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Gisela João
© João SaramagoGisela João

Gisela João: “O crescimento da direita radical traz uma maior urgência ao que quero fazer”

Gisela canta Abril no programa Sons de Liberdade, do Teatro Tivoli BBVA, no dia 25. Falámos com os três convidados deste ciclo sobre música e protesto.

Luís Filipe Rodrigues
Escrito por
Luís Filipe Rodrigues
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Gisela João (1983) já tinha decidido passar o resto do ano a cantar Abril”. Mas o que era para ser uma celebração dos 50 anos da revolução, depois dos resultados das últimas eleições legislativas e do crescimento de forças e discursos reaccionários no espaço público, ganhou outra importância. Reconhece que, agora, tem uma maior responsabilidade. Mas, a poucos dias de se atirar a este repertório no programa Sons da Liberdade do Teatro Tivoli BBVA, não parece muito preocupada.

A fadista é uma de três artistas – a par de JP Simões e B Fachada – que a organização convidou para revisitar canções de protesto e outras de autores que associamos à revolução de 25 de Abril. A Time Out desafiou-os a responderem exactamente às mesmas perguntas sobre este repertório, os seus significados e peso. E a umas poucas questões mais específicas sobre estes concertos.

Cinquenta anos depois do fim da ditadura, as pessoas continuam a rever-se nas canções de protesto da época. Porquê?
As canções de protesto da época da ditadura ainda fazem tanto sucesso porque são como crónicas da nossa história. Elas contam as lutas, as dores e as vitórias de um povo que se recusou a ficar calado. É uma energia que, felizmente, continua a mover muita gente.

O que achas apelativo nelas?
O que acho mesmo fixe nessas canções é a autenticidade. São como uma bofetada de verdade na cara, sem rodeios nem floreados. É música que vem do coração, directa para a alma.

Porque é que voltamos sempre a essas canções, mas nunca recordamos a música de protesto de décadas posteriores?
Acho que o segredo é que essas canções da ditadura estão entranhadas na nossa identidade, fazem parte do nosso ADN. Mas não sei se é justo dizermos que não recordamos música de protesto de décadas posteriores. Alguns artistas, como a Capicua, com quem colaborei na “Casa da Mariquinhas” e na “Hostel da Mariquinhas”, criaram um cancioneiro muito importante também.

A entronização das canções de protesto da década 70, e a nostalgia por elas, acaba por ser entrave à actualização deste repertório?
Acho que não é entrave. A nostalgia até pode ser uma coisa boa, viva. Em vez de ser vista dessa forma estática de algo que nos prende ao passado, é algo que nos traça um caminho de memória muito vivo. É importante trazer esse espírito de protesto para os dias de hoje, com novas músicas que reflitam as nossas batalhas actuais.

Nas décadas de 60 e 70, os músicos acreditavam que estas canções podiam forçar uma mudança de regime. Algum músico acredita nisso hoje?
O mundo não se muda num movimento só… Acredito no poder da música para unir, emocionar e mover as pessoas, e dar voz a causas importantes.

Essa descrença é um reflexo da derrota e da desesperança das pessoas de esquerda?
Não acho que seja derrota e desesperança, mas sim uma mudança de perspectiva. As lutas agora são diferentes, e a música também acompanha isso.

Pode o crescimento da reacção e de um partido como o Chega revigorar a canção de protesto contemporânea e engajar mais os artistas?
Com certeza! O crescimento da reacção mostra que ainda há muito para lutar, e a música pode ser uma arma poderosa nessa batalha.

Por que vais passar o resto do ano a tocar este espectáculo que celebra o 25 de Abril?
Porque o 25 de Abril é uma data que não podemos esquecer. É uma homenagem à liberdade, à coragem dos que lutaram e uma forma de manter viva a chama da revolução.

O crescimento da direita radical, nas ruas e no Parlamento, pesou nessa decisão?
A decisão de fazer este espectáculo estava tomada antes destes eventos mais recentes. Claro que o crescimento da direita radical traz uma maior urgência e maior responsabilidade ao que quero aqui fazer.

Quais são os autores que integram o repertório destes concertos?
Tantos! Zeca Afonso, Sérgio Godinho, Fausto... são os mestres da resistência, as vozes que nos inspiram a nunca baixar os braços.

Vais estar acompanhada pelo guitarrista Carles Rodenas Martinez. O que te levou a convidar um espanhol para cantar canções tão portuguesas?
Convidei o Carles e o Luís Pereira para me acompanhar porque os acho artistas de uma sensibilidade incrível, capazes de fazer reviver estas músicas com a força e a beleza que merecem. A ideia de convidar o Carles surgiu em Valência, num período que passei a estudar lá. Mostrei-lhe algumas destas músicas numa conversa em que estávamos a falar do nosso cancioneiro, e ele adorou-as. O Carles é um artista incrível. A música não tem fronteiras, e ter um espanhol a tocar estas músicas portuguesas só mostra como a arte pode unir o mundo.

Teatro Tivoli BBVA. 25 Abr (Qui). 21.00. 15€-25€

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