Joana Barrios, Gambrinus, Delicia, Sopeira
©Gabriell VieiraJoana Barrios
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Joana Barrios: “A sopa é fixe”

Ou sim ou sopas? Para Joana Barrios sim e sopas. À mesa connosco, a “sopeira” falou do novo livro de receitas e da marca de comida que saiu agora do forno.

Cláudia Lima Carvalho
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Que atire a primeira pedra quem nunca disse em algum momento: “O quê, vais comer só sopa?” Assim, naquele tom que sabemos exactamente como soa, desvalorizando o rico caldo. No dia em que encontramos Joana Barrios para o que desejaríamos ter sido um rali de sopas por Lisboa, ouvimo-lo mais do que uma vez. Sem julgamento, parece-nos. Talvez só preocupação, como quem quer saber: e isso chega? “É aquela concepção de que sopa é poucochinho, é pobrezinho, é uns legumes com uma água. E não, a sopa pode ser um universo infinito de possibilidades”, diz-nos a mulher dos mil afazeres, que acaba de editar o seu terceiro livro de receitas, este dedicado inteiramente às sopas. A ideia para Sopeira nasceu precisamente desse lugar de desdém. Mas sem qualquer presunção. “A sopa é fixe” – é o statement. E fica difícil não acreditar quando é ela que o diz.

“A sopa tem muitas vantagens. Para já, tem essa vantagem de ser [uma refeição] super-rápida. Fica tratado, não tens de te chatear mais. Depois, é saudável, nutritiva, tem poucas calorias e ajuda-te a cumprir aquelas metas dos legumes. É uma forma muito fixe de resolver a alimentação”, conta-nos à mesa do Gambrinus, um clássico lisboeta, onde nos sentamos para comer – está-se mesmo a ver – uma sopa.

Não há sermão, não é esse nunca o lugar de Joana Barrios. Cada um faz o que quer e come o que quer, como bem lhe apetecer. A actriz e apresentadora, entre muitas outras coisas, aponta-nos simplesmente um caminho que torna cool o que à partida pode parecer aborrecido – como a sopa. Ou mesmo uma ida a um restaurante apenas para um prato de sopa. “Como a sopa não é cerimoniosa, não é motivo para se ir a um restaurante. Na lógica de ‘como se come num restaurante’, a sopa perde o lugar para a sobremesa”, escreve Joana em Sopeira. Uma troca que não entende. “É como quando dizes que vais comer uma sopa e as pessoas dizem: ‘o quê? Sopa? Porquê sopa se podes comer sobremesa?’ Sobremesa é uma coisa e sopa é outra.”

Sopa, Delicia, Joana Barrios
©Gabriell Vieira

Sopa com todos

No Gambrinus, a ideia era sentar ao balcão e pedir uma sopa e um croquete, mas às duas da tarde ainda não havia lugar. Acabámos sentados à mesa e o croquete deu lugar ao pão torrado que acompanhou em beleza um creme de marisco – uma refeição à volta dos 10 euros num dos restaurantes mais icónicos da cidade, onde o preço pode ser muitas vezes restritivo. “O Gambrinus tem sempre esta coisa das duas sopas e isso é muito fixe. Normalmente, o que os restaurantes têm é a sopa de legumes”, explica, sem torcer o nariz. Pelo contrário, destaca como em cafetarias ou pastelarias a sopa pode ficar a menos de dois euros. “É mais barato que uma sandes e alimenta muito mais. Why not?”

A ideia para o livro nasceu precisamente à mesa da Pastelaria 1800 (Largo do Rato, 7. Seg-Sex 06.00-21.00, Sáb até às 20.00), onde há sempre sopa do dia pela módica quantia de 1,40€. “A sopa foi sempre a cena que me salvou”, afirma. “Se estiver a trabalhar fora de casa, é provável que vá a um restaurante ou a uma pastelaria comer sopa e mais qualquer coisa. Também digo isso no livro: a sopa é sempre uma opção mais ou menos segura fora de casa.” E para quem acha que pode ser coisa pouca, Joana resolve: “Come duas sopas”. Ou então, “acrescenta qualquer coisa, um croquete ou um pastel de bacalhau”.

Não por acaso, o livro que acaba de editar termina com o capítulo “Vai bem com Sopa”. Está lá o pão – sem receita, mas com a recomendação do Isco, a padaria/restaurante de Natalie Castro, está lá o croquete – “obra divina que já fiz muitas vezes e que adoro comer” – e está lá o pastel de bacalhau, que “fica mesmo bem com algumas sopas”.

“Toda a gente na minha casa adora sopa”, continua, explicando que nunca chega a ver o fim da panela porque do resto de uma sopa nasce uma nova. “Eu faço imenso restos 2.0, e a sopa, por exemplo, nunca acaba porque eu acrescento. Ponho e faço mais sopa. Mesmo que seja uma sopa de espinafres que eu quero transformar numa coisa qualquer, eu acrescento”, afirma. Falta de tempo, para cozinhar ou comer? Também não entende. “Toda a gente come, não é? A qualquer hora do dia comes qualquer coisa, mais vale ser uma sopa.” E quanto à organização, basta querer.

Quando lhe perguntamos como é que tem tempo para tudo, deixa claro que não vive do stress. “A minha agenda não é muito complicada. Durante o dia é caótica, mas depois das cinco eu estou disponível só para os meus filhos. Quem toma conta deles sou eu. Foi assim que sempre me organizei”, diz. E continua: “Enquanto tomas banho podes pôr a sopa a fazer. Esta manhã, por exemplo, acordei às 06.30. Cortei legumes e pus numa panela com um bocadinho de água. Pus a sopa a fazer e eram dez para as oito e tinha aquela sopa apuradinha, bem fixe. Ficou uma coisa bem feitinha. Mesmo que não haja jantar, a sopa está lá. Sopa e fruta há sempre.”

Parece fácil – e é, garante. “Sei lá, as pessoas fazem cursos de origami, não é?” Joana não quer julgar, só mostrar que passa pela vontade de cada um. “Se olhares para a sopa como uma alimentação infantil, ela deixa de fazer parte da tua rotina a partir do momento em que podes escolher aquilo que queres comer. Ainda assim, eu continuo a achar que sopa é muito importante.” Mesmo quando as ondas que se vão criando em torno da alimentação questionam o prato. “A pobre da sopa também sofreu. Os nutricionistas dizem para fazer sem batata, eu nunca fiz uma sopa sem batata na minha vida. Batata é vida”, aponta. “Ou então diz-se que o azeite põe-se em cru no final. É assim, fica mais saudável, eu tenho consciência disso, mas se cortares tudo e fizeres um refogadinho, ganha imenso. Fica muito diferente.”

E nem lhe venham com a conversa de que sopa só sabe bem no Inverno. “Eu gosto de coisas que possas comer com a colher”, independentemente da meteorologia.

Em Sopeira, está lá tudo. Mais de quatro dezenas de receitas que traçam também, de alguma forma, a sua história. “Os meus livros são todos muito pessoais porque para mim a comida é uma coisa muito pessoal”, confessa, lembrando os anos passados no restaurante dos pais em Montemor-o-Novo. “Há muitas sopas que estão no livro que fazem parte da minha infância, da minha história, do meu crescimento. E eu acho muito fixe que essas coisas que passaram pela minha forma de comer também possam ser passadas adiante”, diz.

Belo e delícia

Sopeira é a Joana Barrios, mulher desempoeirada sem medo das palavras e pronta para nos trocar as voltas. Tem sido assim no teatro e na moda – e na cozinha não podia ser diferente. “Continua a intrigar-me muito o porquê do sopeira [se aplicar] a uma mulher que cozinha porque eu acho que cozinhar é uma coisa muito libertadora e muito importante, é terapêutico. E acho que cozinhar é uma ferramenta do quotidiano tal como outra qualquer, como por exemplo falar inglês, saber conduzir, saber varrer o chão, lavar uma janela. São tarefas que podem tornar a tua vida melhor e mais fácil.”

Em nenhum momento se sentiu menos por isso, garante. “A mim empodera-me ser eu a poder tomar conta das minhas coisas.” Mesmo assim, não se livra das perguntas. Porquê a cozinha? “Eu faço essa reflexão e acabo sempre por perceber que tanto o teatro como a moda são tudo coisas que passam pela pele, pelo teu corpo, passam por ti para tu depois as pores cá para fora e são de alguma forma veículos de comunicação. E a alimentação é um veículo de comunicação cada vez mais visível.”

Joana Barrios, Gambrinus, Delicia, Sopeira
©Gabriell Vieira

E Joana Barrios dificilmente conseguiria ter um holofote maior: Cristina Ferreira deu-lhe casa com uma cozinha para dar asas à imaginação e a actriz não a largou mais. A forma como fala faz parecer simples a receita mais complexa; a atitude com que conduz tudo cria em nós a vontade de pôr o avental. No ano que acabou agora, estreou o seu primeiro programa de culinária, O da Joana, no 24 Kitchen, e teve ainda outra grande novidade. Não, ainda não foi desta que abriu um restaurante porque ainda sofre de algum stress pós-tráumatico quando se lembra do tempo que o negócio ocupou aos pais. Mas, em Dezembro, a pop-up store Kitchenette (Rua Correia Teles, 70, Campo de Ourique) ganhou um segundo espaço, na Rua Coelho da Rocha, no mesmo bairro – e é por lá que encontramos a Bellicia, a marca de comida de Joana Barrios, desenvolvida em parceria com Joana Duarte, a mãe da Kitchenette. E o que é que se encontra por lá? Sopa, pois claro. “Foi mesmo uma coincidência porque já havia uma vontade, muito mais da Joana do que minha, por ter o tal stress pós-traumático, que me perguntava se não queria fazer um produto alimentar.” Diariamente, neste novo espaço há uma sopa diferente, que pode ser consumida ali (2,70€/malga), ou ser levada para casa – haverá um “kit volte sempre” com um boião de vidro que servirá de convite a regressos, para que se volte a encher (16€ + 10€ do frasco e inclui desconto de 2€ para a próxima vez). “Quando estás a recolher para ir para casa, podes vir aqui comprar a tua sopa ou encher a tua vasilha com mais sopa”, explica Joana Barrios. Além das sopas, no Natal houve bolo-rei e agora há bolachas ("crocantes, doces, salgadas e carregadas de pedaços de chocolate", 9€) – tudo feito pela fashionista.

O nome da marca é uma brincadeira: “Os meus filhos dizem belícia para dizer belo e delícia. É tão simples quanto: desiste de tudo o que estás a fazer porque os teus filhos são muito mais fixes do que tu. Isto é o trust fund deles”, brinca.

Brincadeiras à parte, a Bellicia é coisa séria, asseguram as Joanas. “Queremos crescer para além das sopas. A Bellicia é uma marca que a Kitchenette desenvolve em conjunto com a Joana e que a seguir queremos levar para outros espaços, não necessariamente espaços da Kitchenette”, explica Joana Duarte. “A profissão da Joana é abrir a porta da cozinha e eu estou aqui. A ideia agora é também ter isto um bocadinho em todos os bairros”, acrescenta Joana Barrios.

Em breve, chegará o delivery. “Ninguém está aqui a inventar a pólvora, podes é criar uma marca através de um património comum”, conclui Joana Barrios, que só nos quer mostrar como a sopa é fixe.

Receita de Creme de Castanhas

Creme de castanhas

“Já fiz esta piada mil vezes e mesmo assim não me vou conter: are you a castanha lover? É um amante de castanhas? Impus-me um desafio culinário de Outono, que é o seguinte: todos os anos, como o Carlos é apaixonado por castanhas, faço uma coisa nova com castanhas. O creme de castanhas é, segundo ele, a sua menos favorita, mas calhou bem porque é a favorita do resto da malta cá de casa! Aqui fica a minha receita, que é bem deliciosa e fácil de fazer.”

Ingredientes
400 g de castanhas cozidas
1lt de água (aproximadamente)
2 cebolas doces
3 dentes de alho
1 colher de sopa de manteiga à temperatura ambiente
3 talos de aipo
Sumo de 1/2 limão
1/2 batata doce branca
1 ou 2 colheres de sopa de natas frescas
Sal q.b.
Azeite q.b.
Pimenta a gosto

Preparação:
Comece por cozer as castanhas em abundante água e sal. Antes de estarem muito cozidas, ou seja, cerca de 7 a 10 minutos depois de a água levantar fervura, retire. Escorra e reserve as castanhas e a água.

Num tacho, refogue a cebola bem picada com o alho num generoso fio de azeite, até alourarem. Acrescente a castanha e a colher de sopa de manteiga e deixe caramelizar durante cerca de 10 minutos, em lume brando.

Regue com uma concha da água da cozedura da castanha e deixe levantar fervura.

Adicione o aipo cortado em pedaços pequenos e o sumo de limão e deixe levantar fervura novamente. Junte a batata doce, tape o tacho, introduza a restante água e conte 20 minutos.

Triture tudo muito bem com a varinha mágica até obter um creme aveludado e tempere.

Sirva com uma belíssima colher de natas frescas e regue ligeiramente com um fio de bom azeite.

À mesa em Lisboa

Cura para constipações e ressacas, aconchego em dias frios, complemento em dias quentes, comida de conforto. O ramen ganhou espaço na cena gastronómica lisboeta e há cada vez mais sítios que o fazem – e bem feito – pela cidade. Alicerçado num caldo consistente, feito com carne de porco, vaca ou peixe, ao qual se juntam vegetais, ovos, legumes e claro, os noodles, o prato de consumo fácil, mas de preparação complexa parece ter conquistado o coração e estômago de muitos alfacinhas.

Não são moda de agora – ainda nos lembramos de ver as mimosas e mesas fartas em séries como O Sexo e a Cidade –, mas continuam a ser uma tendência na cidade. Um maravilhoso mundo de possibilidades que tanto serve de pequeno-almoço reforçado como almoço ou refeição para qualquer hora. Se começaram por ser uma opção de fim-de-semana, são cada vez mais os sítios com cartas para qualquer dia, afinal um prato de ovos ou panquecas sabe sempre bem.

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Este é o roteiro perfeito para quem não é egoísta à mesa e gosta de partilhar – agora, mais do que nunca, com as devidas cautelas, é claro. Para almoçaradas de amigos, para finais de tarde depois da praia, para melhorar os dias de chuva, para lanches ajantarados ou até para jantares fora de horas. A arte de picar é bem típica portuguesa e calha bem a qualquer hora do dia ou a qualquer refeição.

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