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A primeira vez que Shin Koike pergunta se a entrevista chegou ao fim é logo a seguir à primeira gargalhada. É uma fuga, para não ser deselegante. Tínhamos perguntado se no seu novo restaurante, o MITSU, encontrava clientes do by Koji, onde esteve antes, referindo o que o crítico Alfredo Lacerda havia escrito na Time Out, elogiando o chef japonês, que era quem estava de facto aos comandos, e não o chef Koji Yokomizo. “É este quem dá nome ao restaurante, mas no final eu fico com dúvidas se não faria mais jus se se chamasse By Shinya”, observou então. “É que vi menos da cozinha de fusão de Koji Yokomizo – de origem nipónica, mas nascido no Brasil – do que da linha mais clássica de Shinya – japonês de origem e embaixador culinário reconhecido pelo Governo do seu país.” Para concluir que essa era uma boa notícia: “se ficarmos assim ficamos muito bem”.
Shin Koike tem uma carreira de mais de 40 anos, boa parte dela no Brasil. Apesar do nome que construiu em São Paulo, em 2018 decidiu mudar-se para Lisboa. Na altura, foi para o Bonsai, uma instituição da cozinha japonesa em Lisboa que acabaria por fechar em 2023. Ainda antes disso, trocou o Bairro Alto por Santos, ficando à frente do by Koji. Também este restaurante viria a fechar e agora, finalmente, Koike tem um restaurante em Portugal em que se pode dizer que é ele a figura principal. Sem história de décadas, como o Bonsai; sem o nome de outro chef à frente, como by Koji. Mas esse também não é um tema que o interesse. “Eu vivi 27 anos no Brasil. Tinha três restaurantes. Quando fiquei cansado do Brasil, vim para cá e não quero mais isso do meu restaurante. Quero trabalhar, concentrar-me em criar comida. Essa é a minha vida agora”, diz-nos o chef.
Estamos sentados ao balcão do MITSU, o pequeno restaurante que abriu em Picoas em Abril deste ano. Do outro lado, Shin Koike vai fazendo a mise en place para o primeiro dos dois turnos para jantar, que começa às 19.00 (a sala tem 14 lugares, a maioria ao balcão, os restantes em duas mesas de dois, pelo que a reserva é aconselhada). Tudo é feito com tranquilidade e quase sem uma palavra. Um olhar ou um gesto do chef é amiúde suficiente para o resto da equipa perceber o que lhes pede. O único ruído que se ouve no restaurante é o da conversa de um pequeno grupo de brasileiros, que conhece o chef de outras paragens e o interpela sobre pratos desses outros lugares ou de visitas passadas. Eis aqui a nossa resposta: há clientes que acompanham Shin Koike para onde quer que ele vá.

O menu é único (100€). O MITSU é um omakase, o que significa que estamos nas mãos do chef. Existe uma carta, que nos permite saber que vamos começar por um petisco (batata yam com pasta de umeboshi), depois entradas (amido de kuzu com pasta de sésamo servido em forma de tofu, sashimi de ovas de ouriço, usuzukuri de robalo temperado com sal e sumo de limão, berbigão cozido no vapor com sake), seguidas de sashimi (toro, akami e chutoro de atum, lírio e carapau), de um grelhado (mini steak de wagyu com wasabi fresco), de nigiri-sushi (toro, akami, robalo, carapau, gunkan de ikura), roll (temaki negitoro com takuwan, cavala marinada braseada), sopa (caldo de pargo) e sobremesa (frutas).

Mas os pratos podem mudar. “Depende da matéria-prima.” O que é certo, “mais ou menos” certo, é que “são sete a oito sequências, mais ou menos 20 tipos de pratos, dependendo do dia”. Por exemplo, no dia da visita da Time Out, havia sardinha (marinada), pregado (filetado muito fino e com molho ponzu, e a barbatana num nigiri), lula dos Açores e ostras frescas (também com molho ponzu, que é feito com vinagre de arroz com sumo de limão). “Hoje chegaram ostras gordas”, sorri o chef. A sopa, cuja ideia é que funcione como um digestivo, era de berbigão, e as sobremesas eram um pudim feito ao vapor e monaka, um doce tradicional nipónico que é uma sanduíche de mochi com pasta de feijão-azuqui, acompanhado por um licor de ameixa japonesa.

O objectivo de abrir um omakase, para Shin Koike, é poder mostrar como este tipo de restaurantes pode ser mais do que o que muitas vezes é. “Lisboa começou com a onda do omakase, mas pelo que eu vejo é especialmente de sushi e sashimi. A minha proposta é mais comida japonesa integral. Várias entradas e comida quente também”, explica. “Não vai chegar até ao kaiseki. Kaiseki é muito complicado. A minha ideia é apresentar comida japonesa mais tradicional. Mas com certeza com uma adaptação que, para mim, é estrangeira”, admite o chef, natural de Tóquio, que no MITSU tem um novo pupilo debaixo da sua asa, o nepalês Razu Bohora. É ele quem prepara uma parte substancial dos pratos.

As bebidas são à parte. Como não poderia deixar de ser, há sake (provámos um Shichiken Junmai, mais frutado e floral, um Kubota Senjyu Ginjo, meio-seco, e um Kishu No Fudo, seco, todos refrigerados) e também não falta cerveja japonesa. Quem preferir vinho tem à disposição uma carta escorreita, de uma única página, mas com referências de Portugal, Espanha, França, Itália e Alemanha, entre espumantes, brancos, tintos e rosés. Os preços variam entre os 35€ por garrafa e os 650€. Este último é um Domaine Ponsot Grand Cru Corton Charlemagne, um chardonnay da Borgonha. Há ainda quatro garrafas de 120 ml à disposição de comensais ou bebedores solitários (9€-12€), assim como um Madeira (9€).
Rua Martens Ferrão, 9 (Picoas). 93 891 2144. Seg-Sáb 19.00-23.30
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