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©Joana LindaCristina Branco

O melhor que ouvimos em Fevereiro

Fevereiro foi o mês do novo disco de Cristina Branco. E, noutra ponta do espectro, dos Sunflowers. Ouvimos esses e mais

Escrito por
Editores da Time Out Lisboa
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Comecemos pelo mais importante: o novo disco de Cristina Branco, Branco, foi o melhor que passou pelos ouvidos dos críticos da Time Out em Fevereiro. Noutra ponta do espectro melódico nacional, Castle Spell, dos Sunflowers, foi uma boa surpresa. , dos Clã, foi mais um que não desiludiu. 

Tirando isso, aproveitámos para dar a atenção merecida a uns quantos exemplares da colheita de 2017 que nos tinham passado ao lado, como Sterilize dos Unsane ou Stranger in the Alps de Phoebe Bridgers.

O melhor que ouvimos em Fevereiro

Clã - Fã

  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Foi preciso um musical para público jovem encenado por Nuno Carinhas e com texto de Regina Guimarães, estreado no Teatro Carlos Alberto em Janeiro de 2017, para se ouvirem novas canções dos Clã. Canções que são o combustível do espectáculo mas que, como este disco prova, têm ampla vida autónoma.

O corpo e a luminosidade da maioria das canções não diferem do percurso “para adultos” dos Clã (nem de Disco Voador, álbum de 2011, também com versos de Regina Guimarães, também imaginado para os mais novos). A pop-rock de “Ela Não Seria Ela” e “Super Superstição” são Clã vintage. A entrada de “A Cantigante” é irmã gémea de “Roxanne” de The Police. A melodia e cadência de “Amar e Ser Amado” regressam a “H2Omem”, tema de Lustro, o disco de 2000 cujos apontamentos exotica são repescados para a melhor canção de : “Cisne e Rouxinol” é um prodígio de coros e acordes com cheiro a mar, desvios pelo jazz e a voz da actriz Maria Quintelas, que devia pensar a sério numa carreira paralela na música.

Outros temas têm um registo mais infantil, caso de “No Baile das Bambolinas”, cujo tango vem embebido num perfume nostálgico próximo de Miguel Araújo; e de “Quem Bem Me Quer”, de novo exotica mas cuja estrutura  quebradiça mantém o ouvinte em sentido. Apenas “Fantasputo”, hip-hop gótico que parece plasticina nas mãos de um miúdo de três anos, perde o pé sem o suporte cénico, mas não rouba brilho a uma obra que sabe conversar com cabeças e corações dos sete aos 77.

Jorge Lopes 

Phoebe Bridgers - Stranger in the Alps

  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Em 2016, quando tinha lançado apenas um single (na editora de Ryan Adams), Phoebe Bridgers assegurou a primeira parte de uma tournée de Julien Baker – a escolha foi feliz, já que as cantoras partilham o registo de balada intimista e confessional sustentada por meios instrumentais mínimos e a extrema juventude (Bridgers nasceu em 1994, Baker em 1995). Mas enquanto as canções de Baker são de uma intensidade assustadora e sugam o ouvinte para um mundo de trevas eternas, as meditações de Bridgers são melancólicas mas raramente são depressivas e até têm laivos de humor ácido. A excepção neste seu álbum de estreia é “Funeral”, sobre a morte de alguém “apenas um ano mais velho”: “Quando penso demasiado sobre isso fico sem conseguir respirar”. O evento traz à superfície o demónio meridiano e, após confessar que a tristeza a acompanha desde que se conhece, Bridgers acrescenta “A noite passada desmaiei no meu carro/ E acordei na minha cama de infância/ Desejando ser outra pessoa/ E sentindo pena de mim própria”. Ainda assim, Bridgers consegue cantar estes versos sem cair na autocomiseração.

As duas canções que abrem o álbum são as suas jóias mais preciosas: a langorosa “Smoke Signals”, cujo refrão evoca pelicanos em círculos no céu sobre uma praia onde arde uma fogueira feita de lixo trazido pelas marés, enquanto o arranjo de cordas faz ascender a melodia, acima de uma vida que parece ter chegado a um beco sem saída. “Motion Sickness” é um paradigma do equilíbrio amargo/doce que Bridgers tão bem domina e o seu groove descontraído e irresistível – uma excepção num álbum dominado por baladas de inspiração folk – contrasta com a acidez e turbulência emocional da letra.

José Carlos Fernandes

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Sunflowers - Castle Spell

  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

É de discos assim que reza o melhor rock. Os Sunflowers arrancaram umas páginas da história do rock e rasgaram-nas. Castle Spell é o som de uma banda a crescer, com mais controlo e mais caos. Dez canções de dopados decibéis, assoberbadas por uma imaginação delirante. Com contos de paranóia, pânico e perseguição, usam a insanidade para se libertarem.

Carolina Brandão (bateria implacável) e Carlos Jesus (guitarra fulminante) são barulhentos e estranhos, e com orgulho absoluto nisso. São uma banda que sabe que o rock deve soar assim, com sujidade e sagacidade. Que basta uma bateria e uma guitarra, três acordes, uns berros e distorção. Quando a coisa é bem feita, suada e com vontade de encher o mundo de porrada e felicidade, não é preciso mais nada.

Ana Patrícia Silva

Unsane - Sterilize

  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Após um interregno na viragem do milénio, os nova-iorquinos Unsane regressaram em 2005 sem sinal de atenuação na ferocidade e implacabilidade que lhes tinham granjeado fama nos meios do noise e do hardcore. Sterilize, o quarto álbum da sua segunda vida, é tão demente e obstinado como o álbum de estreia, de 1991, e se há alterações a registar é no facto de a guitarra de Chris Spencer se ter tornado ainda mais venenosa.

A voz de Spencer, que tem a aspereza e acidez de quem faz diariamente gargarejos com querosene, está, como é habitual, submersa no tsunami instrumental, mas o tom vociferante, a capa ensanguentada e títulos como “The Grind” e “We’re Fucked” deixam adivinhar que as letras não versam desilusões sentimentais. Os 37 minutos de massacre sónico ininterrupto de Sterilize poderão levar alguns ouvintes a concluir que os seus autores deveriam estar internados num hospício – mas quando o inquilino da Casa Branca se classifica como “um génio estável”, quem é capaz de definir sanidade?

José Carlos Fernandes

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Cristina Branco - Branco

  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

A voz de Cristina Branco é o sonho de qualquer autor. Tem sede do infinito. Elegantemente eloquente, pura e cristalina, serpenteia na maresia das melodias e saboreia as palavras. Saber sentir o silêncio é a chave deste despojamento e a música assim se eleva. São canções bordadas com a sabedoria da simplicidade. Ouve-se a ternura com que pincela as palavras de “Eu Por Engomar” e perde-se o chão. É uma intérprete capaz de entrar em qualquer poema, de o encarnar e intensificar.

Cristina Branco sempre transformou as palavras de grandes poetas em canções, mas a cada novo disco ela larga pesos e véus. Saber ouvir é o truque, tomar o palpitante pulso da canção portuguesa e sorver as suas cores. Em Branco reuniu nomes como Sérgio Godinho, Jorge Cruz, André Henriques, Luís Severo e Filipe Sambado. Deu-lhes liberdade e eles devolveram-na, dando o seu melhor. Canta as estações da vida e as relações humanas – embriagada de amor em “Namora Comigo”, desolada na “Aula de Natação” (são três estrofes que valem por um livro). É um disco sem fado tradicional, mas o fado está lá, silenciosamente entranhado nela, eternamente seu. Está no ar que respira, na melancolia e na profundidade que abre nas palavras. E na guitarra portuguesa de Bernardo Couto que, tal como a voz, quer sempre ir mais além. Com o contrabaixo de Bernardo Moreira e o piano de Luís Figueiredo, formam um som singular. Branco é um disco precioso. Um casamento feliz entre grandes autores e uma das mais belas vozes da música portuguesa.

Ana Patrícia Silva

O melhor que ouvimos antes

  • Música

Não se passa grande coisa em Janeiro. Pelo menos do ponto de vista comercial e editorial, nos discos e não só. É, por isso, a altura perfeita para escrever e ouvir os discos que não tiveram a atenção merecida nos últimos meses do ano anterior, como por exemplo os últimos dos U2. Mas há sempre espaço, tempo e atenção extra para ouvir e escrever sobre as novidades que valem a pena, do Ephorize de CupcakKe ao Misfit de The Legendary Tigerman.

  • Música

A música portuguesa vive dias bons. Com bandas e artistas a falarem a sua língua e a produzirem canções que reflectem o país e o presente. Do indie rock português das Pega Monstro e Putas Bêbadas às batidas afromecânicas de Nídia e DJ Lycox, passando pela folk lisboeta de Éme e Luís Severo, o hip-hop de Slow J e os Orelha Negra ou o fado de Camané. Estes foram os melhores discos do ano.

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