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Portefólio: a voz do dão em imagens

Adriano Miranda e Nuno André Ferreira passaram um ano embrenhados nas vinhas do Dão. Desse trabalho resultou 'A Voz do Dão'.

Sebastião Almeida
Escrito por
Sebastião Almeida
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A sala é escura. A luz entra através de uma janela que dá brilho ao resto dos objectos ali deixados à espera que o tempo passe por eles. Ao fundo, um quadro de Jesus na parede. Um pouco abaixo, meia-dúzia de garrafões de vinho, vazios ou não, mas empoeirados, tal como os cortinados, pendurados nas ombreiras das portas, cuja cor o pó esbateu. As fitas, que atravessam o tecto da divisão, talvez prenúncio de festa, insinuam-se ali deixadas ao acaso quando a diversão acabou. Parece estar-se numa dimensão em que o tempo foi interrompido e na qual, lentamente, tudo vai ganhando vida. É assim que o fotojornalista Nuno André Ferreira, um dos autores de A Voz do Dão – O diálogo da uva e do vinho, descreve a carga da fotografia que abre o livro pensado e executado em conjunto com Adriano Miranda, fotojornalista do Público. Trata-se de um trabalho sobre a região, o seu vinho, e que oferece “um olhar imersivo sobre o seu processo e gentes que deixa a descoberto os seus mais íntimos segredos”.

Durante praticamente um ano, entre Setembro de 2019 e Outubro de 2020, os dois fotógrafos levaram a cabo um trabalho com muita ponderação e serenidade. “Quando o Nuno me lançou o repto, disse que aceitava mas com uma condição. Que fôssemos não só às grandes adegas, aos grandes enólogos e nomes da indústria, mas também aos pequenos produtores que fazem vinho para a família, amigos, e que têm o lagar todo em pedra na adega”, conta Adriano Miranda. A verdade é que a região no Centro do país, rodeada por serras e com uma paisagem granítica, montanhosa, foi alvo de algum esquecimento em matéria vínica, mas está a renascer das cinzas. "Fotografámos aquilo que de mais genuíno encontrámos. E percebemos que a alma do vinho do Dão está nas pessoas que a ele se dedicam”, complementa Nuno André Ferreira, que habita na região.

Adriano Miranda “quis fugir à lógica de ser fotojornalista” e distanciou-se do método fotográfico que aplica no trabalho do seu dia-a-dia. Decidiu fazer retratos em médio formato. “Foi essa a minha aposta, retratar as pessoas que trabalham no Dão”, afirma. As imagens são despojadas de futilidade. Nelas só se encontra os rostos daquelas gentes humildes, as mãos gastas, a pele batida pelo sol ou o orgulho de envergar os trajes típicos da região. Histórias, há muitas, diz-nos. Afinal, “tudo foi muito para além do acto de fotografar”. “Cada vez que entrávamos numa adega, estávamos lá muito tempo. Não sou sociólogo, mas vê-se muito a realidade portuguesa: o assalariado, a diferença de salário entre homem e mulher, apesar de o trabalho ser praticamente o mesmo, a mulher a ficar em casa para fazer o almoço para quem está a vindimar.” Por outro lado, também descobriu uma nova geração que anda na escola ou na universidade, que participa na produção do vinho por influência da tradição familiar ou porque quer fazer (re)nascer um negócio. Gente teimosa, que tem um grande amor à tradição, portanto.

“O Dão é tão peculiar. Não andámos atrás dos enólogos com o copo no ar ou dos grandes senhores e das grandes mansões”, deixa claro Nuno André Ferreira. Foram, sim, perceber as várias fases do vinho. O fotógrafo, que vive em Viseu, ali perto, seguiu a abordagem fotográfica contrária à de Adriano Miranda. “Tentei capturar o que acontecia, os momentos de refeições. Queria o que acontecia de forma espontânea”, detalha. “A minha é uma fotografia mais estática, mais pausada, e a dele é mais dinâmica”, afirma Adriano Miranda. E é por isso que se encontra no livro “essa dicotomia entre uma fotografia frenética e outra mais relaxada”. Nuno André Ferreira concorda.

Depois de visitarem mais de uma centena de adegas, depois de mais horas do que é possível contabilizar nas vinhas com quem torna tudo possível, das refeições após a vindima, a conhecer os produtores que fazem 300 ou 30 mil litros, o sentimento é que “há espaço para todos”. “O vinho do Dão não está esquecido, falta dar-lhe apenas um pouco de força”, acredita Nuno André Ferreira. Com este trabalho, os fotógrafos que anteriormente publicaram um livro sobre os terríveis incêndios de 15 de Outubro de 2017, querem cativar as pessoas e mostrar como o vinho é feito. Acima de tudo, que se perceba a genuinidade e o romantismo de tudo. Eles são a voz do Dão – de uma região em que a modernidade se cruza com a tradição, mas onde a ruralidade está sempre por perto. Basta querer encontrá-la.

A voz do Dão – O diálogo da uva e do vinho.
Edição dos autores, pp. 272. 30€ (à venda nas lojas Fnac, em todo o país).

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Quando os médicos que conduziam o parto o chamaram para tirar a fotografia, avisaram-no logo: “Se quiser, tem de ser agora”. Até então sentado numa cadeirinha ao lado da mulher, Miguel Madeira teve somente tempo para se levantar, subir a câmara ao rosto, e disparar. “Foi como se estivesse a trabalhar. Estava apenas a garantir que a imagem ficava bem feita, como se fosse o parto de outra criança”, recorda sobre o momento em que registou os primeiros segundos de vida da filha, na manhã de 22 de Abril. Só depois dos primeiros gritos da recém-nascida ecoarem nas paredes da sala de parto entendeu verdadeiramente o que se passava. “Foi aí que senti um baque. Depois de tirar a câmara do olho fui-me abaixo”. Contou-lhe os dedinhos minguados, como as mães ensinavam. E chorou.

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