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Wes Montgomery
©DRWes Montgomery

Dez versões de “Insensatez”

Está longe de ser tão conhecida quanto “Garota de Ipanema”, mas é uma das grandes canções de Jobim. Eis algumas versões memoráveis.

Escrito por
José Carlos Fernandes
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O Rio de Janeiro da década de 1960 e a Paris da década de 1830 poderão parecer muito distantes em termos de estilo e ambiente musical, mas há algumas semelhanças entre a canção “Insensatez”, escrita em 1961 por Antônio Carlos Jobim (música) e Vinicius de Moraes (letra), e o Prelúdio op.28 n.º 4 de Frédéric Chopin (que, na verdade, poderá ter sido composto não em Paris mas em Maiorca, durante o tempo que Chopin aí passou no Inverno de 1838-39). A semelhança é obscurecida pelo ritmo típico da bossa nova, mas é impossível de ignorar – mas, como disse o guitarrista Laurindo Almeida, ao realçar a proximidade entre as duas peças, “se se copiar de uma fonte, é plágio; se se copiar de mais do que uma fonte, é pesquisa”. Para quem queira avaliar semelhanças e diferenças, aqui está a fonte de inspiração, que poderá ser cotejada com as versões de “Insensatez” que se seguem.

[Prelúdio op.28 n.º 4 de Frédéric Chopin, por Martha Argerich, gravação de 1975]

A canção teve versão inglesa por Norman Gimbel (o “tradutor” de “Garota de Ipanema” e “Meditação”) e acabou convertida em “How Insensitive”. O título é um completo absurdo, já que significa “que insensível”, mas a verdade é o que nada restou dos versos de Vinicius – Gimbel pura e simplesmente escreveu uma letra nova.

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Dez versões de “Insensatez”

João Gilberto

Ano de gravação: 1961
Álbum: João Gilberto (Odeon)

Mais uma vez, foi João Gilberto o primeiro a gravar este clássico da bossa nova – surgiu no seu 3.º álbum, que, como os anteriores, teve arranjos de Antônio Carlos Jobim.

Stan Getz & Luiz Bonfá

Ano de gravação: 1963
Álbum: Jazz Samba Encore! (Verve)

Jazz Samba Encore! retoma o título do disco que, em 1962, desencadeara a febre da bossa nova, Jazz Samba (ver 10 versões de “Desafinado” e 10 versões de “Samba de Uma Nota Só”), mas em vez de ter por parceiro Charlie Byrd, em Fevereiro de 1963 o saxofonista Stan Getz associou-se ao guitarrista brasileiro Luiz Bonfá, um nome crucial do samba-canção (género precursor da bossa nova) e da bossa nova. Bonfá fora autor do clássico “Manhã de Carnaval” e contribuíra, com Tom Jobim, para a banda sonora do filme Orfeu Negro (1959), realizado por Marcel Camus, e fora homenageado por João Gilberto na canção “Um Abraço no Bonfá”. Bonfá agradeceu a Getz o papel desempenhado na difusão da bossa nova com “Um Abração no Getz”, que faz parte do alinhamento de Jazz Samba Encore!, inteiramente preenchido com composições de Bonfá e de Tom Jobim. O disco tem a participação, em cinco faixas, da cantora brasileira Maria Toledo, que assina uma tocante versão de “Insensatez”. Maria Toledo (que não deverá ser confundida com a cantora de flamenco homónima) era, à data casada, com Bonfá e teve uma carreira musical breve e discreta.

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Sylvia Telles

Ano de gravação: 1963
Álbum: Bossa, Balanço, Balada (Elenco)

A morte precoce da cantora Sylvia Telles, aos 32 anos, em 1966, num acidente de viação em Maricá, ajuda a explicar o facto de não ser tão conhecida quanto mereceria.

Telles gravou o seu primeiro álbum em 1957, esteve associada ao Grupo Universitário Hebraico (que esteve na génese da bossa nova) e foi das primeiras intérpretes das canções de Jobim. Em 1961 fez uma tournée pelos EUA e gravou o álbum Sylvia Telles USA (Philips), e em 1966, surgiu The Music of Mr. Jobim by Sylvia Telles (Elenco). A intensa e dramática versão de “Insensatez” incluída em Bossa, Balanço, Balada basta para perceber o seu tremendo talento.

Peggy Lee

Ano de gravação: 1963
Álbum: In Love Again! (Capitol)

Em Março e Dezembro de 1963, Peggy Lee gravou, com orquestra arranjada por Dick Hazard, Bill Holman ou Shorty Rogers, o álbum In Love Again!, que fecha com “How Insensitive”. Encerrar com uma canção cujo assunto é (pelo menos na versão inglesa) o doloroso fim de um relacionamento amoroso um álbum cujo título proclama o contrário é completamente incongruente, mas a versão de Lee é superlativa.

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Doris Day

Ano de gravação: 1964
Álbum: Latin For Lovers (Columbia)

No início dos anos 60 não havia nenhuma cantora que não fizesse um álbum “latino” e Doris Day não foi excepção. Nem tudo é ouro – passar-se-ia bem sim “Quizás, Quizás, Quizás” (transformada em “Perhaps, Perhaps, Perhaps”) – mas as quatro canções de Antônio Carlos Jobim valem bem a pena, sobretudo “Insensatez”, que conhece aqui uma das suas leituras mais pungentes.

Astrud Gilberto

Ano de gravação: 1965
Álbum: The Astrud Gilberto Album (Verve)

Astrud Gilberto nunca tinha cantado (profissionalmente) antes de, em Março de 1963, ter sido convencida a fazê-lo em duas canções do álbum Getz/Gilberto. Em 1964, quando foi gravado Getz Au Go Go (ver 10 versões de “Corcovado”), Astrud já ganhara alguma confiança e aprendera a fazer uso da sua voz frágil, mas de uma frescura, contenção e ingenuidade muito adequadas à bossa nova. Em Janeiro de 1965 estreou-se a gravar para a Verve em nome próprio, com programa integralmente preenchido com canções de autores brasileiros (sobretudo Jobim), mas cantadas, por imposições de mercado, em inglês. A equipa que gravou este álbum de estreia incluiu João Gilberto, Tom Jobim, Bud Shank (saxofone, um dos pioneiros da fusão jazz/samba), João Donato (piano) e uma orquestra de cordas, arranjada e dirigida por Marty Paich.

As notas de capa faziam questão de notar que “Astrud provém de uma área do Rio de Janeiro que fica muito perto da praia de Ipanema”.

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Wes Montgomery

Ano de gravação: 1966
Álbum: Tequila (Verve)

Apesar do título deste álbum do guitarrista Wes Montgomery, “Tequila” e “Insensatez” são as suas únicas faixas de sabor latino. O disco reparte-se entre peças em ambiente de jam session, com o seu quarteto – Ron Carter (contrabaixo), Grady Tate (bateria) e Ray Barretto (congas) – e faixas mais suaves e opulentas, com acompanhamento de cordas (arranjadas por Claus Ogerman). “Insensatez” faz parte das segundas.

Frank Sinatra & Antônio Carlos Jobim

Ano de gravação: 1967
Álbum: Francis Albert Sinatra & Antônio Carlos Jobim (Reprise)

“Insensatez” é mais uma das pérolas do encontro entre Sinatra e Jobim em 1967. Jobim apenas canta dois versos e Sinatra mostra o seu génio impregnando cada palavra de desolação e tristeza.

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Charlie Byrd

Ano de gravação: 1967
Álbum: More Brazilian Byrd (Columbia)

Antes de ter sido parceiro de Stan Getz no seminal Jazz Samba (1962), já o guitarrista Charlie Byrd assumira – ainda que com pouco sucesso – o papel de embaixador da música brasileira, e, em particular, da bossa nova, no álbum Everybody’s Doin’ the Bossa Nova (1960, Riverside). Não mais deixaria de o fazer e a sua discografia está pontilhada de álbuns que o atestam, como More Brazilian Byrd (a “continuação” de Brazilian Byrd, de 1966), com arranjos de Tom Newsom.

Ahmad Jamal

Ano de gravação: 1968
Álbum: Ahmad Jamal at the Top: Poinciana Revisited (Impulse!)

O pianista Ahmad Jamal ganhara nome nos anos 50 pelo seu estilo sereno, contido e depurado, que muito terá influenciado Miles Davis, mas no final dos anos 60 registou esta versão impetuosa (e, no final, até tempestuosa) e (quase) completamente expurgada de melancolia de “Insensatez”, ao vivo no clube The Village Gate, em Nova Iorque, com Jamil Sulieman (contrabaixo) e Frank Gant (bateria).

O melhor da bossa nova (em versões)

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