido extremamente traumático. Ainda assim, tendo em conta o tipo de homem que era, acho que teria gostado do que fiz.

O filme parece beneficiar de uma pesquisa histórica meticulosa. Já o conheciam na cafetaria do Imperial War Museum [em Londres]?
É um recurso incrível, mas não passei lá muito tempo. Há uma quantidade espantosa de material impresso sobre a I Guerra Mundial. Tínhamos dois historiadores connosco e pedi-lhes para nos dizerem o que estávamos a fazer mal. Ocasionalmente, ignorava-os porque queremos que o filme ganhe vida e não satisfazer os três nerds de História na sala. Como foi ver o trailer de 007: Sem Tempo Para Morrer agora que se despediu de James Bond? Foi óptimo. Mal posso esperar para ver a versão final. Mas tenho estado completamente concentrado no meu trabalho.

Como é que os filmes do 007 e o 1917 se comparam em termos de escala?
Aprendi muito a fazer os filmes do James Bond. São produções maiores e mais dispersas: muitas vezes tens de estar a filmar num local, enquanto coordenas equipas que estão a trabalhar ao mesmo tempo noutros lugares. E mesmo quando está toda a gente num único sítio usam-se sete ou oito câmaras. Passar disso para apenas uma câmara e duas horas de filme é uma bênção.

Crítica

1917

De Sam Mendes, 119 minutos
★★★☆☆

Não faltam na história do cinema filmes rodados num único plano-sequência, ou simulando que foram feitos assim. No primeiro caso, estão Wavelenght, de Michael Snow, Timecode, de Mike Figgis, A Arca Russa, de Alexander Sokurov, ou Utoya, 22 de Julho, de Erik Poppe. No segundo, encontramos A Corda, de Alfred Hitchcock, Birdman, de Alejandro G. Iñárritu, e agora 1917, de Sam Mendes, com a novidade de a montagem que oculta os vários planos ser digital. O filme, com direcção de fotografia de Roger Deakins, não passa o tempo a chamar a atenção para o artifício técnico em que se apoia, nem a câmara a fazer malabarismos visuais para embasbacar o espectador. Mas o dispositivo formal de 1917, que esconde sem dúvida um grande e exaustivo trabalho, técnico e com os actores, apresenta-se ao serviço de uma história de fórmula (dois soldados incumbidos de uma missão aparentemente suicida, neste caso nas trincheiras da I Guerra Mundial). Após um bom arranque, as peripécias dos protagonistas vão parecendo, pouco a pouco, que se desenrolam nos níveis sucessivos de um sofisticado jogo de vídeo, e menos na realidade suja, horrenda e sangrenta das trincheiras e do campo de batalha. Eurico de Barros

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