A Time Out na sua caixa de entrada

Procurar
Cravo
©DRCravo construído em 1728 por Christian Zell e restaurado em 1973 por Martin Skowronek

Dez compositores alemães de música para cravo

Está sem ideias para ocupar o tempo? A Time In propõe a descoberta de instrumentos menos conhecidos do universo clássico

Escrito por
José Carlos Fernandes
Publicidade

O problema do cravo não é tanto ser um instrumento obscuro ou uma raridade, é que muitas pessoas não apreciem a sua sonoridade, talvez por estarem habituadas ao som redondo e cheio dos modernos pianos. Mas o cravo não é um piano raquítico ou um piano primitivo, é um instrumento maduro, perfeitamente desenvolvido, altamente sofisticado e com personalidade própria e o seu timbre não é nem mais nem menos agradável do que o do piano, é apenas diferente. Apenas teve o infortúnio de ser posto de parte porque tem um volume sonoro demasiado fraco para grandes salas de concertos, um problema que não se põe na escuta caseira das melhores obras de compositores alemães.

Recomendado: Os concertos de música clássica não param e são para ver na sua sala

Dez compositores alemães de música para cravo

Johann Jakob Froberger (1616-1667)

Froberger foi o primeiro compositor proeminente de obras para cravo a surgir na Alemanha. Nasceu em Stuttgart, numa família de músicos – cinco anos depois, o seu pai, Basilius, ascenderia ao posto de mestre de capela da corte de Württemberg. Johann Jakob não teria oportunidade de fazer carreira em Stuttgart, já que a Guerra dos Trinta Anos levou, pouco depois, à dissolução da orquestra da corte – o jovem cravista tornar-se-ia, em 1637, organista da capela imperial, em Viena, mas não tardou em obter uma licença a fim de prosseguir os estudos em Roma, com Girolamo Frescobaldi, então o expoente máximo da música para tecla. Seria a primeira das muitas viagens que marcaram a vida de Froberger, cuja fama crescente como virtuoso das teclas e compositor o levou a Bruxelas, Londres e Paris, bem como a todo o mundo germânico.

Embora tenha regressado, intermitentemente, ao serviço da corte imperial de Viena, Froberger passou os últimos anos de vida afastado da vida agitada e cosmopolita que conhecera, desempenhando a função de professor de cravo da duquesa de Württemberg-Montbéliard, em Héricourt (que então fazia parte das possessões da casa de Württemberg e é hoje território francês). Toda a obra de Froberger foi consagrada ao cravo.

[“Lamento sopra la Dolorosa Perdita della Real M.sta di Ferdinando IV Rè de Romani”, por Marco Mencoboni, Palazzo Honorati Carotti, Jesi, Itália. A obra foi composta em 1654 em Viena, em homenagem a Fernando IV, Sacro Imperador Romano, que Froberger conhecia pessoalmente, e que falecera nesse ano, com apenas 21 anos]

Georg Muffat (1653-1704)

A vida de Georg Muffat cruzou demasiadas fronteiras para que se lhe possa atribuir univocamente uma nacionalidade, mas costuma ser arrolado nos compositores germânicos, por ter desenvolvido a maior parte da carreira em território germanófono. Nasceu em Megève, no Ducado de Sabóia (hoje em França), de pai de origem escocesa; estudou em Paris, foi organista em Molsheim e Sélestat (na Alsácia), estudou Direito em Ingolstadt (Áustria), passou por Viena e pela Boémia e acabou por obter um posto permanente como organista do príncipe-arcebispo de Salzburg (Áustria), tendo, em 1682, obtido deste uma licença para viajar até Itália, onde estudou com Bernardo Pasquini, discípulo de Frescobaldi. Em 1690 tornou-se mestre de capela do príncipe-arcebispo de Passau (Baviera), onde ficaria até ao fim da vida. Deixou alguns concerti grossi e música para tecla, tendo-se perdido três óperas.

[Passacaglia , da colecção Apparatus Musico-Organisticus (1690), por Andreas Staier, ao vivo no Festival Lavaux Classic, Suíça, 2011]

Publicidade

Johann Kuhnau (1660-1722)

Kuhnau nasceu em Geising e foi menino de coro em Dresden, então um dos principais centros musicais da Alemanha. A peste que atingiu a cidade em 1680 fê-lo prosseguir os estudos musicais em Zittau, onde assumiu, interinamente, o posto de mestre de capela, antes de seguir para Leipzig, onde estudou Direito, o que não o impediu de continuar a dedicar-se à música. Em 1684 foi nomeado organista da Thomaskirche (Igreja de S. Tomé) de Leipzig, exercendo, em simultâneo, a advocacia e dedicando-se à escrita e à tradução.

Das quatro colecções de música para tecla que publicou, a que lhe trouxe mais fama foi a quarta, intitulada Musikalische Vorstellung Einiger Biblischer Historien (1700), que ficou conhecida como Sonatas Bíblicas (Biblische Sonaten) e que representa musicalmente episódios célebres da Bíblia.

Em 1701, Kuhnau sucedeu a Johann Schelle como Kantor da Thomaskirche, o mais alto cargo na vida musical de Leipzig. Ocupá-lo-ia até à morte, ainda que nos últimos anos de vida pouco tivesse produzido, devido ao declínio da saúde. O seu sucessor no posto foi Johann Sebastian Bach.

[Sonata n.º 1 (“A Luta Entre David e Golias”), das Sonatas Bíblicas, por Anikó Horváth (Hungaroton)]

Georg Böhm (1661-1733)

Nasceu em Hohenkirchen, de um pai organista, que foi o seu primeiro professor. Quando o pai faleceu, tinha Georg 14 anos, prosseguiu os estudos musicais nas cidades de Goldbach e Gotha, onde foi aluno de membros da família Bach, que eram omnipresentes na música que se fazia na região da Turíngia. Após estudos na universidade de Iena, perde-se o seu rasto, que só volta a surgir em 1693, em Hamburgo, onde terá ficado até, que, em 1698, sucedeu a Christian Flor no cargo de organista na Johanneskirche de Lüneburg, que ocupou até à morte. Deixou 11 suítes para cravo, música para órgão e uma dezena de peças de música sacra e é possível que tenha imprimido uma marca relevante em Johann Sebastian Bach, que, quando tinha 15-17 anos (entre 1700 e 1702), foi seu aluno na Michaelsschule de Lüneburg.

[Suíte n.º 8, por Gustav Leonhardt num cravo construído em 1962 por Martin Skowronek, a partir de um original de J.D. Dulcken, construído em 1745 em Antuérpia]

Publicidade

Johann Mattheson (1681-1764)

Johann Mattheson, filho de um abastado cobrador de impostos, teve educação esmerada e revelou-se homem de múltiplos talentos: tocava violino, cravo e órgão, cantava e compunha. Estreou-se aos 15 anos na ópera da sua cidade natal de Hamburgo, interpretando papéis femininos. Quando a voz mudou (naquela época, o desenvolvimento dos adolescentes era mais lento), passou a desempenhar papéis de tenor, além de compor óperas, ensaiar e dirigir récitas. Desempenhou cargos diplomáticos, foi mestre de capela da Marienkirche de Hamburgo (1718-1728) e do duque de Holstein (1729) e quando a surdez crescente o impediu de desempenhar tais funções, passou a escrever sobre teoria musical e elaborou uma recolha biográfica sobre os músicos alemães do seu tempo. Compôs seis óperas, 26 oratórias e Paixões e 12 suítes para cravo.

[I andamento (Prelúdio) da Suíte n.º 1, por Cristiano Holtz (Ramée)]

Christoph Graupner (1683-1760)

Graupner nasceu em Kirchberg e teve como primeiro professor o seu tio. Em Leipzig estudou Direito na universidade e música com Kuhnau. Deixou a cidade em 1705 para ser cravista na Ópera de Hamburgo, onde foi colega de um muito jovem Georg Friedrich Händel. Em 1709, tornou-se músico da orquestra da corte de Hesse-Darmstadt, ascendendo a mestre de capela dois anos depois. Mas quando, em 1722, vagou o cargo de Kantor da Thomaskirche de Leipzig, por falecimento do seu antigo professor Johann Kuhnau, candidatou-se ao lugar – os outros candidatos eram Johann Sebastian Bach e Georg Philipp Telemann. Telemann era quem, à data, desfrutava de maior prestígio e o lugar estar-lhe-ia destinado; porém, Telemann só entrara no concurso como forma de pressionar o seu empregador de Hamburgo a dar-lhe mais liberdade e, tendo obtido o que pretendia, retirou-se do concurso. Graupner era a segunda escolha do conselho municipal de Leipzig, mas o seu “patrão”, Ernst-Ludwig de Hesse-Darmstadt não o libertou do contrato, pelo que o lugar acabou por ficar para Bach.

Graupner era bastante prestigiado no seu tempo e deixou uma obra vastíssima – chegaram aos nossos dias 1400 cantatas, 113 sinfonias, 44 concertos e 123 peças para cravo (66 sonatas e 57 partitas) – mas hoje só é lembrado por este concurso que envolveu Bach.

[IX andamento (Chaconne) da Partita G.149, por Naoko Akutagawa (Naxos)]

Publicidade

Johann Sebastian Bach (1685-1750)

Nasceu em Eisenach, numa família com longa tradição musical, cujos vários ramos ocupavam cargos em várias igrejas e cortes da Turíngia. O seu pai, Ambrosius, que também era músico, faleceu quando ele tinha dez anos, pelo que foi viver com o irmão mais velho, Johann Christoph, que era organista em Ohrdruf e o instruiu na arte do teclado. Após ter estudado na Michaelsschule de Lüneburg (1700-02), assumiu, sucessivamente, os postos de organista na Igreja Nova de Arnstadt (1703-1707) e na Igreja de São Blásio (Divi Blasii) de Mühlhausen (1707-08), de mestre de capela nas cortes de Weimar (1708-17) e de Köthen (1717-23). Em 1723, tornou-se Thomaskantor, ou seja, director musical da Thomaskirch (Igreja de S. Tomé), em Leipzig, cargo que ocuparia até à morte.

A música para cravo representa uma fracção substancial da sua vasta e variada obra e inclui, entre as peças mais importantes, os dois volumes de O Cravo Bem Temperado (Das Wolhtemperiert Klavier), as Variações Goldberg, as seis Suítes Inglesas, as seis Suítes Francesas, as seis Partitas, as Invenções e Sinfonias e várias obras “avulsas”.

[Concerto Italiano BWV 971, por Céline Frisch]

Gottlieb Muffat (1690-1770)

Filho de Georg Muffat. Nasceu em Passau e fez toda a carreira em Viena, onde, aos 21 anos foi admitido como assistente de Johann Joseph Fux, mestre de capela da corte imperial; mais tarde tornou-se professor de música da família real. Na Hofkapelle (a capela imperial), começou como terceiro organista em 1717, ascendeu a segundo em 1729 e a primeiro em 1741, quando a sua ex-aluna Maria Teresa se tornou imperatriz.

Compôs exclusivamente para o teclado. Entre as suas obras mais importantes está a colecção Componimenti Musicali per il Cembalo (c.1736).

[Capriccio XXII, por Lydia Martia Blank, num registo de 2104]

Publicidade

Wilhelm Friedemann Bach (1710-1784)

O filho mais velho de Johann Sebastian nasceu em Weimar e teve por professor de música e de cravo o pai, que compôs várias peças expressamente para a sua aprendizagem, (que foram reunidas no Clavier-Büchlein). Estudou Direito na Universidade de Leipzig, que trocaria depois pela Universidade de Halle. Em 1733, suplantou com facilidade os outros candidatos ao cargo de organista da Sophienkirche de Dresden, onde ficou até 1746, quando se transferiu para idêntico cargo na Liebfrauenkirche de Halle. Tendo entrado em atrito com o Kantor da Liebfrauenkirche, candidatou-se a outros postos, mas acabou por resignar ao cargo em Halle sem ter assegurado outra nomeação – não voltaria a obter uma até ao fim da vida, passada em Braunschweig e Berlim, diz-se que por não ser de trato fácil.

O grosso da sua obra destina-se ao cravo e inclui 15 sonatas, 40 polonaises e várias fantasias e fugas, bem como seis concertos (um deles para dois cravos).

[I andamento (Un poco allegro) da Sonata Fk.6a, por Julia Brown (Naxos)]

Carl Philipp Emanuel Bach (1714-1788)

Carl Philipp Emanuel Bach, nascido em Weimar, foi o mais famoso dos quatro filhos de Johann Sebastian que seguiram carreira musical. Tal como o irmão mais velho, teve o pai como professor e tornou-se num exímio cravista, tendo sido nessa qualidade que, em 1738, mal terminou o curso de Direito na Universidade de Leipzig, entrou ao serviço do príncipe Frederico da Prússia, que viria a subir ao trono dois anos depois como Frederico II (ficando conhecido como Frederico o Grande). C.P.E. Bach ficou na corte de Berlim até 1768, rumando depois para Hamburgo, onde tomou o lugar do seu falecido padrinho, Telemann, e aí ficou até ao fim da vida.

A maior parte da sua obra foi consagrada ao cravo, para o qual compôs mais de meia centena de concertos e três centenas de peças a solo, metade das quais sonatas, entre as quais se distinguem as seis Sonatas Prussianas (1742) e as seis Sonatas de Württemberg (1744). Algumas das peças foram compostas expressamente para músicos amadores (embora o conceito de “amador” do século XVIII implique um nível de proficiência bem acima do entendimento que hoje temos da expressão). Entre elas estão as Six Sonates pour le Clavecin à l’Usage des Dames e seis colecções de Clavier Sonaten für Kenner und Liebhaber (“para conhecedores e amadores”). Publicou também um influente tratado intitulado A Verdadeira Arte de Tocar Instrumentos de Tecla (Versuch Über die Wahre Art das Clavier zu Spielen), surgido em 1753 e reeditado em forma revista e aumentada em 1786, ao qual apensou uma parte prática, consistindo em “18 lições em seis sonatas”, complementadas por mais seis sonatinas (em duas sonatas) em 1786.

[Sonatina Wq.63/9 (e não 63/3, como surge indicado), de A Verdadeira Arte de Tocar Instrumentos de Tecla, por Cristiano Holtz, numa cópia de um cravo G. Silbermann de 1740 realizada por Matthias Kramer em 2010]

Clássicos da clássica

Oito sonatas para piano de Beethoven que precisa de ouvir
  • Música
  • Clássica e ópera

Em 1792, o Conde Ferdinand von Waldstein, um dos principais mecenas de Beethoven, despediu-se deste, que tinha então 22 anos e deixava a sua cidade natal Bona para ir estudar em Viena, com uma recomendação: “Através de inabalável diligência, recebereis o espírito de Mozart das mãos de Haydn”. Mozart terá sido o modelo de Beethoven na juventude. Já as aulas que teve com Haydn parecem ter sido pouco profícuas. Mas se Beethoven começou por ter Mozart como modelo, em breve desenvolveu uma voz própria.

  • Música
  • Clássica e ópera

Wolfgang Amadeus Mozart legou-nos abundante produção para solista e orquestra, antes de mais para o seu instrumento de eleição, o piano, para o qual compôs 27 concertos, a maior parte destinados a servir de veículo ao seu virtuosismo no instrumento. Mas a criatividade de Mozart foi também posta ao serviço de instrumentos como o violino, o clarinete, a trompa, o oboé ou o fagote, e até mesmo a flauta, um instrumento com o qual embirrava.

Publicidade
  • Música
  • Clássica e ópera

Franz Liszt começou a aprender piano aos sete anos, aos nove já se apresentava em concertos públicos e aos 12 publicou a sua primeira obra, numa colecção em que surgia ao lado de Beethoven e Schubert. Tornou-se num dos maiores virtuosos do piano de todos os tempos e percorreu a Europa em frenéticas tournées, suscitando uma idolatria similar à das estrelas rock de hoje e fazendo palpitar muitos corações femininos com as longas melenas e a pose estudada para causar sensação.

Recomendado
    Também poderá gostar
    Também poderá gostar
    Publicidade